Opinião
- 31 de maio de 2023
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Ética ambiental: pensando como uma montanha
É nossa responsabilidade desenvolver uma ética ambiental que considere o impacto de nossas ações não apenas em relação a nós mesmos e ao presente, mas vislumbrando o futuro que deixaremos para as próximas gerações
Por Tiago Pereira
Um dos textos mais marcantes da história dos movimentos ambientais foi escrito por Aldo Leopold em 1949. No ensaio, que recebeu o sugestivo título “Pensando como uma montanha”, Leopold narra um episódio em que ele, ainda jovem, acompanha uma caça aos lobos nas montanhas de sua região no Arizona. Numa época em que o objetivo era dizimar os carnívoros predadores para proteção de suas frágeis presas, Leopold ficou impressionado ao assistir a morte lenta de uma loba que havia sido alvejada, e escreveu em seu famoso relato: “Nós alcançamos a velha loba a tempo de ver aquele fogo verde ardente morrendo em seus olhos. Ali eu percebi, e sei desde então, que havia algo novo para mim naqueles olhos – algo conhecido apenas por ela e pela montanha… depois de ver o fogo verde morrer, senti que nem o lobo nem a montanha concordavam com essa visão”. Perceber que a possível perda de uma única espécie poderia desequilibrar todo o ecossistema local representou o início de uma mudança radical na mente de Aldo Leopold, que viria a se tornar um dos nomes mais importantes da conservação da natureza e da ética ambiental do século 20.
Um dos textos mais marcantes da história dos movimentos ambientais foi escrito por Aldo Leopold em 1949. No ensaio, que recebeu o sugestivo título “Pensando como uma montanha”, Leopold narra um episódio em que ele, ainda jovem, acompanha uma caça aos lobos nas montanhas de sua região no Arizona. Numa época em que o objetivo era dizimar os carnívoros predadores para proteção de suas frágeis presas, Leopold ficou impressionado ao assistir a morte lenta de uma loba que havia sido alvejada, e escreveu em seu famoso relato: “Nós alcançamos a velha loba a tempo de ver aquele fogo verde ardente morrendo em seus olhos. Ali eu percebi, e sei desde então, que havia algo novo para mim naqueles olhos – algo conhecido apenas por ela e pela montanha… depois de ver o fogo verde morrer, senti que nem o lobo nem a montanha concordavam com essa visão”. Perceber que a possível perda de uma única espécie poderia desequilibrar todo o ecossistema local representou o início de uma mudança radical na mente de Aldo Leopold, que viria a se tornar um dos nomes mais importantes da conservação da natureza e da ética ambiental do século 20.
A experiência transformadora de Leopold o levou a refletir sobre a interdependência entre as formas de vida e a integridade dos ecossistemas, e a partir de seu texto, a expressão “pensar como uma montanha” se tornou emblemática para se referir a uma perspectiva sistêmica da relação dos homens com a natureza. Para Leopold, se todas as partes estão interligadas, nossas ações terão consequências profundas e duradouras. Dessa forma, é nossa responsabilidade desenvolver uma ética ambiental que considere o impacto de nossas ações não apenas em relação a nós mesmos, mas pensando na saúde de todo o planeta, e não apenas no presente, mas vislumbrando o futuro que deixaremos para as próximas gerações.
Mesmo não sendo um cristão, Aldo Leopold tem muito a nos ensinar com sua visão sobre a beleza e a complexidade da natureza e sobre a conexão do homem com o mundo. E se pararmos para pensar em sua proposta, como um cristão poderia “pensar como uma montanha”? O que as Escrituras têm a nos ensinar sobre uma ética ambiental? Minha sugestão é que sejamos inspirados por outra montanha, onde um dos discursos mais importantes da história foi proferido há dois milênios.
O Sermão da Montanha, conforme os relatos oferecidos nos evangelhos de Mateus e Lucas, nos oferece uma série de ensinamentos de Jesus sobre a realidade do Reino de Deus e nos apresenta virtudes e atitudes essenciais para uma vida cristã plena. O leitor atento perceberá que essas virtudes devem ser aplicadas não apenas ao relacionamento do homem com Deus e com seu próximo, mas com tudo ao seu redor. O caráter cristão, afinal, deve ser desenvolvido tendo em vista toda a criação. Essa visão fica bem clara ao perceber como Jesus demonstra uma profunda conexão com a natureza. Não surpreende que seu sermão mais famoso tenha sido realizado ao ar livre, e não em um templo. Os ensinamentos de Jesus estavam profundamente enraizados numa cultura ligada à terra e ao mar, e suas parábolas estão repletas de imagens do campo, da pesca, de animais e vegetais comuns à sua experiência cotidiana.
Jesus usa aquele momento para convidar seus ouvintes a, como ele, olhar para a natureza, apreciar sua beleza e tirar conclusões a partir dela. Duas passagens representam muito bem como ele mesmo prestava atenção ao mundo natural, enxergando a beleza da criação e extraindo dela profundos ensinamentos teológicos. Observando os pardais (Mateus 10:29,31; Lucas 12:24), Jesus ensina que a vida humana, de fato, tem um valor distinto de todo o restante da criação. Ao mesmo tempo, ele reconhece que toda a criação tem valor para Deus e todas as criaturas são dignas de serem cuidadas. De igual modo, ao observar as flores do campo (Mateus 6:28; Lucas 12:27-28), ele nos ajuda a reconhecer o cuidado e a providência do Criador sobre toda a criação. Jesus nos mostra a vida como ela deveria ser e como ela será na nova criação: bela, rica e abundante. E nos desafia a abraçar nosso chamado, como filhos de Deus, de sermos generosos e amarmos a criação como Deus ama.
Se para Aldo Leopold a solução para a conservação ambiental era pensar como uma montanha, o que os evangelhos nos ensinam sobre nossa relação com a natureza é algo muito mais radical: para cuidar bem da criação, é preciso pensar como Jesus.
- Tiago Pereira é Biólogo formado pela Universidade Federal de Viçosa, mestre e doutor em Botânica também pela UFV, com pós-doutorado em Biologia Molecular e Filogeografia. Atualmente, faz parte da equipe de trabalho da Associação Brasileira de Cristãos na Ciência (ABC2) como coordenador nacional dos Grupos de Estudo. É membro da igreja presbiteriana, casado com Eliza e pai de Pedro e Maria Clara.
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