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Opinião

Evangélicos honestos e evangélicos corrompidos, qual a diferença?

Derval Dasilio

Os evangélicos precisam encontrar quem lhes compre o voto, o corpo, a sensibilidade, o tempo, a criatividade e a energia vital? Como resgatá-los de ideologias constituintes do vilipêndio da pessoa e do corpo, já discriminadas pela cor da pele, pelo tipo de cabelo, pela opção sexual, pelo peso e altura, se aí estão igualados na exposição da mídia como objeto de consumo do poder político? Sem falar do abuso do culto neoevangélico à corrupção (como no mito da Hidra de Lerna, monstro que habitava uma caverna e infestava o pântano por inteiro; serpente imortal, com nove cabeças indestrutíveis, hálito fétido capaz de destruir a vida ao redor).

Evangélicos oram após receberem propina. Parte da informação sobre o vídeo em que aliados do governador do Distrito Federal, alvos da Operação Caixa de Pandora, são denunciados publicamente. Cena repetida na mídia: "evangélicos agradecendo a prosperidade vinda da corrupção". O tema do povo infiel dá o tom para a pré-comemoração do Natal profano. Os textos bíblicos para o Advento, ao contrário, são quase apocalípticos: pregam a conversão, “metanoia”, fazem exigências éticas, criticam o culto e práticas religiosas sem justiça ao povo.

Isso pouco interessa aos neoevangélicos, mais uma vez apontados na corrupção política. O testemunho bíblico, pregação cortante contra a corrupção como aço temperado, é impressionante. Pessoas se comovem e se aproximam para perguntar: “Que devemos fazer?” (Lc 3.7-18). Prova da perplexidade: pessoas perceberam que o batismo cristão tem exigências quanto ao comportamento testemunhal. A resposta indica: “Convertam-se!”. No meio da sociedade brasileira somos iguais? Evangélicos honestos e corrompidos? O tripé que caracteriza a vida moderna -- dinheiro, poder e individualismo -- é a consagração da desigualdade até mesmo no nosso meio. Confundidos com a corrupção, quem diria hoje: “Evangélicos, reserva moral da nação”?

Jamais na história do mundo o culto à individualidade foi tão acentuado. Temos aqui um tempero forte para a religião da prosperidade. Característica principal da (anti)teologia neoevangélica. "Lamento que a religião esteja tão banalizada ao ponto de as pessoas não a verem como serviço a Deus e ao próximo, mas como servir-se da fé e do próximo; isso é uma inversão total de valores bíblicos", disse uma autoridade católica.

A perplexidade está na defesa dessa "religião", e que o povo evangélico se sinta justificado, confundindo ainda mais o que é verdadeiramente prosperidade como retribuição de Deus à fidelidade, fé, confiança (“emunah”), porque não há paz sem justiça em toda a Bíblia. Como admitir que Deus possa ser homenageado pela corrupção, chantageado ou transformado num caixa eletrônico, porque é fiel ao crente corrupto?

Recuperar a concepção da alma evangélica como totalidade viva (“nephesh”, no hebraico bíblico: corpo e alma, vida ética, pessoal e socialmente) torna-se uma tarefa prioritária de reconstrução do conceito para o cristão bíblico (“Eis que faço novas todas as coisas...”, Ap 21.5b). A integridade evangélica sofre violências incríveis, como a ganância pelo poder. Fome, sede, nudez, doença, prisão referem-se a este corpo ameaçado pelo mundo contemporâneo. Sistemas econômicos mortíferos tornam-nos mercadorias vivas (como lagostas no tanque de vidro de restaurante japonês).

Necessitamos da salvação de nós mesmos, inimigos que somos do projeto de Deus, enquanto apoiadores da religião da prosperidade. As multidões, cuja infidelidade é proverbial nas Escrituras, prostituem-se facilmente, por isso não escapam da exortação: “Raça de víboras, façam coisas que mostrem que vocês se arrependeram”. As alegações sobre o pertencimento a um povo eleito, álibi para desafiar as necessidades colocadas pelos profetas, são respondidas com veemência: “Eu afirmo que até dessas pedras Deus pode fazer descendentes de Abraão!”. O Novo Testamento explicita a alegria da justiça e da salvação que chegam. Sendo insensíveis, podemos ser substituídos até por pedras ou elementos naturais (“Digo-vos que, se estes se calarem, as pedras clamarão”).


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É pastor emérito da Igreja Presbiteriana Unida do Brasil e autor de livros como “Pedagogia da Ganância" (2013) e "O Dragão que Habita em Nós” (2010).
  • Textos publicados: 94 [ver]

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