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- 16 de maio de 2019
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Deus no centro cirúrgico?
Vivências e aprendizados sobre espiritualidade no cotidiano de um hospital
Por Maria Luiza Rückert
Por Maria Luiza Rückert
A escritora e poetisa mineira Adélia Prado afirmou com muito acerto: “Deus não é uma ideia; ele é uma experiência”.
Hoje quero compartilhar vivências marcantes. Vivenciamos uma sucessão de acontecimentos muito marcantes em pouco tempo. Em novembro passado, Paulo estava empenhado em renovar sua carteira de habilitação. Antes de realizar o exame no Detran, ele consultou um oftalmologista, e descobriu que precisava fazer cirurgia de catarata.
Procuramos outros recursos mais próximos. Afinal moramos a 30 km do outrora renomado Instituto Hilton Rocha. Tivemos que constatar que a saúde pública se encontra numa situação caótica. Fizemos então contato com o Hospital Evangélico de Vila Velha, onde trabalhei como capelã durante duas décadas. Dirigi-me à Superintendente Sirlene Mota de Carvalho, que prontamente encaminhou o assunto para o setor de oftalmologia.
Estávamos nos sentindo amparados. Quando a cirurgia estava sendo agendada, Paulo teve uma tosse e rompeu uma hérnia inguinal. Novamente fiz contato com a Sirlene e também essa cirurgia foi encaixada. Além do atendimento médico, Sirlene também providenciou hospedagem para nós, junto à família de sua assessora Eliz Mar, que foi incansável em providenciar o que precisávamos.
Chegando em Vila Velha, pudemos contar com dois excelentes cirurgiões. O Dr. Sant Anna e sua equipe operaram a hérnia. O Dr. Rodrigo Amador fez a cirurgia de catarata. Desde a nossa chegada, Paulo ficou muito impressionado com a religiosidade dos funcionários e do corpo de enfermagem. Qualquer pequena vitória era comemorada como uma intervenção de Deus. Uma intervenção cirúrgica era vista como uma vitória sobre o caos. As forças desintegradoras, que fazem oposição à vida, precisavam ser vencidas com o auxílio divino. E Paulo constantemente me perguntava: “Esse pessoal sempre teve uma espiritualidade tão marcante?”
Essa espiritualidade está próxima da que é testemunhada no Antigo Testamento. “A submissão total à vontade divina integra a vida humana, em nível individual e social. Se a submissão não for total, então a vida humana é abalada pela força da desintegração que nela está implícita”, constata o teólogo John McKenzie, que acrescenta: “Os israelitas não viram Deus na história, mas a história em Deus. Isto perfaz uma diferença importante”.
Essas manifestações de espiritualidade, relacionando Deus com os acontecimentos, nos mostraram que o caos não precisa ser explicado. Ele deve ser combatido. E foi assim que Jesus também se relacionou com a dimensão dramática da realidade.
Marcante também foi o nosso primeiro contato com o setor de oftalmologia. Quando contornamos o hospital e vimos aquela enormidade de gente se acomodando debaixo de um toldo, Paulo exclamou: “Parece um acampamento de refugiados!”. A ilustração não se refere a uma situação precária, mas ao grande número de pessoas que necessitam de cirurgia nos olhos. Um funcionário nos informou que diariamente são realizadas 70 a 80 cirurgias de catarata. Tudo isso pelo SUS.
Cada cirurgia é uma vitória. O Dr. Rodrigo Amador repete sempre: “Papai do Céu abençoou a cirurgia”. A luta contra as forças desintegradoras é permanente. Além de ser diária, a vitória também é celebrada 70 a 80 vezes por dia.
Para nós foi muito marcante essa vivência da espiritualidade diante da superação da nossa limitação existencial. A população está envelhecendo, e aumenta a necessidade de solidariedade humana. Precisamos nos solidarizar para que a velhice tenha qualidade de vida.
Essas vivências nos fizeram entender melhor as palavras do teólogo Paul Tillich, que se refere a Deus como sendo “o poder de ser que resiste ao não-ser em todas as suas expressões”. Deus é o Ser que resiste ao não-ser e também o submete. Deus é todo-poderoso porque ele é o poder de resistir ao caos e de subjugá-lo. Mesmo que o caos se faça presente em todos os âmbitos da nossa existência, o Ser conquista e submete o não-ser. “O caos não pode impedi-lo de pronunciar a palavra que cria a luz a partir das trevas”, acrescenta Tillich. O caos não é capaz de delimitar o agir criativo de Deus, que sempre de novo se pronuncia a favor da vida. O ser humano participa do Ser e também do não-ser. É a dialética da existência. Na sua luta constante e permanente para superar o caos, o ser humano precisa se decidir pela vida. Nada detém o agir de Deus, nem mesmo o caos em sua manifestação derradeira, que é a morte, pois também esta foi vencida por intermédio de Jesus Cristo.
Nosso desejo e nossa esperança é que um dia todos os cidadãos brasileiros possam contar com pessoas como Sirlene Mota de Carvalho, Dr. Luiz Antônio Sant Anna e o Dr. Rodrigo Amador. Fica aqui expressa a nossa gratidão. Haverá de chegar o dia em que todos os brasileiros possam testemunhar esse reconhecimento.
• Maria Luiza Rückert, autora de Capelania Hospitalar e Ética do Cuidado, cursou teologia na Escola Superior de Teologia (EST), em São Leopoldo, RS, e aprofundou seus estudos em clínica pastoral no hospital da Universidade de Minnesota, EUA. Pós-graduada em ética, subjetividade e cidadania, atuou como capelã no Hospital Evangélico de Vila Velha, ES, durante vinte anos. Conheça o site da autora.
O que acontece nos corredores e nos quartos de um hospital? O que se passa com a pessoa que sofreu um acidente, uma amputação, ou enfrenta uma doença terminal? O que dizer da gestão institucional e da humanização hospitalar?
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Capelania Hospitalar e Ética do Cuidado responde a estas e outras questões, apresentando o universo das relações entre cuidadores, enfermos e familiares. Uma ferramenta valiosa para a formação de líderes, cuidadores, visitadores e profissionais da área de saúde.
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» Para que serve a capelania hospitalar?
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