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Opinião

Descanso – o tempo sagrado

Por Osmar Ludovico da Silva

Durante seis dias da semana vivemos sob a tirania do desempenho, metas, resultados. Shabat é um vislumbre da eternidade, que nos coloca em sintonia com o mistério do dia do Senhor, com a sacralidade do tempo.

Vivemos agitados, atarefados, apressados, com a agenda cheia, e sem tempo para descanso, cuidado de si e convívio com a família e os amigos.

É o tempo medido por minutos, horas, é a datação do período histórico em que vivemos, é o tempo de vida de cada um de nós, do choro do bebê recém-nascido ao último suspiro do idoso agonizante. É o tempo cronológico. E cronologia vem de Cronos: um deus da mitologia grega.

Cronos, temeroso de perder seu poder, luta e castra o seu pai, aprisiona seus irmãos e devora seus filhos logo depois de nascerem. Ele representa o tempo que falta para a morte, um tempo que passa sem que possamos controlá-lo. É um tempo que coloca um limite, que tem um fim, contrastando com a eternidade, é finito, passageiro, provisório.

Para não sentir a angústia da nossa finitude ocupamos todo o nosso tempo com muitas tarefas e compromissos. Quando temos tempo não sabemos o que fazer, nos perdemos em futilidades, confundindo descanso como “distração”, ou “diversão” daquilo que obsessivamente nos preocupa. Gera atitudes compulsivas: “Eu tenho que me divertir”, nos forçamos e assim eventos festivos que nos “despreocupam” são fabricados e superficiais. “O dia de não trabalhar não é o dia de se distrair – literalmente, ficar desatento. É um dia de atenção – de ser atencioso consigo mesmo e com a sua vida” Nilton Bonder.

Sem tempo devocional de qualidade, adoecemos espiritualmente, nos tornamos preocupados, ansiosos, irritados, impacientes e moralmente preguiçosos. Negligenciamos nossos relacionamentos que resultam em tensões e conflitos crônicos. Sem tempo para cuidar de nós, nos tonamos sedentários, hipertensos, obesos e insones. E surgem as patologias laborais como o estresse e o burnout.

O Salmo 90 sinaliza que meditar sobre nossa finitude (verso 10) não é um exercício mórbido, mas que nos ensina a alcançar um coração sábio (verso 12). Não se trata de reformular nossa agenda, mas de uma metanoia, uma transformação do coração, que nos liberte da tirania de Cronos para a sabedoria do Shabat Shalom.

Embora seja um dos mandamentos do decálogo de Moisés, nós, evangélicos, não conhecemos muito bem a dimensão espiritual do Shabat. Um dia sem trabalho, um dia abençoado e santificado, pois Deus fez os céus e a terra em seis dias e no sétimo descansou.

Na tarde do sexto dia, depois de ter criado o homem e a mulher à sua imagem e semelhança, Deus deu como concluído o seu projeto. Ele poderia continuar criando, mas ele considera que: está bem assim, não mais, chega. E vai passear com o casal no jardim. Ao cessar o trabalho, ao entardecer do sexto dia, ele passeia para desfrutar do convívio de Adão e Eva e celebrar a beleza da sua obra na natureza.

O Shabat é a libertação das preocupações, das manias, das obsessões, das ambições, que permite fazer contato com o profundo, com o íntimo de Deus, de mim mesmo, do outro, da natureza.

Ao me libertar da tirania do fazer, da tirania do ser bem-sucedido, da tirania do ter que me divertir a qualquer custo, eu posso desfrutar de um tempo reparador para o corpo, a alma e o espírito. Um dia sem compromissos e tarefas, dedicado à quietude, devoção, celebração comunitária, convívio familiar, passeios, natureza, boa música, bons livros.
“Porque assim diz o Senhor Jeová, o Santo de Israel. Em vos converterdes, e em repousardes, estaria a vossa salvação: no sossego e na confiança estaria a vossa força, mas não quisestes” (Isaias 30.15).

O Shabat Shalom é uma pausa na penosa luta que o homem trava pela existência, uma trégua de seus conflitos e desafios, uma trégua reconciliadora, pacificadora e restauradora do conflito do homem consigo mesmo, do homem com seu meio social, do homem com os próximos mais íntimos. Uma pausa restauradora para o corpo, a alma e o espírito em sintonia com o divino, o eterno e o sagrado.

Durante seis dias da semana vivemos sob a tirania do desempenho, das metas, dos resultados; Shabat é um vislumbre da eternidade, que nos coloca em sintonia com o mistério do dia do Senhor, com a sacralidade do tempo.

Não se limita ao sétimo dia, mas também em pequenas pausas ao longo do dia, intervalos de recolhimento e silêncio entre uma atividade e outra. O que faz a música é o pequeno espaço de silêncio entre as notas, sem eles o som seria de uma buzina.

Quem conhece o tempo sagrado do Shabat Shalom certamente suportará melhor estes difíceis tempos de pandemia.

Osmar Ludovico da Silva é pastor e líder de grupos de formação espiritual.

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