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Opinião

Não quero bater panelas, nem orar pela Pátria

Por Billy Lane

Neste sete de setembro não quero bater panelas em protesto ao governo. Não quero sair às ruas em manifestações contra os rumos do governo, a corrupção generalizada na sociedade, o descaso de boa parte da classe política, o aumento da criminalidade, a bancarrota eminente das contas públicas, o aumento dos impostos, a degradação moral da sociedade e tantos outros males.

Confesso, nem mesmo quero orar pela Pátria como tem sido costumeiramente convocado por movimentos cristãos ou como o salmista ora “Reveste da tua justiça o rei, ó Deus, e o filho do rei, da tua retidão, para que ele julgue com retidão e com justiça os teus que sofrem opressão” (Sl 72.1-2, NVI), ainda que esse seja, de fato, meu desejo: governantes mais justos e tementes a Deus.

Porém, quero orar, sim, não para que o presidente, o Congresso e o judiciário julguem com justiça, mas para que o Senhor julgue, para que o Senhor tome o seu lugar de justo juiz. Quero orar com os Salmos 94:

“Ó Senhor, Deus vingador; Deus vingador! Intervém!
Levanta-te, Juiz da terra; retribui aos orgulhosos o que merecem” (Sl 94.1-2). Desejo que Deus presida o tribunal e seja o juiz.


Quero também lamentar com esse salmo:

“Até quando os ímpios, Senhor, até quando os ímpios exultarão? Eles despejam palavras arrogantes, todos esses malfeitores enchem-se de vanglória”. Porque “massacram o teu povo, Senhor, e oprimem a tua herança;
matam as viúvas e os estrangeiros, assassinam os órfãos, e ainda dizem: ‘O Senhor não nos vê; o Deus de Jacó nada percebe’” (Sl. 94.3-7).

Quero também ter essa esperança:

“Fará cair sobre eles os seus crimes, e os destruirá por causa dos seus pecados; o Senhor, o nosso Deus, os destruirá!” (Sl. 94.23).

Muitas vezes os Salmos fazem referência a um adversário ou inimigo como uma nação estrangeira que oprime o povo de Deus. Mas neste caso, tudo indica que não se trata de um povo estrangeiro que está oprimindo o povo de Deus. É o soberbo – o arrogante que diz que Deus não vê – que não se importa e esmaga o povo.

Reconheço que esse tipo de oração não faz parte de nossa espiritualidade cristã. Nossa espiritualidade está firmada no preceito de Jesus que devemos amar nosso inimigo e orar por quem nos persegue (Mt 6.44-45). Não sentimos confortáveis orando com alguns salmos, como o 137:8,9, contra uma nação inimiga: “Filha da Babilônia, que serás destruída; feliz aquele que te retribuir o mal que fizeste; feliz aquele que pegar teus filhos e esmagá-los contra a pedra” (RA). Nem com o salmo 139.19-21: “Quem me dera matasses o perverso, ó Deus, e se afastassem de mim os assassinos, homens que se rebelam contra ti, e contra ti se levantam para o mal. Senhor, não odeio eu os que te odeiam? Não detesto os que se levantam contra ti? Eu os odeio com ódio absoluto; considero-os verdadeiros inimigos” (RA).

Em vez disso, talvez nos sintamos mais à vontade em proclamar o juízo de Deus com o profeta Habacuque “Ai daquele que acumula o que não é seu! Ai daquele que se enche de bens saqueados! Até quando será assim? Ai daquele que adquire para sua casa lucros criminosos” (Hc 2.6, 9). Ou com Amós, “eu vos esmagarei no vosso lugar como se esmaga uma carroça carregada de feixes” (Am 2.13). Nos sentimos mais à vontade com essas palavras porque entendemos que o juízo de Deus se manifestará no futuro, no julgamento final, enquanto que a oração do salmista deseja uma ação imediata de Deus.

Também ficamos à vontade de anunciar a queixa do Senhor contra o seu povo: “porque não há verdade, nem bondade, nem conhecimento de Deus na terra. Só prevalece maldição, mentira, assassinato, furto e adultério; há violências e homicídios sobre homicídios. Por isso a terra se lamenta, e todos os seus habitantes desfalecem, juntamente com os animais do campo e com as aves do céu, e até os peixes do mar morrem” (Os 4.1-3).

A imprecação – o desejo e súplica para que Deus vingue o inimigo – não faz parte de nossa cultura religiosa. Ainda que muitas vezes o sentimento de vingança exista, não temos coragem de expressá-lo ou não o consideramos compatível com os valores do amor, da misericórdia e da compaixão de Jesus. Contudo, às vezes penso que nossa revolta, quando não é dirigida a Deus em oração de lamento, queixa e súplica, se manifesta nas agressões pessoais nas redes sociais, na polarização das ideias, na caricaturização do outro como agressor, na personificação da corrupção, na indiferença e descaso com as questões públicas; no egoísmo e individualismo de se importar apenas com o que é seu; na desilusão e fuga; no ufanismo de achar que esse mal não me atinge; no maniqueísmo e na espiritualização do mal. Enfim, como não é próprio de nós nos revoltarmos e nem expressar isso a Deus, demonstramos isso de outras maneiras, sem perceber que são formas diferentes de arrogância e soberba.

Entretanto, a imprecação é, na verdade, o modo de darmos lugar à ira e entregá-la a Deus, como Paulo bem expressa e exorta para que façamos: “não vos vingueis a vós mesmos, amados, mas dai lugar à ira; porque está escrito: A mim me pertence a vingança; eu é que retribuirei, diz o Senhor” (Rm 12.19).

O salmista também não estava completamente confortável com aquele ódio no seu coração, por isso, pede a Deus que o examine: “Sonda-me ó Deus e conhece o meu coração, prova-me e conhece os meus pensamentos; vê se há em mim algum caminho mau e guia-me pelo caminho eterno” (139.23-24).

Não devemos dar lugar ao ódio nem mesmo em nome da defesa da justiça e retidão. Mas também não devemos deixar o ódio nos consumir ou nos cauterizar. Por isso, minha oração é que Deus tome seu assento e presida o tribunal.

Nesse sete de setembro, quero continuar orando com os Salmos 94: “Poderá um trono corrupto estar em aliança contigo?, um trono que faz injustiças em nome da lei? Eles planejam contra a vida dos justos e condenam os inocentes à morte” (94.20-21, NVI).
Quero também me consolar na certeza de que “Quando a ansiedade já me dominava no íntimo, o teu consolo trouxe alívio à minha alma” (94.19, NVI) e que “o Senhor é a minha torre segura; o meu Deus é a rocha em que encontro refúgio” (94.22).
Pastor presbiteriano e doutor em Antigo Testamento, é professor e capelão no Seminário Presbiteriano do Sul, e tradutor de obras teológicas. É autor do livro O propósito bíblico da missão.
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