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- 03 de novembro de 2011
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Ecumênicos precisam falar a uma só voz na Rio+20
(ALC) Há mais de 20 anos fala-se em desenvolvimento sustentável e, apesar de todas as tentativas de avançar na proposta, a humanidade dá passos para trás, sem acordos básicos sobre clima e proteção de áreas verdes. “O que houve foi um processo de mercantilização da natureza, criando novas maneiras de manter o capital dentro da lógica ambientalista como, por exemplo, os créditos de carbono”, declarou o secretário executivo de Koinonia – Presença Ecumênica e Serviço, Rafael Soares de Oliveira.
“Não é possível continuar degradando o meio ambiente e oferecer créditos de carbono para quem mantém a floresta. Às vezes, é esta mesma floresta que está sendo degradada por um projeto de desenvolvimento, como o plantio de soja ou a construção de uma hidroelétrica”, frisou.
Koinonia – Presença Ecumênica e Serviço é uma das organizações brasileiras membro de ACT Aliança, uma rede que une mais de 100 organismos, igrejas e conselhos de igrejas envolvidos no trabalho de ajuda humanitária e projetos de desenvolvimento. A esfera de articulação nacional de ACT Aliança no Brasil é o Fórum Ecumênico ACT Brasil (FE ACT Brasil), que busca redes de articulação com a sociedade civil.
Com a proximidade da Rio +20, a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, agendada para 4 a 6 de junho de 2012, o fórum ecumênico passou a desenvolver, interna e externamente, sua estratégia de participação no evento.
Para tanto, reuniu-se em Porto Alegre, dias 21 a 23 de outubro, o Comitê Facilitador da Sociedade Civil para a Rio +20. O grupo dedica-se à preparação do encontro dos ativistas pelo futuro do Planeta e as atividades paralelas de incidência à Rio +20, a Cúpula dos Povos.
Além de organizar a Cúpula dos Povos, o grupo buscou, ainda, vislumbrar conexões das iniciativas em torno da Rio+20 com o Fórum Social Temático, que vai acontecer em Porto Alegre, em janeiro de 2012, e como este evento, que debaterá a questão da justiça ambiental, pode se desdobrar no processo da Rio+20 e ultrapassá-lo.
Uma das definições do encontro em Porto Alegre foi que, em Durban, durante a realização da próxima reunião da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP17, o comitê da sociedade civil daquele evento fará um assembleia, no último dia, para falar sobre a Rio+20, tentando levantar quais os pontos que sairão de Durban para o Rio de Janeiro.
A seguir, a entrevista concedida por Rafael Soares de Oliveira.
P: Como está organizada a articulação ecumênica em torno da Rio+20?
Rafael: A mobilização ecumênica em torno da Rio + 20 tem duas frentes. Uma é nacional e a outra é internacional. A frente local já está pré-definida e tem várias interfaces, nas quais organizações e igrejas no Brasil estão presentes no tema ambiental, dependendo do lugar onde elas estão. Na Amazônia, por exemplo, os temas fortes são os que giram em torno da Pan-Amazônia. Em outros lugares do país a ênfase é mais voltada para os enfrentamentos do desenvolvimentismo nacional.
Há, também, uma preocupação profunda com uma ética da responsabilidade com o planeta. Isso está presente e acumulado, política e teologicamente, pelo movimento ecumênico no Brasil há alguns anos – até mesmo desde a Eco ‘92.
P: O que está faltando nesta mobilização?
Rafael: Falta algo mais sólido, uma mobilização massiva e um processo mais claro. Mesmo do ponto de vista da sociedade civil, o processo ainda não é todo massivo. O que há é uma tentativa de vincular o movimento local a processos globais já existentes em torno do tema das mudanças climáticas e a COP17.
Esperamos que uma coisa tenha vínculo e continuidade com a outra, que não sejam mecanismos isolados, mas que a Rio+20 represente uma convergência dos processos de luta globais existentes que se propõem a enfrentar o modelo atual do capitalismo, com as suas vertentes de degradação da natureza e sua própria falência.
O que se está dizendo, em termos de conteúdo é: já se passaram 20 anos nas mãos de quem está no poder. As tentativas de dar algum passo em relação ao desenvolvimento sustentável, mas o planeta segue dando passos para trás. Não há acordos sobre clima, sobre proteção de áreas verdes. O que houve foi um processo de mercantilização da natureza, criando novas maneiras de manter o capital dentro da lógica ambientalista como, por exemplo, os créditos de carbono. Não é possível continuar degradando o meio ambiente e oferecer créditos de carbono para quem mantém a floresta. Às vezes, é esta mesma floresta que está sendo degradada por um projeto de desenvolvimento, como o plantio de soja ou a construção de uma hidroelétrica.
O que está acontecendo agora é que estamos discutindo como é que isso tudo vai convergir. A Rio+20 tem que ser um lugar de visibilidade e confronto do modelo atual de desenvolvimento e do modelo capitalista vigente, que inclui todas as suas facetas, como os programas de desenvolvimento que não respeitam a natureza nem a vida dos povos, mas também a faceta financeira, que tem quebrado e, consequentemente, exaurido os povos para pagar a conta, pois os Estados têm pago as contas do sistema financeiro que está quebrando. Por isso, trazer para a Rio+20 todo esse movimento de indignados, dos que ocupam Wall Street aos que protestam contra os problemas na Europa, também passou a ser uma pauta exigente agora. O tema da Rio+20 é o desenvolvimento e o meio ambiente, mas é, também, a sociedade se expressando no confronto com um sistema que está acabando com o planeta.
O que queremos para o futuro do planeta não é somente denunciar tudo isso, mas também falar de alternativas que temos construído para o futuro. Desde uma pequena experiência de economia solidária às experiências de agroecologia, passando por novas visões de mundo que convivam criticamente com a sociedade de consumo, com a idolatria do mercado em relação à liberdade dos seres humanos, para que possamos conviver, também, com expressões tradicionais, como a perspectiva do bem-viver na região dos Andes e as perspectivas das comunidades tradicionais no Brasil de outras regiões (indígenas, negras).
Essas visões oferecem um desafio de falar sobre temas mais amplos e não ficar só na pauta oficial da Rio+20, que é a economia verde e a governança global em torno da questão ambiental. Esses dois temas oficiais, ditos assim, parecem muito específicos. Mas, economia verde, na verdade, é uma proposta de olhar para o futuro a partir de uma nova economia que passa por cima desses temas centrais que apresentei acima, ou seja, o modelo econômico, a questão financeira, os mercados globais.
Nada disso, necessariamente, está em jogo. Se não nos mobilizarmos, a pauta oficial de Rio +20 vai falar apenas de como financiar novas tecnologias de convivência com o planeta, do ponto de vista da energia e do consumo. Isso é insuficiente, pois não aborda o bem comum, não inclui a tecnologia como um bem comum da humanidade, mas um processo dominado por partes cuja consequência, mais adiante, será muito parecida com o que já estamos experimentando hoje, só que com outras faces e outras cores.
Por isso, nós, da família ecumênica brasileira, vemos, de maneira ainda mais clara, o desafio de encontrar, internacionalmente, pontos de incidência ecumênica comuns já existentes. É fácil encontrar exemplos globais de envolvimento ecumênico em torno de questões ligadas às mudanças climáticas. Nossa pergunta é como essas iniciativas e movimentações globais trarão os resultados dos debates pós-COP17 para a Rio +20 ao lado de outros atores da sociedade. Estrategicamente, seria interessante ver os atores globais trabalhando junto com os setores locais já mobilizados.
Temos, hoje, que identificar claramente quais são as bandeiras ecumênicas globais, mas, também, os locais em que a família ecumênica está envolvida. Por exemplo, o tema da paz, muito corrente hoje na agenda ecumênica global, está intrinsecamente ligado ao tema do futuro do planeta. O não investimento em guerras significa economia que pode ser dirigida a fins humanitários. Temos a oportunidade, com a Rio+20, de dar visibilidade a um amplo processo de luta por justiça social e ambiental.
P: O que a articulação ecumênica nacional espera dos parceiros ecumênicos internacionais?
Rafael: Atualmente, a agenda ecumênica internacional ainda está com baixo perfil de mobilização para a Rio+20 por conta dos preparativos para a COP17. O que esperamos é que, passada a COP17, as conexões internacionais que já temos sejam intensificadas em torno do evento de 2012 no Rio de Janeiro. Nós, como FE ACT Brasil, passamos, depois deste encontro do comitê em Porto Alegre, a ter uma responsabilidade local muito grande, pois não haverá um comitê internacional de definição das participações na Rio+20. É o próprio Comitê Facilitador da Sociedade Civil, que hoje funciona, basicamente, no Brasil, que vai contar com representantes de redes internacionais e esperar que esses representantes, por sua vez, mobilizem as suas redes globais. Recai, dessa forma, sobre o nosso fórum ecumênico a responsabilidade de conseguir estabelecer bons vínculos com o Conselho Mundial de Igrejas (CMI), a Associação do Conselho Mundial de Igrejas relacionada ao Desenvolvimento de Organizações na Europa (APRODEV) e ACT Aliança, que são nossos parceiros imediatos.
Esperamos, também, que haja abertura para uma agenda comum, não a imposição de uma agenda local nem global. Estamos cientes que já há processos em curso em relação à Rio+20, mas esperamos não chegar a uma multiplicação de iniciativas, pois a Rio+20 pretende ser diferente daquilo que fazemos em Fóruns Sociais Mundiais.
Muitos parceiros internacionais estão diretamente envolvidos na agenda oficial da Rio+20, como é o caso do CMI. Precisamos estreitar nossas conexões com esses parceiros. Em segundo lugar, esperamos que esses parceiros escutem a convocação que está sendo feita, não só localmente, mas também globalmente, pela sociedade civil. Nosso chamado deve ser lançado de modo formal, divulgando carta aberta, dentro de cerca de um mês. Precisamos, em comum acordo, falar numa só voz na Rio+20. Não podemos chegar isolados.
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