Opinião
- 24 de fevereiro de 2006
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Identidade e diferença - o indígena e o cristianismo*
In memoriam: ao saudoso Idjarruri Karajá, um dos iniciadores do CONPLEI
Isaac Costa de Souza
Introdução
As pessoas que são contra a evangelização dos povos indígenas dizem que o evangelho destrói as culturas tradicionais dos mesmos. De acordo com essas pessoas, o indígena que se converte a Jesus Cristo perde a cultura milenar que herdou. Nesse sentido, ele deixa de ser indígena, uma vez que perde a sua cultura tradicional.
Será que isso é verdade? Será que esses acusadores têm razão? Será que o indígena deixa de ser indígena só porque se converteu? O presente trabalho tem como objetivo principal responder esses tipos de pergunta.
Em nossa resposta, vamos usar os conceitos de “identidade” e “diferença”. Vamos ver o que identifica o indígena e o que identifica o cristão.
A fim de permitir fluência na leitura, as referências bíblicas serão registradas em notas de rodapé.
1. Início de tudo - a semelhança acima da diversidade
Aparentemente, no início dos tempos havia mais unidade do que diversidade nos costumes e culturas humanas, por causa do pequeno número de pessoas que habitava o mundo. Primeiro havia Adão; depois Adão e Eva; depois eles e seus filhos e assim por diante[1]. Portanto, havia mais uniformidade do que diferença na cultura compartilhada por Adão e sua família. Com o crescimento, aumentaram também as diferenças culturais. E na Torre de Babel, aumentaram as diferenças linguísticas[2].
2. A criação e o começo das culturas humanas
A cultura humana, enquanto maneira de viver, pode ser observada desde o princípio da criação.
O homem foi criado com o objetivo de lavrar a terra[3]. Para isso, ele precisava de instrumentos de trabalho, que ele mesmo fez. Assim, o trabalho em si não foi resultado de castigo. Os espinhos e outras pragas, resultados da maldição,[4] é que criaram dificuldades para a realização do trabalho que já existia como parte da cultura humana[5].
Há na Bíblia uma ordem para Adão se alimentar tanto do gênero vegetal (legumes e frutas) como do gênero animal[6]. Para se alimentar do gênero animal ele precisava ter animal de criação e também caçar. Portanto, ele foi criador e caçador, além de lavrador.
Outras manifestações culturais ligadas ao trabalho, que podem ser vistas no começo do mundo, envolveram os filhos de Caim. Por exemplo, a criação de gado foi feita por Jabal, a atividade musical foi feita por Jubal e o trabalho em metal foi feito por Tubalcaim[7].
Pessoas que vieram depois também desenvolveram aspectos culturais específicos, através de seus trabalhos: Noé lavrou a terra, Abraão teve ovelhas e vacas e Ismael foi flecheiro no deserto[8]. Tudo isso é cultura, é maneira de viver.
3. Outros Aspectos Culturais na Bíblia
A questão de cultura na Bíblia não está ligada apenas ao trabalho. A Bíblia mostra um servo de Abraão colocando a mão debaixo da coxa deste para fazer um juramento[9]. Para confirmar um acordo, um homem descalçava seu sapato e dava esse sapato ao seu companheiro[10]. Existia entre os israelitas o “levirato”, que é um sistema de matrimônio onde um homem se casava com a viúva de seu irmão[11]. Isso também ocorre em algumas culturas indígenas. Ainda sobre matrimônio, entre os parentes de Abraão uma irmã mais nova só podia casar depois que a irmã mais velha também casasse[12].
A barba tinha um valor positivo para os israelitas. Há uma passagem na Bíblia em que Hanum, rei de Moabe, raspa a barba e corta a roupa dos mensageiros que Davi tinha enviado, para poder humilhá-los. Os mensageiros ficaram em Jericó esperando as barbas crescerem para então retornar com dignidade a Jerusalém[13]. Tudo isso é cultura, é maneira de viver.
* Apresentado no Conselho Nacional de Pastores e Líderes Evangélicos Indígenas (CONPLEI). Dourados, 2 de setembro de 2004.
Notas
1 A história de Adão, Eva e seus filhos encontra-se nos primeiros capítulos do livro de Gênesis, na Bíblia.
2 A história sobre a diferença entre as línguas está também no livro de Gênesis, capítulo 11.
3 Gênesis 2.15.
4 Gênesis 2.17-18.
5 Gênesis 3.19.
6 Gênesis 1.29-30.
7 Gênesis 4.20-22.
8 Gênesis 9.20; 12.16; 21.20.
9 Gênesis 24.2b, 9.
10 Rute 4.7.
11 Gênesis 38.8.
12 Gênesis 29.26.
13 1 Crônicas 19.4-5.
Isaac Costa de Souza
Introdução
As pessoas que são contra a evangelização dos povos indígenas dizem que o evangelho destrói as culturas tradicionais dos mesmos. De acordo com essas pessoas, o indígena que se converte a Jesus Cristo perde a cultura milenar que herdou. Nesse sentido, ele deixa de ser indígena, uma vez que perde a sua cultura tradicional.
Será que isso é verdade? Será que esses acusadores têm razão? Será que o indígena deixa de ser indígena só porque se converteu? O presente trabalho tem como objetivo principal responder esses tipos de pergunta.
Em nossa resposta, vamos usar os conceitos de “identidade” e “diferença”. Vamos ver o que identifica o indígena e o que identifica o cristão.
A fim de permitir fluência na leitura, as referências bíblicas serão registradas em notas de rodapé.
1. Início de tudo - a semelhança acima da diversidade
Aparentemente, no início dos tempos havia mais unidade do que diversidade nos costumes e culturas humanas, por causa do pequeno número de pessoas que habitava o mundo. Primeiro havia Adão; depois Adão e Eva; depois eles e seus filhos e assim por diante[1]. Portanto, havia mais uniformidade do que diferença na cultura compartilhada por Adão e sua família. Com o crescimento, aumentaram também as diferenças culturais. E na Torre de Babel, aumentaram as diferenças linguísticas[2].
2. A criação e o começo das culturas humanas
A cultura humana, enquanto maneira de viver, pode ser observada desde o princípio da criação.
O homem foi criado com o objetivo de lavrar a terra[3]. Para isso, ele precisava de instrumentos de trabalho, que ele mesmo fez. Assim, o trabalho em si não foi resultado de castigo. Os espinhos e outras pragas, resultados da maldição,[4] é que criaram dificuldades para a realização do trabalho que já existia como parte da cultura humana[5].
Há na Bíblia uma ordem para Adão se alimentar tanto do gênero vegetal (legumes e frutas) como do gênero animal[6]. Para se alimentar do gênero animal ele precisava ter animal de criação e também caçar. Portanto, ele foi criador e caçador, além de lavrador.
Outras manifestações culturais ligadas ao trabalho, que podem ser vistas no começo do mundo, envolveram os filhos de Caim. Por exemplo, a criação de gado foi feita por Jabal, a atividade musical foi feita por Jubal e o trabalho em metal foi feito por Tubalcaim[7].
Pessoas que vieram depois também desenvolveram aspectos culturais específicos, através de seus trabalhos: Noé lavrou a terra, Abraão teve ovelhas e vacas e Ismael foi flecheiro no deserto[8]. Tudo isso é cultura, é maneira de viver.
3. Outros Aspectos Culturais na Bíblia
A questão de cultura na Bíblia não está ligada apenas ao trabalho. A Bíblia mostra um servo de Abraão colocando a mão debaixo da coxa deste para fazer um juramento[9]. Para confirmar um acordo, um homem descalçava seu sapato e dava esse sapato ao seu companheiro[10]. Existia entre os israelitas o “levirato”, que é um sistema de matrimônio onde um homem se casava com a viúva de seu irmão[11]. Isso também ocorre em algumas culturas indígenas. Ainda sobre matrimônio, entre os parentes de Abraão uma irmã mais nova só podia casar depois que a irmã mais velha também casasse[12].
A barba tinha um valor positivo para os israelitas. Há uma passagem na Bíblia em que Hanum, rei de Moabe, raspa a barba e corta a roupa dos mensageiros que Davi tinha enviado, para poder humilhá-los. Os mensageiros ficaram em Jericó esperando as barbas crescerem para então retornar com dignidade a Jerusalém[13]. Tudo isso é cultura, é maneira de viver.
* Apresentado no Conselho Nacional de Pastores e Líderes Evangélicos Indígenas (CONPLEI). Dourados, 2 de setembro de 2004.
Notas
1 A história de Adão, Eva e seus filhos encontra-se nos primeiros capítulos do livro de Gênesis, na Bíblia.
2 A história sobre a diferença entre as línguas está também no livro de Gênesis, capítulo 11.
3 Gênesis 2.15.
4 Gênesis 2.17-18.
5 Gênesis 3.19.
6 Gênesis 1.29-30.
7 Gênesis 4.20-22.
8 Gênesis 9.20; 12.16; 21.20.
9 Gênesis 24.2b, 9.
10 Rute 4.7.
11 Gênesis 38.8.
12 Gênesis 29.26.
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