Opinião
- 23 de janeiro de 2024
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Meio ambiente e esperança: vivendo a fé cristã em meio à crise climática
Os “epicureus climáticos” e os seguidores de Jesus
Por Carlos Henrique
No mês de dezembro de 2023, tive a oportunidade participar da 28ª Conferência do Clima da ONU (COP-28), em Dubai. Acompanhei de perto alguns dos debates sobre a crise climática atual. Fiquei impressionado com o senso de urgência demonstrado pelos milhares de ativistas climáticos, políticos e lideranças de base de todo o mundo presentes no evento.
Durante algumas discussões, lembro-me de ter ouvido algo semelhante a: “A extinção em massa resultante das atividades humanas é um fenômeno que, assim como outras extinções em massa na história da Terra, tem sua própria natureza, embora esteja inserida no contexto mais amplo das transformações globais. O que buscamos é adiá-la.” Em outras palavras, a ideia de que a extinção humana é irreversível e lutar pelo clima significa tentar prolongar nossa possibilidade de prazeres terrenos.
Essa afirmação é profundamente egoísta, pois negligencia os cuidados com a Criação ou a coloca como um fim em si mesma (só cuidamos da Criação porque ela está em crise), dependendo da perspectiva que você interpreta os fatos. A afirmação torna-nos extremistas a ponto de negligenciarmos nossa responsabilidade humana para com a Criação de Deus. Nas entrelinhas, sugere a ideia de que a vida humana termina em si mesma, seguindo o ditado epicureu, citado pelo apóstolo Paulo: “comamos e bebamos, porque amanhã morreremos” (1Co 15.32).
Mesmo com o passar do tempo, é interessante notar que não há nada novo embaixo do sol para a sociedade. A ideia epicurista persiste. Os epicuristas acreditavam que se os mortos não ressuscitam devemos aproveitar ao máximo esta curta vida. Esta mentalidade parece ecoar entre aqueles que poderiam ser chamados de “epicureus climáticos”, que seguem esbravejando que o fim é inevitável e por isso deveríamos aproveitar todo o conforto disponível, consumindo tudo que é possível, fazendo do prazer nosso bem principal. E o meio ambiente, nesse cenário, é apenas algo com que temos de lidar para prolongar nosso prazer.
Eles não têm perspectiva, não desejam o céu, e, portanto, buscam a felicidade aqui e se entregam ao prazer desenfreado nesta vida, sendo contidos apenas ao perceber que isso pode ajudá-los a preservar os prazeres por mais tempo. Para eles, combater as queimadas, frear o desmatamento, apoiar a transição energética, o fim dos combustíveis fósseis, entre muitas outras pautas é apenas o meio para sobreviver alguns anos mais, talvez décadas, ou até para encontrar um meio com que possam explorar desenfreadamente sem peso na consciência.
Essa visão de mundo é assustadora por si só, mas é ainda mais preocupante quando é adotada por seguidores de Jesus que conhecem o desfecho da história. Isso me leva a questionar: por que nós, como seguidores de Jesus, diante da devastação causada também por nossas ações para com a Criação de Deus, não choramos, jejuamos e nos humilhamos em vez de nos entregarmos as mesmas práticas dos “epicureus climáticos”?
Precisamos relembrar que a fé cristã oferece uma perspectiva totalmente diferente. O Evangelho nos insta a viver com esperança e responsabilidade, não apenas pelo futuro, mas também pelo presente. Não somos chamados a viver de maneira egoísta, focados apenas em nossa existência terrena, mas a sermos zelosos cuidadores da criação de Deus, agindo com amor e responsabilidade para com o meio ambiente.
Em Romanos 8.19-21, somos ensinados que toda a criação aguarda a revelação dos filhos de Deus e será libertada da corrupção para a liberdade da glória dos filhos de Deus. Nossa fé não nos leva à resignação, mas à ação baseada na esperança que temos em Cristo. Devemos agir não porque o fim é inevitável, mas porque Deus nos deu a responsabilidade de sermos fiéis zeladores do seu mundo.
O desafio que enfrentamos, como cristãos, não é adotar uma visão fatalista do futuro, mas viver responsavelmente, cuidando da criação de Deus enquanto aguardamos sua restauração final. Devemos ser exemplos de amor, cuidado e responsabilidade para com o ambiente em que vivemos, refletindo a esperança que temos em Cristo para um futuro melhor nesta vida e na vida eterna. É bem verdade que a maior parte de nós não tem o poder de provocar medidas de impacto global, mas também é verdade que a cada um de nós foi entregue a responsabilidade de cuidar da Criação de Deus (Gn 2.15).
Normalmente, a pergunta que se segue é: “Entendi minha responsabilidade, mas por onde começar?” A resposta é simples: comece com o que você já tem em casa. Hábitos sustentáveis estão relacionados à forma como vivemos. É comum pensar que mudar hábitos requer gastos extras, mas a mudança começa com o uso do que já temos e, à medida que algo acabar, pense em como tornar esse hábito mais sustentável.
Na hora de comprar, opte por produtos de pequenos comerciantes e produtores, pesquise marcas de produtos de higiene pessoal, limpeza, comida etc que assumem responsabilidade ecológica. Há uma infinidade de possibilidades e tenho certeza de que encontrará uma que se adeque a sua realidade financeira. Na hora de descartar algo, pense se é possível consertá-lo ou, se enjoou de algo que ainda está novo, pense em doar, ou, se este algo está muito velho, pense em como fazer o descarte correto do produto. Se não sabe como descartar algum produto e não encontra orientação de como fazê-lo, me chama no Instagram que terei o maior prazer em ajudar.
Troque os embalados por produto a granel. Constantemente escuto que precisamos desembalar menos e descascar mais, e é verdade. Os industrializados necessitam de conservantes, e muitos estão cheios de agrotóxicos e outros venenos que, geralmente, são extremamente poluentes e, além disso, tendem a ser mais caros. A dica é: compre a granel, aprenda a fazer alguns produtos, valorize o preparo dos alimentos. Quando buscamos produtos in natura temos maior certeza que está fresco, bonito, e é mais justo com o produtor que não precisará que um terceiro faça o pagamento (normalmente são pagos valores injustos).
Fuja dos descartáveis! Ande com sua própria garrafa ou copo de água, tenha a mão um kit de talheres de madeira e canudos metálicos, ande com uma ecobag na mochila ou na bolsa, leve com você o lixo que produzir na rua até que possa descartá-lo corretamente.
Nós já provamos que não possuímos maturidade para lidar com os descartáveis. O que era para ser uma exceção virou a regra e agora temos que lidar com o fato de existir microplástico nos nossos pulmões, corações, placenta, corrente sanguínea etc.
Escolha um hábito para mudar por vez. Para mantê-lo, converse com quem está a sua volta e conte que você está mudando e quer contar com a ajuda dessa pessoa para lembrar da mudança em curso. Crie formas de lembrar do novo hábito – desde deixar o canudo de metal do lado da mochila para só pegar quando estiver indo para aula ou trabalho, até deixar um alarme no celular ou um bilhete na porta da geladeira para você ser lembrado logo que acordar.
Enfim, você precisa compreender que está imerso em um processo contínuo. Em sua jornada em direção a aprender ser um mordomo melhor da Criação de Deus, criando hábitos ambientais mais sustentáveis, é possível que encontre obstáculos e cometa erros. No entanto, o cerne está em sua capacidade de se reerguer após cada queda e seguir adiante.
Lembre-se que essa jornada é profundamente espiritual. Assim como no nosso relacionamento com Deus, não se espera perfeição mas sim um esforço sincero, uma mentalidade compassiva. Em vez de se deixar desanimar pelos contratempos, permita que eles o fortaleçam. A jornada em prol do meio ambiente é uma maratona, não uma corrida de velocidade. Cada pequeno passo na direção certa conta, e cada esforço para retomar o caminho após um desvio é uma vitória. Portanto, encare cada dia como uma nova oportunidade para fazer escolhas conscientes e sustentáveis, sabendo que, mesmo diante das dificuldades, você está cumprindo a vontade de Deus.
Que, como filhos de Deus, possamos encarar o desafio de preservar o meio ambiente com a convicção de que nossa esperança não está apenas neste mundo passageiro, mas na eternidade que nos aguarda. Que cada ação nossa seja um reflexo do amor e da responsabilidade que Deus nos confiou como mordomos de sua Criação. Que Deus nos conceda sabedoria e força para sermos fiéis em nosso chamado de cuidar amorosamente da Terra, enquanto aguardamos a restauração completa dela.
- Carlos Henrique, 30 anos, é engenheiro florestal, estudante de teologia, especialista em educação e gestão ambiental.
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