Opinião
- 17 de dezembro de 2018
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Natal: um retorno à infância e às Escrituras
Por Paulo Teixeira
O Natal me remete à infância. Talvez seja a experiência de muitos. No meu caso, vêm-me as lembranças dos muitos cânticos e versos bíblicos, que, após semanas de ensaio, eram entoados e recitados na igreja no tradicional programa que crianças e jovens apresentavam na tão esperada véspera do Natal.
Famílias e amigos se reuniam para recordar os acontecimentos que culminaram no nascimento de Jesus Cristo. E os cânticos e os versos traziam à tona muitas das promessas e profecias acerca do Messias. Recordávamos os textos. Revivíamos as cenas. Revisitávamos a manjedoura, ao cantar:
“Natal é vida que nasce.
Natal é Cristo que vem.
Nós somos o seu presépio,
e a nossa casa é Belém.”
De maneira sutil e quase lúdica, a mensagem bíblica – nem sempre tão linear ou fácil de assimilar – ia sendo inculcada em quem participava, despertando em mim, particularmente, as primeiras fagulhas do grande apreço que, desde a infância, tenho pelas Escrituras Sagradas.
O passar dos anos me fez ver o quão importante foi, para minha fé e para minha formação, ter participado daqueles “programas de Natal” quando pequenino. Cresci com um profundo senso de unidade da Bíblia. Aprendi que Antigo e Novo Testamentos giravam em torno de Cristo e tinham nele o seu centro e sua razão de ser. Era como se, na tenra infância, alguém me tivesse antecipado – com a simplicidade requerida por uma criança – o complexo ensino de um teólogo que só viria a conhecer vários anos mais tarde, Agostinho de Hipona, que ensinou: “o Novo Testamento está latente no Antigo, e o Antigo Testamento se tornou patente no Novo”.
O Natal de Jesus foi um nascimento anunciado desde muito tempo antes de o anjo Gabriel tê-lo feito a Maria (Lucas 1.26-38). Eva já o esperava (Gênesis 3.15) e, após ela, talvez toda jovem temente a Deus, geração após geração, sonhasse em ser a mãe do Salvador. Profetas mencionaram detalhes da vinda do Messias, depositando peças e mais peças para que o povo tivesse uma ideia do quebra-cabeças que Deus estava montando. Mesmo as genealogias – cuidadosamente registradas e lamentavelmente negligenciadas na leitura bíblica hoje – são prova de que o Messias estava chegando. E o próprio sistema cúltico e sacrificial do Antigo Testamento – primeiro no tabernáculo e, depois, no Templo – apontavam para a vinda e o sacrifício “do Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo” (João 1.29).
Hoje, ao ler diariamente as Escrituras Sagradas, continuo buscando Jesus em cada trecho, com especial atenção para a interação entre o Antigo e o Novo Testamentos, valorizando a dinâmica ‘promessa e cumprimento”, “tipo e antítipo”, cuja identificação e interpretação têm na Carta aos Hebreus uma chave fundamental.
A cada novo dia, surpreendo-me com a maneira como o Espírito Santo teceu o texto por meio de dezenas de escritores a quem inspirou e, ao mesmo tempo, imprimiu tanta unidade entre ambos os Testamentos. Tal unidade fez Lutero referir-se à Bíblia como “a manjedoura onde está deitado o menino Jesus”. Não importa em que páginas alguém a abra, do Gênesis ao Apocalipse, há de encontrar ali o Salvador e, por graça de Deus, ser abraçado por ele.
O Natal me faz voltar à infância e às Escrituras. Peço a Deus que a Bíblia sempre esteja presente em minha vida e que, por meio dela, eu aprenda a receber, cotidianamente, o Reino de Deus como uma criança (Marcos 10.15).
Um feliz e abençoado Natal para você e os seus!
• Paulo Teixeira é teólogo e linguista, especialista em Língua e Literatura Hebraica e secretário de Tradução e Publicações da Sociedade Bíblica do Brasil.
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