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Opinião

ELEIÇÕES

A tentação da "posição evangélica" ou "quem não pensa como eu não é de Deus"

Entre uma eleição e outra, são exatos 1.460 dias. Em janeiro de 2007, vamos recomeçar os outros 1.459 dias em que corremos menos risco de confundir política com copa do mundo —que acontece de quatro em quatro anos. Parece estranho, mas a política eleitoral nos rouba, além da racionalidade, o significado maior da política, da participação e da ação política, que ultrapassa em muito o momento do voto.

Não é possível falar em uma “posição evangélica”, mesmo com pesquisas e enquetes a rodo. A Bíblia não é o Corão, nos lembra com muita propriedade Paul Freston, em seu livro Religião e Política, Sim; Igreja e Estado, Não. E não é fácil retirar da Bíblia uma plataforma política acabada e definitiva. Assim, qualquer dogmatismo do tipo “quem não pensa como a gente não é de Deus” é errado. “Em um momento como o que vivemos hoje é muito fácil perder a esperança, cair no desânimo ou aderir ao cinismo. No entanto, as verdades bíblicas e o propósito ético dos novos céus e da nova terra, “onde habita a justiça”, nos inspiram naquilo que devemos fazer hoje. A fé cristã é, ao mesmo tempo, utópica e realista. O sonho permanece; os seus portadores é que mudam”, afirma Freston.

Embora a filosofia de Quincas Borba, de Machado de Assis: “Ao vencedor, as batatas” também seja tentadora, a pergunta que precisamos fazer é: o que é preciso mudar para que o país se pareça mais com o que Deus quer para a sociedade? Essa é uma pergunta política com motivações religiosas, que exige resposta política.

C. S. Lewis dizia que “uma sociedade cristã não existirá enquanto a maioria de nós não a desejar realmente: e nós não a desejaremos enquanto não nos tornarmos plenamente cristãos”. Leia o que Lewis diz em O mais longo caminho de volta, em Um ano com C. S. Lewis — leituras diárias de suas obras clássicas:

“Vou me arriscar a adivinhar como esse trecho do livro deve ter afetado os meus leitores em geral. Minha hipótese é de que existem pessoas de esquerda entre vocês que estão com muita raiva do fato de eu não ter ido mais além naquela direção, e pessoas da ala oposta, que ficaram com raiva por acharem que eu fui longe demais.
Isso nos faz dar de cara com o obstáculo real em todo esse esquema de projetos de sociedade cristã. A maioria de nós não estuda o assunto para descobrir realmente o que o cristianismo diz, mas, sim, com a esperança de achar no cristianismo um apoio para os seus próprios pontos de vista. Assim, o que buscamos é um aliado onde só há um Mestre ou Juiz. Eu também sou assim. Há partes neste livro que eu preferiria simplesmente deixar de lado, porque discussões como essa não levam a nada, a não ser que percorrêssemos um caminho ainda maior. Uma sociedade cristã não existirá enquanto a maioria de nós não a desejar realmente: e nós não a desejaremos enquanto não nos tornarmos plenamente cristãos. Repito até cansar: “Faça aos outros o que gostaria que fizessem com você”. Mas não tenho capacidade de suportar isso por muito tempo, até que eu ame o meu próximo como a mim mesmo. E não posso aprender a amar dessa maneira, enquanto não aprender a amar a Deus. E só posso aprender a amar a Deus, aprendendo a obedecê-lo. Como eu já o havia prevenido, acabamos conduzidos para algo muito mais interno – partindo de assuntos sociais, acabamos nos religiosos. Pois o mais longo caminho de volta é o mais curto para chegar em casa.”

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