Opinião
- 08 de maio de 2009
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Modelos para relacionar ciência e religião*
Gould sustentou ainda que a ciência lida com fatos, ao passo que a religião lida com ética, valores e propósito. Gould não foi o primeiro a sustentar isso, mas vamos aproveitar o rótulo “MNI”, inventado por ele, por ser muito conveniente.
Apoio para o modelo
A melhor evidência em favor do modelo MNI é precisamente aquela citada por Gould: de fato, ciência e religião levantam questões de tipos bem diferentes sobre o mundo. A ciência se interessa por explicações mecanicistas, que elucidem a origem e o funcionamento das coisas. Ela busca generalizações amplas, que descrevam as propriedades da matéria para viabilizar predições acuradas. A ciência busca expressões matemáticas de dados, sempre que possível. O teste experimental e a replicabilidade são fatores críticos para o método científico. A religião, em contraste, se interessa por questões últimas; como no famoso aforismo de Leibiniz: “Porque há alguma coisa ao invés de nada?” A religião quer saber, em primeiro lugar, porque a ciência é possível. Nas palavras de Stephen Hawking: “O que põe fogo nas equações?” Porque o universo se dá ao trabalho de existir? Teria a vida um significado ou propósito supremo? Deus existe? Como deveríamos agir no mundo? Gould estava certo: ciência e religião levantam questões de tipos diferentes.
Uma crítica do modelo MNI
Três críticas principais podem ser levantadas contra o MNI. A primeira é histórica. O próprio Gould mina fatalmente o seu modelo ao escrever cativantes ensaios sobre figuras chave na história da ciência cujas ideias foram grandemente influenciadas por suas crenças religiosas.17 O tráfego constante de ideias entre a ciência e a religião ao longo de séculos, e ainda hoje, é um ponto contra a tese de que elas existem em domínios separados.
A segunda crítica principal destaca que, embora a ciência e a religião levantem, sim, questões qualitativamente diferentes, o fato é que ambas se referem à mesma realidade. A ciência deve seu sucesso à natureza restrita de suas indagações. No entanto, mesmo este foco limitado põe à mostra fatos que, para muitos cientistas, têm sentido religioso. O Professor Paul Davies, por exemplo, um cosmologista que não adota nenhuma crença religiosa tradicional, descobriu-se forçado, diante do elegante ajuste-fino das leis que estruturam o universo, a considerar as explicações religiosas.18 Tais conclusões não deveriam acontecer, se o MNI fosse correto em sua versão “forte”.
Um terceiro problema do modelo advém do fato bastante óbvio de que tanto a ciência como a religião são atividades profundamente humanas. O cientista com crenças religiosas, que trabalha na segunda-feira com uma equipe de pesquisa na bancada de um laboratório, é a mesma pessoa que adora a Deus com outras pessoas no domingo, em uma igreja. Embora as duas atividades sejam claramente distintas, o cérebro simplesmente não foi projetado para compartimentalizar as diferentes facetas de nossas vidas, como se elas carecessem de conexões. De fato, muitos cristãos encontram sinergias poderosas entre a vida de fé e a vivência científica.19 Ademais, crentes religiosos cuja fé requer bases evidenciais argumentariam que suas crenças religiosas são tão factuais como as suas crenças científicas. Estas características bem estabelecidas do pensamento e da experiência religiosa não se encaixam prontamente com o modelo MNI.
3. Modelos de fusão
Modelos de fusão representam o oposto polar do modelo MNI, na sua tendência de apagar completamente a distinção entre os tipos científico e religioso de conhecimento, ou na tentativa de utilizar a ciência para construir sistemas religiosos de pensamento, ou vice-versa. O uso do plural (“modelos”) é necessário porque há uma diversidade de estratégias para a fusão.
Modelos de fusão que partem da ciência para a religião são mais favorecidos em sistemas monistas do que em sistemas dualistas de pensamento. Pensar o conhecimento de Deus (teologia) como algo distinto do conhecimento da ordem material (ciência) é mais fácil em culturas influenciadas pelas fés abraâmicas, que tradicionalmente distinguem entre Deus e sua criação. Em contraste, para culturas influenciadas pelos sistemas monistas de pensamento do hinduísmo e do budismo, nos quais todo conhecimento é visto como parte da mesma realidade suprema, até mesmo o falar sobre “relacionar conhecimento científico e religioso” pode soar bem ambíguo. Se todo conhecimento é enfim uma parte da mesma realidade, como em princípio estes domínios podem estar separados?
Apoio para o modelo
A melhor evidência em favor do modelo MNI é precisamente aquela citada por Gould: de fato, ciência e religião levantam questões de tipos bem diferentes sobre o mundo. A ciência se interessa por explicações mecanicistas, que elucidem a origem e o funcionamento das coisas. Ela busca generalizações amplas, que descrevam as propriedades da matéria para viabilizar predições acuradas. A ciência busca expressões matemáticas de dados, sempre que possível. O teste experimental e a replicabilidade são fatores críticos para o método científico. A religião, em contraste, se interessa por questões últimas; como no famoso aforismo de Leibiniz: “Porque há alguma coisa ao invés de nada?” A religião quer saber, em primeiro lugar, porque a ciência é possível. Nas palavras de Stephen Hawking: “O que põe fogo nas equações?” Porque o universo se dá ao trabalho de existir? Teria a vida um significado ou propósito supremo? Deus existe? Como deveríamos agir no mundo? Gould estava certo: ciência e religião levantam questões de tipos diferentes.
Uma crítica do modelo MNI
Três críticas principais podem ser levantadas contra o MNI. A primeira é histórica. O próprio Gould mina fatalmente o seu modelo ao escrever cativantes ensaios sobre figuras chave na história da ciência cujas ideias foram grandemente influenciadas por suas crenças religiosas.17 O tráfego constante de ideias entre a ciência e a religião ao longo de séculos, e ainda hoje, é um ponto contra a tese de que elas existem em domínios separados.
A segunda crítica principal destaca que, embora a ciência e a religião levantem, sim, questões qualitativamente diferentes, o fato é que ambas se referem à mesma realidade. A ciência deve seu sucesso à natureza restrita de suas indagações. No entanto, mesmo este foco limitado põe à mostra fatos que, para muitos cientistas, têm sentido religioso. O Professor Paul Davies, por exemplo, um cosmologista que não adota nenhuma crença religiosa tradicional, descobriu-se forçado, diante do elegante ajuste-fino das leis que estruturam o universo, a considerar as explicações religiosas.18 Tais conclusões não deveriam acontecer, se o MNI fosse correto em sua versão “forte”.
Um terceiro problema do modelo advém do fato bastante óbvio de que tanto a ciência como a religião são atividades profundamente humanas. O cientista com crenças religiosas, que trabalha na segunda-feira com uma equipe de pesquisa na bancada de um laboratório, é a mesma pessoa que adora a Deus com outras pessoas no domingo, em uma igreja. Embora as duas atividades sejam claramente distintas, o cérebro simplesmente não foi projetado para compartimentalizar as diferentes facetas de nossas vidas, como se elas carecessem de conexões. De fato, muitos cristãos encontram sinergias poderosas entre a vida de fé e a vivência científica.19 Ademais, crentes religiosos cuja fé requer bases evidenciais argumentariam que suas crenças religiosas são tão factuais como as suas crenças científicas. Estas características bem estabelecidas do pensamento e da experiência religiosa não se encaixam prontamente com o modelo MNI.
3. Modelos de fusão
Modelos de fusão representam o oposto polar do modelo MNI, na sua tendência de apagar completamente a distinção entre os tipos científico e religioso de conhecimento, ou na tentativa de utilizar a ciência para construir sistemas religiosos de pensamento, ou vice-versa. O uso do plural (“modelos”) é necessário porque há uma diversidade de estratégias para a fusão.
Modelos de fusão que partem da ciência para a religião são mais favorecidos em sistemas monistas do que em sistemas dualistas de pensamento. Pensar o conhecimento de Deus (teologia) como algo distinto do conhecimento da ordem material (ciência) é mais fácil em culturas influenciadas pelas fés abraâmicas, que tradicionalmente distinguem entre Deus e sua criação. Em contraste, para culturas influenciadas pelos sistemas monistas de pensamento do hinduísmo e do budismo, nos quais todo conhecimento é visto como parte da mesma realidade suprema, até mesmo o falar sobre “relacionar conhecimento científico e religioso” pode soar bem ambíguo. Se todo conhecimento é enfim uma parte da mesma realidade, como em princípio estes domínios podem estar separados?
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