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- 21 de setembro de 2017
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Juristas evangélicos se pronunciam sobre liminar que “autoriza a cura gay”
O Conselho Diretivo Nacional (CDN), da Associação Nacional de Juristas Evangélicos (ANAJURE), divulgou nesta quarta-feira (20/09) uma Nota Pública sobre a decisão liminar emitida no último dia 15/09 pelo juiz federal, Waldemar Cláudio de Carvalho, da 14ª vara do Distrito Federal. A decisão determina que o Conselho Federal de Psicologia não interprete a Resolução 001/1999 de maneira que proíba os psicólogos de promoverem estudos ou atendimento profissional, de forma reservada, no que se refere à (re) orientação sexual.
A ANAJURE concorda com a decisão judicial e afirma que a liminar “interpreta a Resolução de modo correto, na medida em que não consente com a limitação da liberdade profissional que o psicólogo tem de aprofundar seu conhecimento científico para o atendimento de pessoas que voluntariamente o procurem, inclusive, habilitando-o para, tecnicamente, atuar nos casos de reorientação sexual”.
Os juristas evangélicos também destacam que qualquer “o indivíduo tem o direito constitucional de escolher o sentido para o qual direcionará seu comportamento sexual. Em concreto, se um indivíduo – homossexual ou heterossexual – expressa o desejo de mudar ou reorientar seu comportamento sexual, e procura um atendimento psicológico para auxiliar nesse processo, não se pode obrigar que este seja, obrigatoriamente, no sentido da manutenção de sua atual condição ou identidade, biológica ou não”.
O documento afirma ainda que “impedir que o profissional de psicologia proceda a pesquisas e estudos científicos, e mesmo ao efetivo exercício da orientação sexual para pacientes que, voluntariamente, procurem orientação, significa ferir a dignidade da pessoa humana daqueles que optam pela aceitação de sua identidade biológica, visto que lhes cerceia uma possibilidade de saírem da situação que os aflige. Novamente, a liberdade de aceitar a identidade biológica é tão legítima quanto a reversão dela.”
A decisão judicial foi alvo de inúmeras críticas nas redes sociais após grandes veículos de comunicação taxarem a decisão como uma “autorização para a cura gay”.
Entenda o caso
A decisão do juiz federal, Waldemar Cláudio de Carvalho, da 14ª vara do Distrito Federal, emitida no último dia 15/09, diz respeito ao julgamento de uma Ação Popular nº 1011189-79.2017.0.01.34000, de autoria de Rozangela Alves Justino e outros, contra o Conselho Federal de Psicologia (CFP).
Os autores da Ação Popular alegam que a resolução é um ato de censura e que “impede os psicólogos de desenvolver estudos, atendimentos e pesquisas científicas acerca dos comportamentos ou práticas homoeróticas, constituindo-se, assim, em um ato lesivo ao patrimônio cultural e científico do país, na medida em que restringe a liberdade de pesquisa científica assegurada a todos os psicólogos pela Constituição”.
O magistrado justificou a decisão alegando que alguns dispositivos da Resolução podem levar a uma interpretação equivocada “no sentido de considerar vedado ao psicólogo realizar qualquer estudo ou atendimento relacionados à orientação ou reorientação sexual”.
Acesse os documentos na íntegra
Resolução 001/1999 do Conselho Federal de Psicologia.
Ata de Audiência em que liminar foi deferida.
Nota Pública da Anajure.
Nota Pública sobre a decisão judicial liminar que tratou da Resolução n. 01/99 do Conselho Federal de Psicologia
O Conselho Diretivo Nacional – CDN da Associação Nacional de Juristas Evangélicos – ANAJURE –, no uso das suas atribuições estatutárias e regimentais, emite a presente Nota Pública acerca da decisão judicial liminar proferida pelo Juízo da 14ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, nos autos da Ação Popular n. 1011189-79.2017.4.01.3400, sobre os efeitos da Resolução n. 01/99 do Conselho Federal de Psicologia – CFP.
1 – SÍNTESE DA DEMANDA E DA DECISÃO JUDICIAL
A Ação, cuja autoria é formada por um grupo de 23 (vinte e três) psicólogos, foi proposta com o escopo de obter a suspensão dos efeitos da Resolução n. 01/99 do Conselho Federal de Psicologia - CFP, que estabeleceu normas de atuação dos profissionais da psicologia, quando a questão se tratar de orientação sexual.
Os autores alegam no seu pleito inicial que dita Resolução consiste em ato de censura, pois “impede os psicólogos de desenvolver estudos, atendimentos e pesquisas científicas acerca dos comportamentos ou práticas homoeróticas, constituindo-se, assim, em um ato lesivo ao patrimônio cultural e científico do País, na medida em que restringe a liberdade de pesquisa científica assegurada a todos os psicólogos pela Constituição, em seu art. 5º, IX” (fl. 1 da decisão liminar em questão).
O Magistrado designou audiência de justificação prévia, prevista no art. 300 do Código de Processo Civil, para esclarecer pontos sobre a demanda. Dadas as respostas pela parte Autora, bem como após escorreita análise dos termos da Resolução atacada, o decisum caminhou parcialmente favorável ao pedido exordial.
Em suas razões, o Juízo frisou que alguns dispositivos da Resolução n. 01/99 do CFP podem ferir a garantia constitucional da “liberdade científica bem como a plena realização da dignidade da pessoa humana, inclusive sob o aspecto de sua sexualidade, valores que não podem ser desrespeitados por um ato normativo infraconstitucional, no caso, uma resolução editada pelo C.F.P” (fl. 3).
Com vistas a dar uma interpretação conforme à Constituição Federal, no âmbito de controle de constitucionalidade difuso por ele exercido, entendeu o insigne Juízo que a Resolução deve se conduzir no sentido de “não privar o psicólogo de estudar ou atender aqueles que, voluntariamente, venham em busca de orientação acerca de sua sexualidade, sem qualquer forma de censura, preconceito ou discriminação”, reconhecendo a complexidade e profundidade do tema.
Nesse sentido, o provimento liminar determinou “ao Conselho Federal de Psicologia que não a interprete de modo a impedir os psicólogos de promoverem estudos ou atendimento profissional, de forma reservada, pertinente à (re)orientação sexual, garantindo-lhes, assim, plena liberdade científica acerca da matéria, sem qualquer censura ou necessidade de licença prévia por parte do C.F.P., em razão do disposto no art. 5º, inciso IX, da Constituição de 1988” (fl.4).
II – DA POSIÇÃO INSTITUCIONAL DA ANAJURE FRENTE AO CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA:
Inicialmente, esclarecemos que a ANAJURE tem atuado junto ao Conselho Federal de Psicologia, buscando parceria de atuação e diálogo no que se refere à correta interpretação e aplicação da Resolução Nº 01/99, tanto que, no mês de março de 2015, em reunião com a então presidente do referido CFP, a Dra. Mariza Borges, e a Gerente Técnica, Dra. Lislly Telles de Barros, a ANAJURE apresentou Requerimento para que o CFP se posicionasse sobre a atuação dos psicólogos em relação à Resolução n. 01/99, especialmente quanto àqueles que professam uma religião, em razão do direito constitucional de liberdade profissional e de crença.[1]
No Requerimento apresentado à época, a ANAJURE trouxe à consideração do CFP, entre outros pontos:
“(vi) Que este Conselho Federal de Psicologia posicionou-se em 28/02/2012, através de nota pública de esclarecimento à sociedade e aos psicólogos, sobre a questão da “psicologia versus religiosidade no exercício profissional”, afirmando inexistir oposição entre uma e outra, pelo contrário, já que a psicologia é uma ciência que reconhece que a religiosidade e a fé estão presentes na cultura e participam na constituição da dimensão subjetiva de cada pessoa, e que a relação dos indivíduos com o sagrado pode ser analisada pelo profissional psicólogo, mas nunca imposto por ele às pessoas com os quais trabalha, sob pena de caracterização de proselitismo.
(vii) Que há entendimentos contraditórios no meio acerca da Resolução CFP nº. 01, de 22 de Março de 1999, no que tange à possibilidade de atendimento de pessoas com conflito na sua sexualidade por profissionais da psicologia que professam uma determinada religião – notadamente, os cristãos – no sentido de que estão proibidos de proceder à sua reorientação sexual, mesmo com pedido do paciente e aplicando técnicas, métodos e meios regulamentados ou reconhecidos pela profissão. Tratar-se-ia, tal entendimento, de grave violação aos princípios e preceitos constitucionais da Liberdade Religiosa, ensejando, na forma da Lei nº 7.716 de 05 de Janeiro de 1989 – que trata de crimes resultantes de preconceito, de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional – tipificação penal por parte da autoridade que assim o cometesse”.
Por tal razão, requeremos àquele insigne Conselho Federal de Psicologia que:
“Assim, diante dos excertos acima descritos, servimo-nos da presente CONSULTA para REQUERER a este insigne Conselho Federal de Psicologia que se posicione formalmente sobre a atuação dos profissionais de psicologia, com base na citada Resolução CFP nº. 001/99, de 22 de Março de 1999, especialmente quanto a atuação dos psicólogos que professam uma religião – notadamente, os cristãos – no que tange ao direito constitucional de liberdade profissional e de crença mencionados acima, combinado com as disposições constantes no Código de Ética Profissional, para:
1) Manifestar-se expressamente, respondendo a esta Consulta, sobre a possibilidade de psicólogos cristãos receberem e atenderem quaisquer pacientes que tenham conflitos em sua sexualidade, estando autorizados a aplicar técnicas, métodos e meios reconhecidos ou regulamentados pela profissão, na orientação ou reorientação dessas pessoas com relação a sua sexualidade, inexistindo qualquer impedimento legal, ético ou profissional quanto a essa atuação, sendo esta a única interpretação admitida para a Resolução CFP nº. 001/99;
2) Que, destarte, seja também emitida por este insigne Conselho Federal de Psicologia Nota Pública à sociedade e psicólogos em geral”.
Lamentavelmente, inobstante todo este movimento de parceria e busca de respeito diálogo com vistas, tão-somente, à implementação de soluções a fim de dirimir os atuais conflitos, nossa expectativa de parceria com o CFP, na prática, demonstrou-se infrutífera, tendo em vista a omissão institucional deste Conselho em relação ao nosso requerimento.
III – DA POSIÇÃO INSTITUCIONAL DA ANAJURE FRENTE AO DECISUM DA JUSTIÇA FEDERAL:
Em relação à decisão judicial em análise, considerando o contexto alhures exposto, o Conselho Diretivo Nacional da Associação Nacional de Juristas Evangélicos – ANAJURE tem seu posicionamento em linha de concordância com os termos do Decisum, ainda que se possa questionar que importante decisão tenha sido tomada em sede liminar, num âmbito de cognição sumária e não exauriente.
Para além das motivações nela discorridas, vale destacar – e neste ponto a ANAJURE sempre se alinhou ao CFP – que a Resolução n. 01/99 do Conselho Federal de Psicologia não proíbe o atendimento psicológico a pacientes que procurem voluntariamente fazer tratamento de reorientação sexual. Com efeito, determina que os profissionais não atribuam o caráter de patologia à homossexualidade, oferecendo promessas de cura. Seu art. 3º dispõe que “os psicólogos não exercerão ... ação coercitiva tendente a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados”. Percebe-se que a vedação normativa se direciona à imposição de tratamentos cujo objetivo é a (re)orientação sexual, sem ato de vontade ou consentimento do paciente.
Como apresentamos em nosso Requerimento de 31 de março de 2015 ao CFP, reconhecemos que a Resolução N.º 01/99 não havia sido clara em relação à atuação dos psicólogos, quando interpelados por questões ligadas à sexualidade, o que provocou questionamentos e, sobretudo, dúvidas, no âmbito dos profissionais e da sociedade civil. A decisão judicial, assim – acertadamente, do nosso ponto de vista –, interpreta a Resolução de modo correto, na medida que não consente com a limitação da liberdade profissional que o psicólogo tem de aprofundar seu conhecimento científico para o atendimento de pessoas que voluntariamente o procurem, inclusive, habilitando-o para, tecnicamente, atuar nos casos de reorientação sexual.
Se assim não for, a norma editada pelo CFP incorrerá em violação ao art. 5º, incisos IX e XIII da CF/88, que garantem a liberdade no exercício de atividade científica e o livre exercício da atividade profissional, atendidas as qualificações exigidas por lei. Estar-se-á ferindo, ainda, o princípio I do Código de Ética Profissional do Psicólogo, o qual elenca a liberdade, a dignidade, a igualdade e a integridade do ser humano como fundamentos do trabalho do psicólogo.
Outrossim, violar-se-ia a liberdade de consciência – art. 5º, VI e autonomia da vontade do próprio indivíduo, que é livre para buscar orientação psicológica não somente para questões sexuais, como para todos os conflitos e necessidades que lhes são pertinentes.
Com efeito, o indivíduo tem o direito constitucional de escolher o sentido para o qual direcionará seu comportamento sexual. Em concreto, se um indivíduo – homossexual ou heterossexual – expressa o desejo de mudar ou reorientar seu comportamento sexual, e procura um atendimento psicológico para auxiliar nesse processo, não se pode obrigar que este seja, obrigatoriamente, no sentido da manutenção de sua atual condição ou identidade, biológica ou não.
Do mesmo modo, impedir que o profissional de psicologia proceda a pesquisas e estudos científicos, e mesmo ao efetivo exercício da orientação sexual para pacientes que, voluntariamente, procurem orientação, significa ferir a dignidade da pessoa humana daqueles que optam pela aceitação de sua identidade biológica, visto que lhes cerceia uma possibilidade de saírem da situação que os aflige. Novamente, a liberdade de aceitar a identidade biológica é tão legítima quanto a reversão dela.
Nessa linha, cremos que a decisão em comento é legítima, eis que emanada do Poder Judiciário, pautada no devido processo legal e fundamentada solidamente em normas do nosso ordenamento jurídico, demandando, portanto, o dever de cumprimento pelo seu destinatário como medida de respeito à concretização dos direitos constitucionais (e infraconstitucionais) expressos no decisum, e preservação da dignidade da justiça, elementos que marcam o Estado Democrático de Direito.
Aliás, a sociedade em sua totalidade deve estar comprometida com a execução das decisões judiciais, refletindo o respeito ao Poder Judiciário e contribuindo à efetiva prestação jurisdicional.
Repise-se que a decisão judicial, objeto desta Nota, foi proferida em sede de cognição sumária, não exaurindo, completamente, a jurisdição singular. Não obstante, tal fato não ilide, nem abranda a sua força judicante, impondo-se a observância de seus termos pelo destinatário e por todos aqueles a quem compete o seu implemento.
Vale ressaltar que a decisão em destaque não altera o núcleo das previsões e motivações da Resolução 01/99 do CFP, como querem, alguns, fazer crer. Em suma: se mantém a previsão de que a homossexualidade não constitui doença ou patologia, assim como a previsão de que não serão adotadas ações coercitivas tendentes a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados, e, a proibição de os psicólogos colaborarem com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades, medidas que nos parecem adotadas acertadamente pelo CFP.
Finalmente, expressamos nossa preocupação e repúdio pelo fato de que os principais veículos de comunicação do Brasil distorceram ou, no mínimo, omitiram-se sobre o conteúdo técnico da decisão judicial, utilizando manchetes com expressões como “cura gay”, que não refletem a realidade do decisum e que não contribuem, em absolutamente nada, para o aprofundamento e análises que tema merece.
Nestes termos, a Associação Nacional dos Juristas Evangélicos – ANAJURE, RESOLVE alinhar-se com a decisão liminar prolatada pelo Juízo da 14ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, por ser juridicamente sólida, defendendo-a nos termos outrora explicados.
Brasília, 20 de setembro de 2017
Dr. Uziel Santana
Presidente do Conselho Diretivo Nacional da ANAJURE
Dr. Augusto Ventura
Diretor Jurídico da ANAJURE
________________________________
[1] ANAJURE se reúne com Presidente Conselho Federal de Psicologia e traça metas de atuação conjunta. https://www.anajure.org.br/anajure-se-reune-com-presidente-conselho-federal-de-psicologia-e-traca-metas-de-atuacao-conjunta/
A ANAJURE concorda com a decisão judicial e afirma que a liminar “interpreta a Resolução de modo correto, na medida em que não consente com a limitação da liberdade profissional que o psicólogo tem de aprofundar seu conhecimento científico para o atendimento de pessoas que voluntariamente o procurem, inclusive, habilitando-o para, tecnicamente, atuar nos casos de reorientação sexual”.
Os juristas evangélicos também destacam que qualquer “o indivíduo tem o direito constitucional de escolher o sentido para o qual direcionará seu comportamento sexual. Em concreto, se um indivíduo – homossexual ou heterossexual – expressa o desejo de mudar ou reorientar seu comportamento sexual, e procura um atendimento psicológico para auxiliar nesse processo, não se pode obrigar que este seja, obrigatoriamente, no sentido da manutenção de sua atual condição ou identidade, biológica ou não”.
O documento afirma ainda que “impedir que o profissional de psicologia proceda a pesquisas e estudos científicos, e mesmo ao efetivo exercício da orientação sexual para pacientes que, voluntariamente, procurem orientação, significa ferir a dignidade da pessoa humana daqueles que optam pela aceitação de sua identidade biológica, visto que lhes cerceia uma possibilidade de saírem da situação que os aflige. Novamente, a liberdade de aceitar a identidade biológica é tão legítima quanto a reversão dela.”
A decisão judicial foi alvo de inúmeras críticas nas redes sociais após grandes veículos de comunicação taxarem a decisão como uma “autorização para a cura gay”.
Entenda o caso
A decisão do juiz federal, Waldemar Cláudio de Carvalho, da 14ª vara do Distrito Federal, emitida no último dia 15/09, diz respeito ao julgamento de uma Ação Popular nº 1011189-79.2017.0.01.34000, de autoria de Rozangela Alves Justino e outros, contra o Conselho Federal de Psicologia (CFP).
Os autores da Ação Popular alegam que a resolução é um ato de censura e que “impede os psicólogos de desenvolver estudos, atendimentos e pesquisas científicas acerca dos comportamentos ou práticas homoeróticas, constituindo-se, assim, em um ato lesivo ao patrimônio cultural e científico do país, na medida em que restringe a liberdade de pesquisa científica assegurada a todos os psicólogos pela Constituição”.
O magistrado justificou a decisão alegando que alguns dispositivos da Resolução podem levar a uma interpretação equivocada “no sentido de considerar vedado ao psicólogo realizar qualquer estudo ou atendimento relacionados à orientação ou reorientação sexual”.
Acesse os documentos na íntegra
Resolução 001/1999 do Conselho Federal de Psicologia.
Ata de Audiência em que liminar foi deferida.
Nota Pública da Anajure.
Nota Pública sobre a decisão judicial liminar que tratou da Resolução n. 01/99 do Conselho Federal de Psicologia
O Conselho Diretivo Nacional – CDN da Associação Nacional de Juristas Evangélicos – ANAJURE –, no uso das suas atribuições estatutárias e regimentais, emite a presente Nota Pública acerca da decisão judicial liminar proferida pelo Juízo da 14ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, nos autos da Ação Popular n. 1011189-79.2017.4.01.3400, sobre os efeitos da Resolução n. 01/99 do Conselho Federal de Psicologia – CFP.
1 – SÍNTESE DA DEMANDA E DA DECISÃO JUDICIAL
A Ação, cuja autoria é formada por um grupo de 23 (vinte e três) psicólogos, foi proposta com o escopo de obter a suspensão dos efeitos da Resolução n. 01/99 do Conselho Federal de Psicologia - CFP, que estabeleceu normas de atuação dos profissionais da psicologia, quando a questão se tratar de orientação sexual.
Os autores alegam no seu pleito inicial que dita Resolução consiste em ato de censura, pois “impede os psicólogos de desenvolver estudos, atendimentos e pesquisas científicas acerca dos comportamentos ou práticas homoeróticas, constituindo-se, assim, em um ato lesivo ao patrimônio cultural e científico do País, na medida em que restringe a liberdade de pesquisa científica assegurada a todos os psicólogos pela Constituição, em seu art. 5º, IX” (fl. 1 da decisão liminar em questão).
O Magistrado designou audiência de justificação prévia, prevista no art. 300 do Código de Processo Civil, para esclarecer pontos sobre a demanda. Dadas as respostas pela parte Autora, bem como após escorreita análise dos termos da Resolução atacada, o decisum caminhou parcialmente favorável ao pedido exordial.
Em suas razões, o Juízo frisou que alguns dispositivos da Resolução n. 01/99 do CFP podem ferir a garantia constitucional da “liberdade científica bem como a plena realização da dignidade da pessoa humana, inclusive sob o aspecto de sua sexualidade, valores que não podem ser desrespeitados por um ato normativo infraconstitucional, no caso, uma resolução editada pelo C.F.P” (fl. 3).
Com vistas a dar uma interpretação conforme à Constituição Federal, no âmbito de controle de constitucionalidade difuso por ele exercido, entendeu o insigne Juízo que a Resolução deve se conduzir no sentido de “não privar o psicólogo de estudar ou atender aqueles que, voluntariamente, venham em busca de orientação acerca de sua sexualidade, sem qualquer forma de censura, preconceito ou discriminação”, reconhecendo a complexidade e profundidade do tema.
Nesse sentido, o provimento liminar determinou “ao Conselho Federal de Psicologia que não a interprete de modo a impedir os psicólogos de promoverem estudos ou atendimento profissional, de forma reservada, pertinente à (re)orientação sexual, garantindo-lhes, assim, plena liberdade científica acerca da matéria, sem qualquer censura ou necessidade de licença prévia por parte do C.F.P., em razão do disposto no art. 5º, inciso IX, da Constituição de 1988” (fl.4).
II – DA POSIÇÃO INSTITUCIONAL DA ANAJURE FRENTE AO CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA:
Inicialmente, esclarecemos que a ANAJURE tem atuado junto ao Conselho Federal de Psicologia, buscando parceria de atuação e diálogo no que se refere à correta interpretação e aplicação da Resolução Nº 01/99, tanto que, no mês de março de 2015, em reunião com a então presidente do referido CFP, a Dra. Mariza Borges, e a Gerente Técnica, Dra. Lislly Telles de Barros, a ANAJURE apresentou Requerimento para que o CFP se posicionasse sobre a atuação dos psicólogos em relação à Resolução n. 01/99, especialmente quanto àqueles que professam uma religião, em razão do direito constitucional de liberdade profissional e de crença.[1]
No Requerimento apresentado à época, a ANAJURE trouxe à consideração do CFP, entre outros pontos:
“(vi) Que este Conselho Federal de Psicologia posicionou-se em 28/02/2012, através de nota pública de esclarecimento à sociedade e aos psicólogos, sobre a questão da “psicologia versus religiosidade no exercício profissional”, afirmando inexistir oposição entre uma e outra, pelo contrário, já que a psicologia é uma ciência que reconhece que a religiosidade e a fé estão presentes na cultura e participam na constituição da dimensão subjetiva de cada pessoa, e que a relação dos indivíduos com o sagrado pode ser analisada pelo profissional psicólogo, mas nunca imposto por ele às pessoas com os quais trabalha, sob pena de caracterização de proselitismo.
(vii) Que há entendimentos contraditórios no meio acerca da Resolução CFP nº. 01, de 22 de Março de 1999, no que tange à possibilidade de atendimento de pessoas com conflito na sua sexualidade por profissionais da psicologia que professam uma determinada religião – notadamente, os cristãos – no sentido de que estão proibidos de proceder à sua reorientação sexual, mesmo com pedido do paciente e aplicando técnicas, métodos e meios regulamentados ou reconhecidos pela profissão. Tratar-se-ia, tal entendimento, de grave violação aos princípios e preceitos constitucionais da Liberdade Religiosa, ensejando, na forma da Lei nº 7.716 de 05 de Janeiro de 1989 – que trata de crimes resultantes de preconceito, de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional – tipificação penal por parte da autoridade que assim o cometesse”.
Por tal razão, requeremos àquele insigne Conselho Federal de Psicologia que:
“Assim, diante dos excertos acima descritos, servimo-nos da presente CONSULTA para REQUERER a este insigne Conselho Federal de Psicologia que se posicione formalmente sobre a atuação dos profissionais de psicologia, com base na citada Resolução CFP nº. 001/99, de 22 de Março de 1999, especialmente quanto a atuação dos psicólogos que professam uma religião – notadamente, os cristãos – no que tange ao direito constitucional de liberdade profissional e de crença mencionados acima, combinado com as disposições constantes no Código de Ética Profissional, para:
1) Manifestar-se expressamente, respondendo a esta Consulta, sobre a possibilidade de psicólogos cristãos receberem e atenderem quaisquer pacientes que tenham conflitos em sua sexualidade, estando autorizados a aplicar técnicas, métodos e meios reconhecidos ou regulamentados pela profissão, na orientação ou reorientação dessas pessoas com relação a sua sexualidade, inexistindo qualquer impedimento legal, ético ou profissional quanto a essa atuação, sendo esta a única interpretação admitida para a Resolução CFP nº. 001/99;
2) Que, destarte, seja também emitida por este insigne Conselho Federal de Psicologia Nota Pública à sociedade e psicólogos em geral”.
Lamentavelmente, inobstante todo este movimento de parceria e busca de respeito diálogo com vistas, tão-somente, à implementação de soluções a fim de dirimir os atuais conflitos, nossa expectativa de parceria com o CFP, na prática, demonstrou-se infrutífera, tendo em vista a omissão institucional deste Conselho em relação ao nosso requerimento.
III – DA POSIÇÃO INSTITUCIONAL DA ANAJURE FRENTE AO DECISUM DA JUSTIÇA FEDERAL:
Em relação à decisão judicial em análise, considerando o contexto alhures exposto, o Conselho Diretivo Nacional da Associação Nacional de Juristas Evangélicos – ANAJURE tem seu posicionamento em linha de concordância com os termos do Decisum, ainda que se possa questionar que importante decisão tenha sido tomada em sede liminar, num âmbito de cognição sumária e não exauriente.
Para além das motivações nela discorridas, vale destacar – e neste ponto a ANAJURE sempre se alinhou ao CFP – que a Resolução n. 01/99 do Conselho Federal de Psicologia não proíbe o atendimento psicológico a pacientes que procurem voluntariamente fazer tratamento de reorientação sexual. Com efeito, determina que os profissionais não atribuam o caráter de patologia à homossexualidade, oferecendo promessas de cura. Seu art. 3º dispõe que “os psicólogos não exercerão ... ação coercitiva tendente a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados”. Percebe-se que a vedação normativa se direciona à imposição de tratamentos cujo objetivo é a (re)orientação sexual, sem ato de vontade ou consentimento do paciente.
Como apresentamos em nosso Requerimento de 31 de março de 2015 ao CFP, reconhecemos que a Resolução N.º 01/99 não havia sido clara em relação à atuação dos psicólogos, quando interpelados por questões ligadas à sexualidade, o que provocou questionamentos e, sobretudo, dúvidas, no âmbito dos profissionais e da sociedade civil. A decisão judicial, assim – acertadamente, do nosso ponto de vista –, interpreta a Resolução de modo correto, na medida que não consente com a limitação da liberdade profissional que o psicólogo tem de aprofundar seu conhecimento científico para o atendimento de pessoas que voluntariamente o procurem, inclusive, habilitando-o para, tecnicamente, atuar nos casos de reorientação sexual.
Se assim não for, a norma editada pelo CFP incorrerá em violação ao art. 5º, incisos IX e XIII da CF/88, que garantem a liberdade no exercício de atividade científica e o livre exercício da atividade profissional, atendidas as qualificações exigidas por lei. Estar-se-á ferindo, ainda, o princípio I do Código de Ética Profissional do Psicólogo, o qual elenca a liberdade, a dignidade, a igualdade e a integridade do ser humano como fundamentos do trabalho do psicólogo.
Outrossim, violar-se-ia a liberdade de consciência – art. 5º, VI e autonomia da vontade do próprio indivíduo, que é livre para buscar orientação psicológica não somente para questões sexuais, como para todos os conflitos e necessidades que lhes são pertinentes.
Com efeito, o indivíduo tem o direito constitucional de escolher o sentido para o qual direcionará seu comportamento sexual. Em concreto, se um indivíduo – homossexual ou heterossexual – expressa o desejo de mudar ou reorientar seu comportamento sexual, e procura um atendimento psicológico para auxiliar nesse processo, não se pode obrigar que este seja, obrigatoriamente, no sentido da manutenção de sua atual condição ou identidade, biológica ou não.
Do mesmo modo, impedir que o profissional de psicologia proceda a pesquisas e estudos científicos, e mesmo ao efetivo exercício da orientação sexual para pacientes que, voluntariamente, procurem orientação, significa ferir a dignidade da pessoa humana daqueles que optam pela aceitação de sua identidade biológica, visto que lhes cerceia uma possibilidade de saírem da situação que os aflige. Novamente, a liberdade de aceitar a identidade biológica é tão legítima quanto a reversão dela.
Nessa linha, cremos que a decisão em comento é legítima, eis que emanada do Poder Judiciário, pautada no devido processo legal e fundamentada solidamente em normas do nosso ordenamento jurídico, demandando, portanto, o dever de cumprimento pelo seu destinatário como medida de respeito à concretização dos direitos constitucionais (e infraconstitucionais) expressos no decisum, e preservação da dignidade da justiça, elementos que marcam o Estado Democrático de Direito.
Aliás, a sociedade em sua totalidade deve estar comprometida com a execução das decisões judiciais, refletindo o respeito ao Poder Judiciário e contribuindo à efetiva prestação jurisdicional.
Repise-se que a decisão judicial, objeto desta Nota, foi proferida em sede de cognição sumária, não exaurindo, completamente, a jurisdição singular. Não obstante, tal fato não ilide, nem abranda a sua força judicante, impondo-se a observância de seus termos pelo destinatário e por todos aqueles a quem compete o seu implemento.
Vale ressaltar que a decisão em destaque não altera o núcleo das previsões e motivações da Resolução 01/99 do CFP, como querem, alguns, fazer crer. Em suma: se mantém a previsão de que a homossexualidade não constitui doença ou patologia, assim como a previsão de que não serão adotadas ações coercitivas tendentes a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados, e, a proibição de os psicólogos colaborarem com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades, medidas que nos parecem adotadas acertadamente pelo CFP.
Finalmente, expressamos nossa preocupação e repúdio pelo fato de que os principais veículos de comunicação do Brasil distorceram ou, no mínimo, omitiram-se sobre o conteúdo técnico da decisão judicial, utilizando manchetes com expressões como “cura gay”, que não refletem a realidade do decisum e que não contribuem, em absolutamente nada, para o aprofundamento e análises que tema merece.
Nestes termos, a Associação Nacional dos Juristas Evangélicos – ANAJURE, RESOLVE alinhar-se com a decisão liminar prolatada pelo Juízo da 14ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, por ser juridicamente sólida, defendendo-a nos termos outrora explicados.
Brasília, 20 de setembro de 2017
Dr. Uziel Santana
Presidente do Conselho Diretivo Nacional da ANAJURE
Dr. Augusto Ventura
Diretor Jurídico da ANAJURE
________________________________
[1] ANAJURE se reúne com Presidente Conselho Federal de Psicologia e traça metas de atuação conjunta. https://www.anajure.org.br/anajure-se-reune-com-presidente-conselho-federal-de-psicologia-e-traca-metas-de-atuacao-conjunta/
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