Opinião
- 26 de agosto de 2013
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Efeitos da tecnologia. Quem os achará?
Como é sabido, o indivíduo só é o que é na relação com outras pessoas. Dessa interação nascem angústias e alegrias, multiplicam-se inseguranças e avançam fantasias, diminuem espontaneidades e míngua a sinceridade. As tentativas de sentir-se aceito, e quem sabe, até amado, mobiliza-nos.
Com os avanços tecnológicos, as interações sociais modificaram-se. Há facilidades, agilidade, resgate de relacionamentos “perdidos”, quase esquecidos. Há também aumento de comunicação. Por outro lado, em meio há tanta velocidade, a superficialidade pode alargar-se; com o fluxo enorme de informação, nos embaralhamos, não conseguimos assimilar tudo e a ansiedade cresce. Sem dúvida, atrás de identidades falsas e anonimatos, a agressividade aumenta e muita violência antes velada agora ganha novos espaços. Muitos se dizem assustados com tanta violência agora exposta, com a crueldade humana vindo à tona. E claro, isso tem sequelas em todos nós. Inibe alguns, provoca outros, estimula em parte, desanima em outra. Mas, sem dúvida, levanta-se mais defesas, novos muros sociais, barreiras que excluem com mais facilidade e descarta-se o diferente. Novas tentações para antigas repressões. Cabe, porém, lembrar de Tomás de Kempis: “As ocasiões não fazem o homem fraco, mas revelam o que ele é”.
Ao mesmo tempo se vê um apetite maior pela fama, o exibicionismo outrora disfarçado em alguns casos, em tímidos vaidosos por exemplo, hoje, escancarado por parte de alguns, que se dispõe a quase tudo para alcançar a atenção. O bom senso do que convém, para além do ser permitido, é algo escasso. O ridículo é admirado, tudo pelo entretenimento! Andrew Keen, que escreve sobre mídia, cultura e tecnologia em variados e respeitados periódicos, diz que “há uma excentricidade na grandiosa ilusão digital de hoje”, e completa, “a loucura está no enamoramento das massas por si mesmas”.
A famosa frase, que ritimicamente embala o livro de Eclesiastes: “vaidade de vaidade, tudo é vaidade”, parece que nunca foi tão pertinente. Sim, a vaidade que conta do que é vento, denuncia a inutilidade de tantas ações, do vazio existencial, da incompletude do ser humano. E assim como se vê o exercício no Eclesiastes de parar, observar e refletir sobre o que há e tudo o que se faz em seu contexto, sua própria trajetória, é importante refazermos nesta geração, incluindo, as impressões que se tem nesse começo da era digital. As implicações ainda estão sendo estudadas, as análises são provisórias, algumas ansiosas por chegarem a conclusões já no início da trama. É preciso tempo, é preciso atentar para sutilezas, é preciso pensar concentradamente.
Aí está uma dificuldade crescente em nossos dias: tempo, atenção, concentração. Há pouca reflexão e muita reação. Ou seja, às vezes somos tão rápidos para responder, empurrados pela nova dinâmica imposta pela velocidade tecnológica, que nem sempre percebemos que não entendemos do que se trata. Opiniões rasas e rasteiras, que serão esquecidas em instantes, ou mesmo, ignoradas. Há logo outra coisa que se apresenta, um novo “point” virtual, uma nova demanda que convida a opiniões ligeiras, reações imediatas (“por que não ser o primeiro?”). A voracidade em estar “antenado”, em acompanhar o assunto do momento, repercutir, ou seja, compartilhar, “curtir”, comentar, alimentada vaidades, desejo de não apenas ser excluído, “estar por fora”, mas também, ser o mais atualizado, não somente inserido no “estar por dentro”, mas dentro e no topo. E assim nos alimentamos nos vídeos mais “bombados” da semana, repassamos banalidades para variadas razões, mas repassamos. É bom se divertir e se entreter, mas já observaram o quanto nosso divertimento e entretenimento mudou com os avanços tecnológicos? Sim, há muitos efeitos em nós, mas na maior parte do tempo nem nos damos conta. Pouca conscientização e muita reprodução.
Gostei de ler um pouco da história de Nicholas Carr, em seu livro onde comenta sobre efeitos da internet em si mesmo. Ele relata alterações que ele conseguiu reconhecer após um bom tempo, nele e também conferida nos amigos - falta de concentração. Começou percebendo a dificuldade de ler um livro, concentrar-se em algo linear prolongadamente. Em suas palavras: “A mente linear, calma, focada, sem distrações, está sendo expulsa por um novo tipo de mente que quer e precisa tomar e aquinhoar informação em surtos curtos, desconexos, frequentemente superpostos - quanto mais rapidamente, melhor”, e depois, “o computador, comecei a sentir, era mais do que apenas uma ferramenta que fazia o que eu lhe dizia para fazer. Era uma máquina, que, de um jeito sutil mas incontestável, exercia uma influência sobre mim. Quanto mais eu usava, mais alterava o modo como eu trabalhava”. Claro, não significa desprezar avanços e facilidades que o computador e a internet trazem, muito menos demonizar esse instrumento que pode e tem sido tão útil, mas alertar para implicações e efeitos. As mudanças em nosso cérebro plástico estão em processo, no porvir muitas descobertas, a sociedade se transforma, as relações também, impulsos, rapidez, quantidade; tudo isso precisa ser administrado cognitiva e emocionalmente.
Há um mar revolto de informações, grandes ondas nos agitam. Em meio a isso, o que realmente vale? Quem é sábio para discernir onde investir seu tempo, e, que caminhos trilhar? Quem tem “caído” nas redes (sociais) ingenuamente? Quem é capaz de observar profundamente e perceber os efeitos em si mesmo? Quem adere a estar conectado continuamente tem colhido o quê? O que perde quem resiste? Reconhecemos perigos e tentações nesses tempos onde laços virtuais pulam em nosso colo através das múltiplas telas?
Celebro e utilizo novas tecnologias. Mas me espanto sobre o quanto ela revela a nosso respeito e como nossa distração aumenta, gerando desgastes, desconfortos, ansiedades, etc. Voltando a Tomás de Kempis, suas considerações ainda têm sua validade para nós: “Custoso é deixar nossos costumes; mais custoso, porém, contrariar a própria vontade. Mas, se não vences obstáculos pequenos e leves, como triunfarás dos maiores? Resiste no princípio à tua inclinação e rompe com o mau costume, para que te não metas pouco a pouco em maiores dificuldades”.
Bibliografia
CARR, Nicholas. A Geração Superficial, Rio de Janeiro, 2011.
KEEN, Andrew. O Culto do Amador. Rio de Janeiro, Ed. Zahar, 2009.
MARTINS, Francisco Menezes; et. all. A Genealogia do Virtual, Porto Alegre, Editora Sulina, 2008.
KEMPIS, Tomás. A Imitação de Cristo. Petrópolis/RJ, Ed. Vozes, 1993.
Leia mais
Velho debutate (especial 15 anos)
O Pentecostes nas redes sociais (Derval Dasilio)
A espiritualidade cristã e a cultura narcisista (Ricardo Barbosa)
Saúde emocional e vida cristã: curando as feridas do coração (Esly Regina Carvalho)
Com os avanços tecnológicos, as interações sociais modificaram-se. Há facilidades, agilidade, resgate de relacionamentos “perdidos”, quase esquecidos. Há também aumento de comunicação. Por outro lado, em meio há tanta velocidade, a superficialidade pode alargar-se; com o fluxo enorme de informação, nos embaralhamos, não conseguimos assimilar tudo e a ansiedade cresce. Sem dúvida, atrás de identidades falsas e anonimatos, a agressividade aumenta e muita violência antes velada agora ganha novos espaços. Muitos se dizem assustados com tanta violência agora exposta, com a crueldade humana vindo à tona. E claro, isso tem sequelas em todos nós. Inibe alguns, provoca outros, estimula em parte, desanima em outra. Mas, sem dúvida, levanta-se mais defesas, novos muros sociais, barreiras que excluem com mais facilidade e descarta-se o diferente. Novas tentações para antigas repressões. Cabe, porém, lembrar de Tomás de Kempis: “As ocasiões não fazem o homem fraco, mas revelam o que ele é”.
Ao mesmo tempo se vê um apetite maior pela fama, o exibicionismo outrora disfarçado em alguns casos, em tímidos vaidosos por exemplo, hoje, escancarado por parte de alguns, que se dispõe a quase tudo para alcançar a atenção. O bom senso do que convém, para além do ser permitido, é algo escasso. O ridículo é admirado, tudo pelo entretenimento! Andrew Keen, que escreve sobre mídia, cultura e tecnologia em variados e respeitados periódicos, diz que “há uma excentricidade na grandiosa ilusão digital de hoje”, e completa, “a loucura está no enamoramento das massas por si mesmas”.
A famosa frase, que ritimicamente embala o livro de Eclesiastes: “vaidade de vaidade, tudo é vaidade”, parece que nunca foi tão pertinente. Sim, a vaidade que conta do que é vento, denuncia a inutilidade de tantas ações, do vazio existencial, da incompletude do ser humano. E assim como se vê o exercício no Eclesiastes de parar, observar e refletir sobre o que há e tudo o que se faz em seu contexto, sua própria trajetória, é importante refazermos nesta geração, incluindo, as impressões que se tem nesse começo da era digital. As implicações ainda estão sendo estudadas, as análises são provisórias, algumas ansiosas por chegarem a conclusões já no início da trama. É preciso tempo, é preciso atentar para sutilezas, é preciso pensar concentradamente.
Aí está uma dificuldade crescente em nossos dias: tempo, atenção, concentração. Há pouca reflexão e muita reação. Ou seja, às vezes somos tão rápidos para responder, empurrados pela nova dinâmica imposta pela velocidade tecnológica, que nem sempre percebemos que não entendemos do que se trata. Opiniões rasas e rasteiras, que serão esquecidas em instantes, ou mesmo, ignoradas. Há logo outra coisa que se apresenta, um novo “point” virtual, uma nova demanda que convida a opiniões ligeiras, reações imediatas (“por que não ser o primeiro?”). A voracidade em estar “antenado”, em acompanhar o assunto do momento, repercutir, ou seja, compartilhar, “curtir”, comentar, alimentada vaidades, desejo de não apenas ser excluído, “estar por fora”, mas também, ser o mais atualizado, não somente inserido no “estar por dentro”, mas dentro e no topo. E assim nos alimentamos nos vídeos mais “bombados” da semana, repassamos banalidades para variadas razões, mas repassamos. É bom se divertir e se entreter, mas já observaram o quanto nosso divertimento e entretenimento mudou com os avanços tecnológicos? Sim, há muitos efeitos em nós, mas na maior parte do tempo nem nos damos conta. Pouca conscientização e muita reprodução.
Gostei de ler um pouco da história de Nicholas Carr, em seu livro onde comenta sobre efeitos da internet em si mesmo. Ele relata alterações que ele conseguiu reconhecer após um bom tempo, nele e também conferida nos amigos - falta de concentração. Começou percebendo a dificuldade de ler um livro, concentrar-se em algo linear prolongadamente. Em suas palavras: “A mente linear, calma, focada, sem distrações, está sendo expulsa por um novo tipo de mente que quer e precisa tomar e aquinhoar informação em surtos curtos, desconexos, frequentemente superpostos - quanto mais rapidamente, melhor”, e depois, “o computador, comecei a sentir, era mais do que apenas uma ferramenta que fazia o que eu lhe dizia para fazer. Era uma máquina, que, de um jeito sutil mas incontestável, exercia uma influência sobre mim. Quanto mais eu usava, mais alterava o modo como eu trabalhava”. Claro, não significa desprezar avanços e facilidades que o computador e a internet trazem, muito menos demonizar esse instrumento que pode e tem sido tão útil, mas alertar para implicações e efeitos. As mudanças em nosso cérebro plástico estão em processo, no porvir muitas descobertas, a sociedade se transforma, as relações também, impulsos, rapidez, quantidade; tudo isso precisa ser administrado cognitiva e emocionalmente.
Há um mar revolto de informações, grandes ondas nos agitam. Em meio a isso, o que realmente vale? Quem é sábio para discernir onde investir seu tempo, e, que caminhos trilhar? Quem tem “caído” nas redes (sociais) ingenuamente? Quem é capaz de observar profundamente e perceber os efeitos em si mesmo? Quem adere a estar conectado continuamente tem colhido o quê? O que perde quem resiste? Reconhecemos perigos e tentações nesses tempos onde laços virtuais pulam em nosso colo através das múltiplas telas?
Celebro e utilizo novas tecnologias. Mas me espanto sobre o quanto ela revela a nosso respeito e como nossa distração aumenta, gerando desgastes, desconfortos, ansiedades, etc. Voltando a Tomás de Kempis, suas considerações ainda têm sua validade para nós: “Custoso é deixar nossos costumes; mais custoso, porém, contrariar a própria vontade. Mas, se não vences obstáculos pequenos e leves, como triunfarás dos maiores? Resiste no princípio à tua inclinação e rompe com o mau costume, para que te não metas pouco a pouco em maiores dificuldades”.
Bibliografia
CARR, Nicholas. A Geração Superficial, Rio de Janeiro, 2011.
KEEN, Andrew. O Culto do Amador. Rio de Janeiro, Ed. Zahar, 2009.
MARTINS, Francisco Menezes; et. all. A Genealogia do Virtual, Porto Alegre, Editora Sulina, 2008.
KEMPIS, Tomás. A Imitação de Cristo. Petrópolis/RJ, Ed. Vozes, 1993.
- Taís Machado é psicóloga clínica, professora em seminários teológicos e blogueira do portal Ultimato. Foi por muitos anos secretária nacional de capacitação da Aliança Bíblica Universitária do Brasil (ABUB).
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Velho debutate (especial 15 anos)
O Pentecostes nas redes sociais (Derval Dasilio)
A espiritualidade cristã e a cultura narcisista (Ricardo Barbosa)
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