Opinião
- 20 de setembro de 2013
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Nunca contamos almas!
A imensa área envidraçada do auditório deixava ver as folhas levadas pelo frio vento da primavera do Rhön. A minha atenção também foi outra que voou por alguns instantes. Creio que por causa do desconforto com o que acabara de ouvir. Não porque a expositora deixasse de possuir excelentes credenciais. Consultora naquela época de clientes como Tony Blair e a megaempresa Shell, não havia como ignorar o seu currículo.
Ainda assim, o suor em minhas mãos e uma leve taquicardia denunciavam minhas intenções. Eu queria discordar! Ousadia ou tolice, não sei bem, ou ainda um preciosismo de minha parte. Talvez fosse melhor concordar, ser desafiado por novas perspectivas, arejar minhas ideias, essas coisas que instalavam um conflito em minha mente.
A pugna se encerrou quando vi uma impulsiva mão (era a minha!) levantada pedindo a palavra. Quando me dei conta já estava com o microfone nas mãos, balbuciando o ensaio de um possível contraponto à sua exposição. Basicamente, reagi quanto ao uso de metodologias quantitativas para a avaliação da efetividade do ministério cristão (era o ponto alto daquela sessão). Em resumo, tentei dizer o seguinte: os números não nos dizem tudo! Ou seja, podemos encontrar bons números e, na verdade, estar indo na direção equivocada. Ou, o oposto também é verdadeiro, podemos ter números pouco expressivos, mas ainda assim estar fazendo o que em verdade deveríamos fazer. É uma questão delicada, mas quis dizer que os números, sem uma adequada interpretação dos mesmos e do contexto, podem nos enganar.
Sentei-me. Já quase sabia o que viria. De maneira bondosa, bem explicativa, quase condescendente, a convidada especial me desafiou a abrir meu entendimento e buscar meios mais efetivos de avaliar meu rendimento.
Foi aí que aquele senhor, em seus mais de 80 anos, pediu a palavra e disse três frases: “Eu concordo com o jovenzinho [sim, era eu!]. Nós nunca deveríamos contar almas! A única coisa que contamos é dinheiro!” (literalmente: “I agree with the young boy. We should never count souls! The only thing we count is money!”).
Era Sir Fred Catherwood. Por muitos anos tesoureiro da IFES (a ABU internacional), genro do saudoso Martyn Lloyd-Jones. Antes de se aposentar, Sir Fred destacou-se no Parlamento Europeu, aonde chegou a ocupar a vice-presidência. Não preciso dizer meu sentimento de que havia ganhado o dia. Na hora do intervalo, deixei o casaco dentro do auditório e saí para respirar fundo o ar frio da Baviera (e chamam isso de primavera!). O coração já estava aquecido. Podia ser tolice, ou vã vaidade, mas resolvi curtir a boa sensação.
Hoje creio que aprendi a ver com melhores olhos os tipos de métodos e recursos, inclusive quantitativos, que podemos usar para avaliar o trabalho que fazemos. Aliás, é uma boa paixão essa de buscar alcançar com o que a gente faz o maior número de pessoas. É são, é desejável, podemos e devemos ter metas inspiradoras, uma visão que nos impulsiona para ir além. No final das contas, é do coração de Deus cruzar fronteiras, barreiras, e chegar com uma mensagem transformadora a todas as pessoas, em todos os lugares. Mas claro, e essa é uma perspectiva que mantenho, não temos desculpas para ser ingênuos deixando de examinar bem a ideologia que pode (ou não) acompanhar certos métodos e estratégias.
Depois de algum tempo voltei a encontrar-me com Sir Fred. Lembrei-lhe do episódio. Ele se recordava do ocorrido, mas não sabia que eu era aquele “jovenzinho". Veja bem, foram suas palavras. E, acredite, minha maior alegria foi porque ele apoiou minha posição, e não devido à sua percepção de minha suposta juventude. Claro que seus óculos podem havê-lo traído quanto aos anos de vida que me atribuiu. Mas por que nos preocupar com a idade, por que contar nossos anos se “the only thing we count is money!”?
Leia mais
Numerolatria e numerofobia (revista Ultimato 343)
Missões brasileiras em resposta ao clamor do mundo (revista Ultimato 316)
A Mensagem da Missão (Howard Peskett)
Ainda assim, o suor em minhas mãos e uma leve taquicardia denunciavam minhas intenções. Eu queria discordar! Ousadia ou tolice, não sei bem, ou ainda um preciosismo de minha parte. Talvez fosse melhor concordar, ser desafiado por novas perspectivas, arejar minhas ideias, essas coisas que instalavam um conflito em minha mente.
A pugna se encerrou quando vi uma impulsiva mão (era a minha!) levantada pedindo a palavra. Quando me dei conta já estava com o microfone nas mãos, balbuciando o ensaio de um possível contraponto à sua exposição. Basicamente, reagi quanto ao uso de metodologias quantitativas para a avaliação da efetividade do ministério cristão (era o ponto alto daquela sessão). Em resumo, tentei dizer o seguinte: os números não nos dizem tudo! Ou seja, podemos encontrar bons números e, na verdade, estar indo na direção equivocada. Ou, o oposto também é verdadeiro, podemos ter números pouco expressivos, mas ainda assim estar fazendo o que em verdade deveríamos fazer. É uma questão delicada, mas quis dizer que os números, sem uma adequada interpretação dos mesmos e do contexto, podem nos enganar.
Sentei-me. Já quase sabia o que viria. De maneira bondosa, bem explicativa, quase condescendente, a convidada especial me desafiou a abrir meu entendimento e buscar meios mais efetivos de avaliar meu rendimento.
Foi aí que aquele senhor, em seus mais de 80 anos, pediu a palavra e disse três frases: “Eu concordo com o jovenzinho [sim, era eu!]. Nós nunca deveríamos contar almas! A única coisa que contamos é dinheiro!” (literalmente: “I agree with the young boy. We should never count souls! The only thing we count is money!”).
Era Sir Fred Catherwood. Por muitos anos tesoureiro da IFES (a ABU internacional), genro do saudoso Martyn Lloyd-Jones. Antes de se aposentar, Sir Fred destacou-se no Parlamento Europeu, aonde chegou a ocupar a vice-presidência. Não preciso dizer meu sentimento de que havia ganhado o dia. Na hora do intervalo, deixei o casaco dentro do auditório e saí para respirar fundo o ar frio da Baviera (e chamam isso de primavera!). O coração já estava aquecido. Podia ser tolice, ou vã vaidade, mas resolvi curtir a boa sensação.
Hoje creio que aprendi a ver com melhores olhos os tipos de métodos e recursos, inclusive quantitativos, que podemos usar para avaliar o trabalho que fazemos. Aliás, é uma boa paixão essa de buscar alcançar com o que a gente faz o maior número de pessoas. É são, é desejável, podemos e devemos ter metas inspiradoras, uma visão que nos impulsiona para ir além. No final das contas, é do coração de Deus cruzar fronteiras, barreiras, e chegar com uma mensagem transformadora a todas as pessoas, em todos os lugares. Mas claro, e essa é uma perspectiva que mantenho, não temos desculpas para ser ingênuos deixando de examinar bem a ideologia que pode (ou não) acompanhar certos métodos e estratégias.
Depois de algum tempo voltei a encontrar-me com Sir Fred. Lembrei-lhe do episódio. Ele se recordava do ocorrido, mas não sabia que eu era aquele “jovenzinho". Veja bem, foram suas palavras. E, acredite, minha maior alegria foi porque ele apoiou minha posição, e não devido à sua percepção de minha suposta juventude. Claro que seus óculos podem havê-lo traído quanto aos anos de vida que me atribuiu. Mas por que nos preocupar com a idade, por que contar nossos anos se “the only thing we count is money!”?
Leia mais
Numerolatria e numerofobia (revista Ultimato 343)
Missões brasileiras em resposta ao clamor do mundo (revista Ultimato 316)
A Mensagem da Missão (Howard Peskett)
É casado com Ruth e pai de Ana Júlia e Carolina. Integra o corpo pastoral da Igreja Metodista Livre da Saúde, em São Paulo (SP), serve globalmente como secretário adjunto para o engajamento com as Escrituras na IFES (International Fellowship of Evangelical Students) e também apoia a equipe da IFES América Latina.
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