Opinião
- 12 de agosto de 2015
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Gran Torino
Gran Torino, de 2008, é produção do grande, inigualável e incomparável Clint Eastwood. Quero crer que - se não todos - a maioria dos/as leitores/as deste texto concordará com a sequência de elogios que o inicia. Afinal, Clint Eastwood “não é fraco”, como se diz.
Desde um começo que poderia passar por despretensioso nos “western spaghetti” de Sergio Leone nos anos de 1960, à famosa trilogia do misterioso Homem sem Nome, com sua trilha sonora que se tornou um clássico, passando pelo estereótipo do policial durão Harry Callaghan na série dos filmes de Dirty Harry, e tantos outros, como o do valentão descerebrado e seu simpático e irreverente “pet”, o orangotango Clyde em Doido para Brigar... Louco para Amar, e tantos outros, que fizeram de Eastwood uma lenda do cinema, como ator e como diretor. Pois quando Eastwood resolveu migrar para a direção, seu sucesso só aumentou: ganhou a cobiçada estatueta do Oscar nas categorias mais importantes: melhor filme e melhor diretor com Os Imperdoáveis, em 1995. Dez anos depois ele repetiu a dose com Menina de Ouro. O filme ainda ganhou o prêmio de “melhor atriz” (Hillary Swank). Pouquíssimos diretores conseguiram este feito. Mesmo os filmes que Eastwood dirigiu, mas que não ganharam Oscar, são de inegável qualidade, como As pontes de Madison, Invictus, Cartas de Iwo Jima e A conquista da honra (estes dois últimos constituem-se muito provavelmente em caso único na história do cinema: Eastwood deve ter sido o único diretor da história que produziu dois filmes sobre o mesmo evento, no caso, a Batalha de Iwo Jima, na Segunda Guerra Mundial, um, na perspectiva dos norte-americanos, e outro, na perspectiva dos japoneses).
Mas nossa atenção se volta agora para Gran Torino que, como todos os filmes dirigidos por Eastwood, produz profunda reflexão sobre a vida, seu sentido, suas contradições, complexidades e consequentes desafios. Em Gran Torino, Clint Eastwood dá vida a Walt Kowalski, um veterano da Guerra da Coreia. Kowalski é amargo, ressentido, irascível, carrancudo e algumas vezes rosna como um cachorro. Walt Kowalski talvez seja um Harry Callagham – ou o estranho sem nome – envelhecido. A tranquilidade de Kowalski é perturbada pela chegada de imigrantes do Laos, a quem ele despreza e detesta. Para piorar ainda mais a situação, um dia Kowalski pega no flagrante Thao, um adolescente laociano tímido, que é obrigado por uma gangue de desordeiros do seu país a roubar o Gran Torino que dá nome ao filme. Desnecessário dizer que o carro é o grande “xodó” do abespinhado Kowalski. Mas eis que surpreendentemente aí tem início uma inusitada amizade, que tinha tudo para não acontecer, entre Kowalski, Thao e sua (de Thao) irmã Sue. Kowalski, um tanto contra sua vontade, ajuda seus vizinhos que são vítimas de “bullying” da gangue de desordeiros laocianos. Até que...
Até que a situação se complica cada vez mais. Kowalski não acredita que a polícia possa fazer alguma coisa. Ele afugenta os desordeiros na base da violência. Mas a situação não para por aí. Pelo contrário, vai ficando cada vez mais tensa. Até que...
Até que em uma virada surpreendente, absolutamente inesperada, Kowalski resolve de vez o problema, garantindo de uma vez por todas que os delinquentes desocupados valentões do Laos não perturbem mais seus amigos Thao e Sue e a família deles.
Eastwood é simplesmente brilhante na virada que dá à trama, fazendo-a tomar um rumo contrário ao que todos que conhecem seus filmes esperariam. Curioso que em “Os Imperdoáveis”, um “western”, o gênero que o consagrou e o lançou ao estrelato, ele vai quase que o filme todo na contramão da narrativa tradicional dos filmes deste tipo, ao mostrar como que matar não é glamoroso nem heroico. Em outras palavras: já em “Os Imperdoáveis” Eastwood começa a dar sinais de uma quebra com modelo do herói que lança mão da violência para resolver seus problemas. Todavia, o final do filme resgata o clichê tradicional do atirador implacável e certeiro, quando William Munny (personagem de Eastwood) vinga seu amigo Ned, vivido por Morgan Freeman (que voltaria a fazer dupla com Eastwood em “Menina de Ouro”, e a quem dirigiria no excelente “Invictus”). Mas em Gran Torino a ruptura com o clichê do homem violento e durão que não leva desaforo para casa é definitiva. Neste sentido, Gran Torino é uma história de redenção, uma ilustração poderosamente eloquente de um dos ditos mais difíceis de Jesus: “Ninguém tem maior amor do que este, de dar alguém a sua vida pelos seus amigos” (Jo 15.13).
Gran Torino é um filme que segue atualíssimo. Em um mundo no qual a convivência com o “outro”, o diferente, é cada vez mais difícil, em que o medo e o preconceito em relação ao que pensa diferente, ao que é de outro grupo, outra tradição religiosa, outra etnia, outra classe social, fazem com que atos estúpidos sejam cometidos, o drama Gran Torino é um soco na boca do estômago dos que pensam que a violência é solução para os problemas, e que é possível a convivência entre os diferentes. Não apenas possível, mas necessária.
Imagem: Divulgação
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A Mensagem do Sermão do Monte (John Stott)
Desde um começo que poderia passar por despretensioso nos “western spaghetti” de Sergio Leone nos anos de 1960, à famosa trilogia do misterioso Homem sem Nome, com sua trilha sonora que se tornou um clássico, passando pelo estereótipo do policial durão Harry Callaghan na série dos filmes de Dirty Harry, e tantos outros, como o do valentão descerebrado e seu simpático e irreverente “pet”, o orangotango Clyde em Doido para Brigar... Louco para Amar, e tantos outros, que fizeram de Eastwood uma lenda do cinema, como ator e como diretor. Pois quando Eastwood resolveu migrar para a direção, seu sucesso só aumentou: ganhou a cobiçada estatueta do Oscar nas categorias mais importantes: melhor filme e melhor diretor com Os Imperdoáveis, em 1995. Dez anos depois ele repetiu a dose com Menina de Ouro. O filme ainda ganhou o prêmio de “melhor atriz” (Hillary Swank). Pouquíssimos diretores conseguiram este feito. Mesmo os filmes que Eastwood dirigiu, mas que não ganharam Oscar, são de inegável qualidade, como As pontes de Madison, Invictus, Cartas de Iwo Jima e A conquista da honra (estes dois últimos constituem-se muito provavelmente em caso único na história do cinema: Eastwood deve ter sido o único diretor da história que produziu dois filmes sobre o mesmo evento, no caso, a Batalha de Iwo Jima, na Segunda Guerra Mundial, um, na perspectiva dos norte-americanos, e outro, na perspectiva dos japoneses).
Mas nossa atenção se volta agora para Gran Torino que, como todos os filmes dirigidos por Eastwood, produz profunda reflexão sobre a vida, seu sentido, suas contradições, complexidades e consequentes desafios. Em Gran Torino, Clint Eastwood dá vida a Walt Kowalski, um veterano da Guerra da Coreia. Kowalski é amargo, ressentido, irascível, carrancudo e algumas vezes rosna como um cachorro. Walt Kowalski talvez seja um Harry Callagham – ou o estranho sem nome – envelhecido. A tranquilidade de Kowalski é perturbada pela chegada de imigrantes do Laos, a quem ele despreza e detesta. Para piorar ainda mais a situação, um dia Kowalski pega no flagrante Thao, um adolescente laociano tímido, que é obrigado por uma gangue de desordeiros do seu país a roubar o Gran Torino que dá nome ao filme. Desnecessário dizer que o carro é o grande “xodó” do abespinhado Kowalski. Mas eis que surpreendentemente aí tem início uma inusitada amizade, que tinha tudo para não acontecer, entre Kowalski, Thao e sua (de Thao) irmã Sue. Kowalski, um tanto contra sua vontade, ajuda seus vizinhos que são vítimas de “bullying” da gangue de desordeiros laocianos. Até que...
Até que a situação se complica cada vez mais. Kowalski não acredita que a polícia possa fazer alguma coisa. Ele afugenta os desordeiros na base da violência. Mas a situação não para por aí. Pelo contrário, vai ficando cada vez mais tensa. Até que...
Até que em uma virada surpreendente, absolutamente inesperada, Kowalski resolve de vez o problema, garantindo de uma vez por todas que os delinquentes desocupados valentões do Laos não perturbem mais seus amigos Thao e Sue e a família deles.
Eastwood é simplesmente brilhante na virada que dá à trama, fazendo-a tomar um rumo contrário ao que todos que conhecem seus filmes esperariam. Curioso que em “Os Imperdoáveis”, um “western”, o gênero que o consagrou e o lançou ao estrelato, ele vai quase que o filme todo na contramão da narrativa tradicional dos filmes deste tipo, ao mostrar como que matar não é glamoroso nem heroico. Em outras palavras: já em “Os Imperdoáveis” Eastwood começa a dar sinais de uma quebra com modelo do herói que lança mão da violência para resolver seus problemas. Todavia, o final do filme resgata o clichê tradicional do atirador implacável e certeiro, quando William Munny (personagem de Eastwood) vinga seu amigo Ned, vivido por Morgan Freeman (que voltaria a fazer dupla com Eastwood em “Menina de Ouro”, e a quem dirigiria no excelente “Invictus”). Mas em Gran Torino a ruptura com o clichê do homem violento e durão que não leva desaforo para casa é definitiva. Neste sentido, Gran Torino é uma história de redenção, uma ilustração poderosamente eloquente de um dos ditos mais difíceis de Jesus: “Ninguém tem maior amor do que este, de dar alguém a sua vida pelos seus amigos” (Jo 15.13).
Gran Torino é um filme que segue atualíssimo. Em um mundo no qual a convivência com o “outro”, o diferente, é cada vez mais difícil, em que o medo e o preconceito em relação ao que pensa diferente, ao que é de outro grupo, outra tradição religiosa, outra etnia, outra classe social, fazem com que atos estúpidos sejam cometidos, o drama Gran Torino é um soco na boca do estômago dos que pensam que a violência é solução para os problemas, e que é possível a convivência entre os diferentes. Não apenas possível, mas necessária.
Imagem: Divulgação
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A Mensagem do Sermão do Monte (John Stott)
É professor do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da PUC Minas, onde coordena o GPRA – Grupo de Pesquisa Religião e Arte.
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