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Opinião

O antídoto para as fake news é nutrir nosso bem-estar epistêmico

Por Kenneth Boyd

Normalmente pensamos sobre “bem-estar” em termos de saúde física e mental. Para melhorar seu bem-estar físico, é bom praticar exercícios; para aumentar seu bem-estar mental, considere desligar o telefone de vez em quando. Existe outra maneira, menos conhecida, na qual devemos pensar sobre nosso bem-estar: em termos de conhecimento. O conhecimento é bom para nós, não apenas porque geralmente queremos saber a verdade, mas porque o conhecimento afeta dramaticamente nossa habilidade de navegar pelo mundo e realizar nossos objetivos. A ignorância, por outro lado, é ruim para nós porque nos impede de ter uma representação precisa do mundo e nos impede de alcançar esses objetivos. Assim como há fatores que afetam nosso bem-estar físico e mental, há fatores que afetam nosso bem-estar epistêmico. Não é exatamente uma noção nova, mas pode nos ajudar a entender melhor o que tem sido chamado de nossa atual “crise epistêmica”.
 
Você, sem dúvida, foi exposto ou exposta a esta crise de várias maneiras: muito já foi escrito sobre nossa era da “pós-verdade” de produção e consumo de mídias; as teorias da conspiração têm aparecido de modo desenfreado; e muitas bobagens são compartilhadas no Facebook. Consumir conteúdo de mídia hoje em dia é exaustivo e frustrante, ter discussões com aqueles de quem você discorda está mais difícil do que nunca e muitas vezes pode parecer difícil identificar fontes de informação confiáveis. Embora muito tenha sido dito sobre por que tudo isso é ruim, aqui eu quero me concentrar em como isso é especificamente ruim para nós.
 
Bem-estar epistêmico é seu senso, razoavelmente fundamentado, de que você será capaz de saber o que deseja e precisa saber sobre o mundo para que sua vida corra bem. Isso pode envolver conhecimento em geral — você quer sentir que pode encontrar respostas para perguntas que você acha que são importantes para saciar sua curiosidade — bem como saber coisas mais específicas — haverá algumas coisas que você precisa saber para realizar seus projetos de vida. Se você tem acesso a muitas boas fontes de informação e pode ter suas perguntas respondidas quando precisa, então você tem um alto grau de bem-estar epistêmico. Se, por outro lado, você está cercado de mentirosos ou simplesmente não tem como descobrir o que precisa saber, você não está se saindo tão bem.
 
Existem três componentes do bem-estar epistêmico: (1) acesso a verdades; (2) acesso a fontes confiáveis de informação; e (3) oportunidades para participar de um diálogo produtivo. Vamos pensar sobre cada um deles.
 
Quando informações lhe são apresentadas ou você procura respostas para perguntas, você quer ter certeza de que o que está recebendo é a verdade. O acesso à verdade, o primeiro componente, é a base do bem-estar epistêmico. Este acesso pode ser impedido de várias maneiras: você pode não conseguir acessar a Internet, livros podem ser proibidos, informações importantes podem ser suprimidas. Ou, em casos menos extremos, você pode ser apresentado a diferentes meios de comunicação apresentando informações conflitantes sobre um evento. Nesse caso, você pode sentir que está sendo impedido de acessar verdades, na medida em que não consegue determinar quais informações apresentadas são corretas.
 
Se você já foi dispensado em uma conversa por causa de sua raça, gênero, sexo, então você já experimentou injustiça epistêmica
 
A internet contém, para o bem ou para o mal, uma enorme quantidade dos produtos intelectuais e criativos produzidos pela humanidade. É também uma fossa de falsidades ultrajantes. Ter acesso a tantas informações, então, só é útil se você for capaz de separar o joio do trigo. Por exemplo, a quantidade de informações relacionadas à COVID-19 foi chamada de “infodemia” pela Organização Mundial da Saúde: há tantas informações que é impossível acompanhar todas elas e, muitas vezes, é difícil determinar no que acreditar. Para ter certeza de que estamos acessando a verdade, então, precisamos descobrir quais fontes de informação são boas.
 
Aqui temos o segundo componente do bem-estar epistêmico, que está em grande parte a serviço do primeiro: acesso a fontes confiáveis de informação. Embora estejamos todos interessados em obter verdades, não podemos adquirir todas essas verdades sozinhos, e, portanto, dependemos de outras pessoas. Isso é bom. Dividir o trabalho cognitivo entre muitas pessoas significa que não precisamos ser especialistas em tudo para saber muito sobre o mundo. Podemos apenas contar com outras pessoas para descobrir as coisas para nós. Sentir que podemos encontrar essas fontes confiáveis é crucial para sabermos o que precisamos saber e, portanto, é um componente importante de nosso bem-estar epistêmico.
 
Finalmente, embora confiemos em outras pessoas para obter informações, não é suficiente receber informações passivamente. Precisamos nos envolver na discussão. Muitas vezes, as coisas que queremos saber são complexas e difíceis, e descobrir essas coisas requer mais do que apenas respostas pontuais a uma pergunta, e as discussões com outras pessoas podem nos apresentar a novas perguntas e interesses. Também gostamos de compartilhar o que sabemos: se sei algo que pode ser útil para os outros, quero ter a possibilidade de contribuir. Aqui, então, está o terceiro componente do bem-estar epistêmico: a sensação de que você pode participar de diálogos produtivos.
 
A falta de oportunidade de participar de um diálogo produtivo pode ser prejudicial ao seu bem-estar. Existem muitas maneiras pelas quais você pode ser excluído explícita ou implicitamente com base em fatos sobre sua identidade, um fenômeno que os filósofos chamam de injustiça epistêmica. Se você já teve negada a chance de expressar sua opinião quando poderia ter feito uma contribuição importante, ou foi considerado incapaz quando você não o era, ou foi dispensado de uma conversa por causa de sua raça, sexo, gênero, etc., então você experimentou injustiça epistêmica. Todos esses são exemplos de maneiras pelas quais seu bem-estar epistêmico pode ser adversamente afetado. A noção com a qual estou trabalhando aqui, no entanto, não depende necessariamente de exclusões desse tipo e, em vez disso, diz respeito a qualquer tipo de sensação de falta de oportunidades para se engajar em um diálogo produtivo (continua a ser o caso, é claro, que os membros de grupos marginalizados e minoritários tendem a experimentar esses tipos de prejuízos mais frequentemente).
 
Já podemos ver como a atual crise epistêmica pode afetar nosso bem-estar epistêmico: a quantidade real e percebida de informações falsas e enganosas a que somos expostos pelas mídias tradicionais e pelas mídias sociais pode nos fazer sentir como se não tivéssemos um bom acesso a verdades. Com tantas informações concorrentes, e o que parecem ser pessoas apresentando informações usando de má-fé, pode ser difícil identificar fontes confiáveis, e a experiência de as pessoas não estarem dispostas a se envolver em diálogos produtivos pode fazer parecer que estamos significativamente subtraídos em nossa capacidade de adquirir e compartilhar informações. Não é de se admirar que as coisas pareçam estar tão difíceis.
 
Se não conseguirmos controlar a crise epistemológica, o mercado de ideias deixará de funcionar, e o mesmo acontecerá com uma democracia em bom funcionamento
 
Pensar sobre nosso bem-estar epistêmico também pode ajudar a explicar por que a crise epistêmica não está melhorando. Se as pessoas são, como sugeri, impulsionadas pela busca da verdade, de confiança e de diálogo, então, quando sentirem que foram prejudicadas nesses esforços, elas irão buscá-las por outros meios. Um dos aspectos mais lamentáveis de nossa situação epistêmica atual é o surgimento do pensamento conspiratório: as pessoas estão dispostas a acreditar em uma série de teorias bizarras e a compartilhá-las amplamente nas redes sociais. Isso pode acontecer em parte como uma resposta à diminuição do senso de bem-estar epistêmico, com o resultado de que olhamos para lugares potencialmente surpreendentes para tentar encontrar verdades, fontes confiáveis e oportunidades para o diálogo. Embora seja, em um sentido importante, irracional acreditar em muitas teorias da conspiração, a motivação por trás disso não é necessariamente irracional.
 
Coisas semelhantes podem ser ditas sobre outra tendência perturbadora: a crescente desconfiança nos especialistas. Considere as respostas à pandemia de COVID-19. As recorrentes falhas em acreditar em sua gravidade, na eficácia de medidas preventivas (como distanciamento social e uso de máscaras) e o ceticismo em relação ao desenvolvimento de vacinas surgiram em parte por causa do sentimento de que aqueles que são considerados especialistas não são confiáveis. Isso não quer dizer que as pessoas que não confiam nos especialistas não se preocupem em encontrar fontes confiáveis ​​de informação. Em vez disso, busca-se a confiança em outro lugar — e muitas vezes não nos melhores lugares, como em amigos no Facebook que soam confiantes, mas são ignorantes. Uma diminuição da sensação de bem-estar epistêmico pode ser tanto uma causa como uma consequência de uma crise epistêmica: se você se sentir incapaz de se engajar em um diálogo, encontrará oportunidades alternativas para fazê-lo, resultando em pontos de vista mais extremistas, que por sua vez o tornam mais difícil de dialogar — um ciclo vicioso e prejudicial ao bem-estar epistêmico.
 
Em uma entrevista recente na revista The Atlantic, Barack Obama alertou sobre consequências potencialmente terríveis se não conseguirmos colocar a crise epistemológica sob controle. O mercado de ideias deixará de funcionar, e o mesmo acontecerá com uma democracia que funcione bem. Parte do problema em abordar a crise epistêmica, eu proponho, envolverá tentar equilibrar vários aspectos do bem-estar epistêmico das pessoas da maneira correta. Não está claro qual é a melhor maneira de fazer isso. Muitas redes sociais tomaram medidas para tentar conter a onda de desinformação em suas plataformas, seja por meio de checagem de fatos (fact check) ou banimento de usuários. Essas ações podem ajudar com o bem-estar epistêmico dos usuários de uma plataforma, tentando garantir que esses usuários tenham acesso a verdades. Ao mesmo tempo, essas medidas podem ser interpretadas por alguns como afetando sua capacidade de engajar-se em diálogos. Como resultado, os usuários que foram submetidos à fact check ou foram banidos procurarão outro lugar para ter suas necessidades epistêmicas atendidas. Isso não quer dizer que checar os fatos seja uma má ideia, nem que nunca seja apropriado banir usuários das redes sociais. Isso é para mostrar que equilibrar a necessidade das pessoas por verdades, confiança e diálogo não é uma tarefa fácil.
 
Sem dúvida você já deve ter se deparado com alguns conselhos sobre como lidar com a crise epistêmica — somos chamados a verificar as informações que recebemos online, procurar por indicações de que nossas fontes são confiáveis, bloquear aquele certo tio de nossas mídias sociais — e esses podem ser conselhos igualmente bons quando se trata de nosso bem-estar epistêmico. Talvez valha a pena desenvolver o hábito de reavaliar periodicamente os nossos próprios hábitos epistêmicos. Você pode refletir sobre as maneiras pelas quais adquire informações, e se está ouvindo certas fontes porque elas provavelmente o levarão à verdade ou porque estão dizendo o que você deseja ouvir. Embora não haja uma panaceia para todos os problemas que a crise epistêmica trouxe, uma autorreflexão consciente sobre as maneiras como buscamos o conhecimento é, pelo menos, um bom primeiro passo para aumentar o bem-estar epistêmico.
 
• Kenneth Boyd é pós-doutorando na University of Southern Denmark no Departamento para o Estudo da Cultura, como parte do projeto Scientific Testimony in a Diverse Society.

Nota
Artigo reproduzido do site da
Associação Brasileira Cristãos na Ciência. Publicado originalmente em inglês em 21 de Janeiro de 2021 na Revista Psyche, aqui. Tradução: Tiago Garros

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