Prateleira
- 06 de maio de 2009
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Mulheres saradas e mulheres inadequadas
Lembrei-me de minhas colegas de missão que por muitos anos trilhavam aquele mesmo caminho carregando nas costas seus filhos para ir viver na aldeia. Pensei em toda revelação do amor de Deus que elas representavam como mulheres estrangeiras pisando ali, orando e cantando, vivendo Jesus e seu amor pelas viúvas e órfãos da tribo, pelas meninas adolescentes, pelos garotos. Criando seus filhos naquele ambiente, compartilhando com eles sangue e vida.
“Mulher, mas não inadequada” -- repetia enquanto voltava a dar meus passos desajeitados na lama. Chegamos depois de quase sete horas de caminhada. Revi minhas amigas antigas, vi as viúvas, as velhas e as novas adolescentes casadoiras. Conversamos principalmente sobre sexo e comida (os temas principais das conversas em todo mundo e também na tribo). Veio a tanga emprestada e o ritual da pintura, com leite de peito e cuspe. Veio a nudez e ela me caiu bem. Via os colegas de missão há alguns metros de distância um tanto constrangidos. Mas via também a alegria de minhas amigas indígenas e como celebraram minha chegada. Via meu bumbum branco como lua cheia, meus seios à mostra, mas não me envergonhava mais. Não sou inadequada. Estava ali por Jesus e em Jesus me movia.
Minha colega tomou coragem na minha coragem e também se desnudou. Então as meninas da tribo nos tomaram pela mão e nos levaram para outra casa comunitária próxima de onde celebramos longamente e com muito canto, choro e orações, a presença de Deus em nosso meio, no meio do povo, seu consolo para os corações cansados, seu perdão para os corações amargurados. Para aquele momento eu tinha sido feita mulher.
Aquela viagem foi mais do que “missiológica”. Descobri que minha identidade em Deus não tem nada a ver com meu bumbum. Para uma mulher, reconhecer isto significa se libertar de muitas pressões. Significa respirar com liberdade o ar da maturidade, o ar da segurança que não depende da forma física, mas com uma identidade eterna, mais sublime do que esta.
Em momentos como aquele na mata, descobri que Deus não se limita a nosso gênero, como nós nos limitamos. Ele nos usa em todo nosso potencial humano, homens ou mulheres. Porque sou mulher, sou capaz de amar com mais ternura e misericórdia, abraçar, receber, amamentar, encarnar o Deus-mãe que tantas vezes precisamos. Em resumo, tem a ver com ser mulher, e se sentir nua neste mundo masculino, e com o valor que temos diante de Deus, apesar de tudo...
*Texto atualizado em 08/05/2009.
• Bráulia Ribeiro, missionária em Porto Velho, RO, é autora de Chamado Radical (Editora Ultimato). braulia.ribeiro@uol.com.br
“Mulher, mas não inadequada” -- repetia enquanto voltava a dar meus passos desajeitados na lama. Chegamos depois de quase sete horas de caminhada. Revi minhas amigas antigas, vi as viúvas, as velhas e as novas adolescentes casadoiras. Conversamos principalmente sobre sexo e comida (os temas principais das conversas em todo mundo e também na tribo). Veio a tanga emprestada e o ritual da pintura, com leite de peito e cuspe. Veio a nudez e ela me caiu bem. Via os colegas de missão há alguns metros de distância um tanto constrangidos. Mas via também a alegria de minhas amigas indígenas e como celebraram minha chegada. Via meu bumbum branco como lua cheia, meus seios à mostra, mas não me envergonhava mais. Não sou inadequada. Estava ali por Jesus e em Jesus me movia.
Minha colega tomou coragem na minha coragem e também se desnudou. Então as meninas da tribo nos tomaram pela mão e nos levaram para outra casa comunitária próxima de onde celebramos longamente e com muito canto, choro e orações, a presença de Deus em nosso meio, no meio do povo, seu consolo para os corações cansados, seu perdão para os corações amargurados. Para aquele momento eu tinha sido feita mulher.
Aquela viagem foi mais do que “missiológica”. Descobri que minha identidade em Deus não tem nada a ver com meu bumbum. Para uma mulher, reconhecer isto significa se libertar de muitas pressões. Significa respirar com liberdade o ar da maturidade, o ar da segurança que não depende da forma física, mas com uma identidade eterna, mais sublime do que esta.
Em momentos como aquele na mata, descobri que Deus não se limita a nosso gênero, como nós nos limitamos. Ele nos usa em todo nosso potencial humano, homens ou mulheres. Porque sou mulher, sou capaz de amar com mais ternura e misericórdia, abraçar, receber, amamentar, encarnar o Deus-mãe que tantas vezes precisamos. Em resumo, tem a ver com ser mulher, e se sentir nua neste mundo masculino, e com o valor que temos diante de Deus, apesar de tudo...
*Texto atualizado em 08/05/2009.
• Bráulia Ribeiro, missionária em Porto Velho, RO, é autora de Chamado Radical (Editora Ultimato). braulia.ribeiro@uol.com.br
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