Opinião
- 21 de fevereiro de 2020
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É carnaval. Tudo é permitido
Por Luiz Fernando dos Santos
“Bem-aventurados os puros de coração, pois verão a Deus” (Mt 5.8)
Estamos vivendo os dias do carnaval, a festa da carne, e não pense você que o carnaval é a suprema manifestação do secularismo, da ideia de uma autonomia plena sem a regulação moral transcendente ou divina. O carnaval é uma verdadeira manifestação religiosa, é um culto planejado e executado em honra da deusa Hedoné, a figura mitológica que patrocinava o prazer. Por isso, nesses dias do “reinado de Momo”, o hedonismo como filosofia e estilo de vida afloram por toda a parte. É a busca desenfreada e sem limites do prazer pelo prazer. E, para se ter sempre e cada vez mais prazer, vale tudo, nada é restringido ou proibido, e mesmo a nudez ou imoralidade sexual não conhecem limites. Sem falar do consumo excessivo de bebidas alcoólicas e o uso indiscriminado de drogas ilícitas.
A estreita ligação do carnaval – pelo menos no ocidente cristão – com a religião vem desde a idade média. Era um tempo, estabelecido inclusive pela Igreja católica, para que os fiéis se despedissem dos prazeres da carne em virtude da observância severa do tempo quaresmal e seus exercícios espirituais em preparação para a Páscoa. Com o tempo, essa prática foi se tornando uma festa popular e cortou a sua relação com a Igreja e o calendário litúrgico; uma outra liturgia foi colocada no lugar, a do hedonismo.
Uma pergunta que recorrentemente eu ouço de muitos crentes é quanto à possibilidade ou a conveniência de cristão ‘brincar’ o carnaval. Antes de responder a essa pergunta sempre gosto de ponderar que as pessoas que pulam as noites (e os dias de carnaval) não são pessoas más por isso e nem todas têm intenções depravadas ou mesmo têm a consciência de que podem estar pecando. E também reforço a ideia de que não somos melhores em nada daqueles que festejam estes dias de serpentina, confete e fantasia.
Posto isso, é claro que o carnaval e tudo o que o envolve, da sensualidade à imoderação dos costumes, é inapropriado aos santos. Sei muito bem que isso soa arrogante, moralista e farisaico mesmo entre os crentes, que dirá para os de fora da igreja. Mas, essa é uma realidade que não podemos tratar com negligência e leviandade. Fomos chamados com santa vocação e isso importa dizer que fomos chamados à pureza do coração, dos olhos, dos sentidos, do corpo e da totalidade da vida. Como membros do corpo de Cristo e tendo Ele como nossa cabeça, a pureza de Cristo deve ser a nossa pureza. Devemos fugir da aparência do mal, das más companhias e das más conversações.
Preste a atenção nestes textos bíblicos: “Porque Deus não nos chamou para a impureza, mas para a santidade” (1 Ts 4.7); “Entre vocês não deve haver nem sequer menção de imoralidade sexual nem de qualquer espécie de impureza nem de cobiça; pois estas coisas não são próprias para os santos. Não haja obscenidade nem conversas tolas nem gracejos imorais, que são inconvenientes, mas, ao invés disso, ação de graças. Porque vocês podem estar certos disto: nenhum imoral nem impuro nem ganancioso, que é idólatra, tem herança no Reino de Cristo e de Deus” (Ef 5.3-5); e ainda: “Não se deixem enganar: as más companhias corrompem os bons costumes" (1 Co 15.33). Do contrário, os crentes devem ocupar a sua mente, segundo as Escrituras, dessa maneira: “Finalmente, irmãos, tudo o que for verdadeiro, tudo o que for nobre, tudo o que for correto, tudo o que for puro, tudo o que for amável, tudo o que for de boa fama, se houver algo de excelente ou digno de louvor, pensem nessas coisas” (Fp 4.8). Fica evidente pelas Escrituras que os festejos do carnaval são inapropriados à nossa condição de salvos em Cristo Jesus, incompatíveis com a nossa nova natureza de filhos de Deus e completamente inadequados à nossa vocação a santidade.
O carnaval pode ser visto pelos crentes como um tempo muito oportuno para o testemunho de Cristo. Tudo começa com o nosso afastamento desses eventos e ajuntamentos. Nossa separação não pode ser julgadora e nem presunçosa, mas intencional no sentido de sinalizar que há um caminho melhor e um prazer mais sublime. Depois, é nosso dever, sem sair de nossa rotina habitual como homens e mulheres piedosos, incluir em nossas orações as pessoas que patrocinam, as que organizam e as que participam desses dias. Pedir a Deus que a sua graça comum esteja atuando para refrear o mal, o pecado e as forças infernais sempre presentes e mais atuantes nesses dias. Orar por nossas cidades para que não sejam palco de tragédias que cobrem de tristeza a todos. Se possível, onde o Senhor der a estratégia e houver o devido discernimento, promover impactos evangelísticos, deixar as portas das igrejas abertas com programações que possibilitem a proximidade, o acolhimento e o anúncio amorosos de Cristo que salva o pecador.
Então, não há nenhuma fonte de alegria, prazer ou felicidade suficiente para os crentes nos dias em que a carne está ‘no comando’. A causa de nossa alegria é a Graça. A fonte de nosso prazer é o corpo de Cristo. A nossa felicidade consiste em nossa adoção pelo Pai das misericórdias. Nesses dias, pense nas coisas do alto e que “Continue o injusto a praticar injustiça; continue o imundo na imundícia; continue o justo a praticar justiça; e continue o santo a santificar-se”.(Ap 22.11).
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Luiz Fernando dos Santos (1970-2022), foi ministro presbiteriano e era casado com Regina, pai da Talita e professor de teologia no Seminário Presbiteriano do Sul e no Seminário Teológico Servo de Cristo.
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