Opinião
- 04 de outubro de 2017
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De direita ou de esquerda, fazer parte de um grupo tem seu preço
Por Gabriele Greggersen
No contexto do caos político que vivemos nos últimos anos (ou seriam décadas, ou será que nunca saímos dele desde a colonização?), pergunto-me o que C.S. Lewis teria a dizer aos brasileiros.
É claro que logo nos vem à mente o seu clássico “Cristianismo Puro e Simples” e a sua projeção de como seria uma sociedade cristã e sua moral social, que seria socialista, com a diferença de que obviamente não seria ateia nem totalitarista e, pelo contrário, atribuiria o poder último a Deus.
Não quero aqui entrar na discussão do socialismo versus capitalismo ou da separação entre Estado e Igreja, mas gostaria de lembrar um pequeno sermão de Lewis, que foi incluído na edição de “O Peso da Glória”, da Thomas Nelson do Brasil, que foi muito bem traduzido por “Círculo íntimo” (no original “Inner Ring”). Ele fala da tendência do ser humano de querer fazer parte de grupos seletos e a partir do momento que se é excluído desses grupos, surge a mágoa e o ódio. Tudo na vida gira em torno de se estar dentro ou fora de um grupo. Isso tem implicações muito importantes para a discussão atual sobre a exclusão/inclusão, mas isso é assunto para outro artigo.
Na verdade, o conjunto desses grupos na sociedade – desde os grupinhos ou gangues na escola, até os partidos políticos, sindicatos, departamentos nas universidades e grandes corporações – formam sistemas cada vez mais impenetráveis e complexos. Entrar para um grupo tem seu preço e ele é alto. E a primeira coisa que o grupo faz com o indivíduo é mexer com seus valores. Nem todo grupo faz a pessoa se corromper, mas a muitos fazem o indivíduo relativizar o seu conceito de certo e errado.
Grupos têm a tendência de se acharem soberanos e com direito de impor suas regras aos indivíduos e demais grupos. Não importa, se ele representa o governo (incluindo ditaduras brancas ou explícitas) ou o “povo” (sindicatos, movimentos sociais), seus interesses tendem a se sobrepor aos do bem da sociedade toda e isso sempre é negativo.
Certamente Lewis, que escreveu o artigo logo depois da Segunda Guerra Mundial, estava se referindo ao fenômeno do nazismo, mas também ao comunismo, e ao advento do tecnicismo e da tecnocracia no mundo ocidental. Mas ele persiste até os dias de hoje com outras roupagens. E no Brasil, em particular, achou um solo extremamente fértil para se reproduzir.
Anos atrás li um artigo sobre o corporativismo no Brasil, escrito nos idos de 1987, que resgata o sentido original das corporações medievais de artesãos, que se organizaram no sentido de se defender contra os desmandos da coroa e discute a depravação do conceito no mundo atual e conclui, citando o exemplo contemporâneo, que parece lançar uma luz e esperança sobre o sentido das corporações:
“Há um novo tipo de corporativismo na Europa de hoje que tem um outro sentido, e que corresponde a um estágio mais avançado do sindicalismo. Nos países onde isto ocorre, o movimento sindical e associativo é tão independente, competente e organizado que pode, quando quer, paralisar a economia e impor sua vontade. O resultado, no entanto, não é o impasse, mas a corresponsabilidade, e um entendimento social que permite que soluções consensuais sejam buscadas para as questões de interesse nacional, com benefícios para todos. É difícil dizer se esta experiência, própria de países pequenos e ricos, tem alguma relevância para nós. O que ela sugere, no entanto, são duas coisas: primeiro, que as sociedades modernas necessitam de consenso e corresponsabilidade para prosperar; e, segundo, que esta corresponsabilidade requer a autonomia e o fortalecimento das entidades representativas da sociedade, e não sua dependência e acomodação à sombra dos benefícios do Estado.” (SCHWARZMAN, 1987, p. 2).
Então, o fenômeno do “Inner Ring” não é um conceito estranho a nós, e transcende as diferenças entre a direita e a esquerda, pois ocorre de ambos os lados. Que tal cristãos de esquerda e direita se unirem para combater o corporativismo selvagem e defender a organização de corporações sadias?
No contexto do caos político que vivemos nos últimos anos (ou seriam décadas, ou será que nunca saímos dele desde a colonização?), pergunto-me o que C.S. Lewis teria a dizer aos brasileiros.
É claro que logo nos vem à mente o seu clássico “Cristianismo Puro e Simples” e a sua projeção de como seria uma sociedade cristã e sua moral social, que seria socialista, com a diferença de que obviamente não seria ateia nem totalitarista e, pelo contrário, atribuiria o poder último a Deus.
Não quero aqui entrar na discussão do socialismo versus capitalismo ou da separação entre Estado e Igreja, mas gostaria de lembrar um pequeno sermão de Lewis, que foi incluído na edição de “O Peso da Glória”, da Thomas Nelson do Brasil, que foi muito bem traduzido por “Círculo íntimo” (no original “Inner Ring”). Ele fala da tendência do ser humano de querer fazer parte de grupos seletos e a partir do momento que se é excluído desses grupos, surge a mágoa e o ódio. Tudo na vida gira em torno de se estar dentro ou fora de um grupo. Isso tem implicações muito importantes para a discussão atual sobre a exclusão/inclusão, mas isso é assunto para outro artigo.
Na verdade, o conjunto desses grupos na sociedade – desde os grupinhos ou gangues na escola, até os partidos políticos, sindicatos, departamentos nas universidades e grandes corporações – formam sistemas cada vez mais impenetráveis e complexos. Entrar para um grupo tem seu preço e ele é alto. E a primeira coisa que o grupo faz com o indivíduo é mexer com seus valores. Nem todo grupo faz a pessoa se corromper, mas a muitos fazem o indivíduo relativizar o seu conceito de certo e errado.
Grupos têm a tendência de se acharem soberanos e com direito de impor suas regras aos indivíduos e demais grupos. Não importa, se ele representa o governo (incluindo ditaduras brancas ou explícitas) ou o “povo” (sindicatos, movimentos sociais), seus interesses tendem a se sobrepor aos do bem da sociedade toda e isso sempre é negativo.
Certamente Lewis, que escreveu o artigo logo depois da Segunda Guerra Mundial, estava se referindo ao fenômeno do nazismo, mas também ao comunismo, e ao advento do tecnicismo e da tecnocracia no mundo ocidental. Mas ele persiste até os dias de hoje com outras roupagens. E no Brasil, em particular, achou um solo extremamente fértil para se reproduzir.
Anos atrás li um artigo sobre o corporativismo no Brasil, escrito nos idos de 1987, que resgata o sentido original das corporações medievais de artesãos, que se organizaram no sentido de se defender contra os desmandos da coroa e discute a depravação do conceito no mundo atual e conclui, citando o exemplo contemporâneo, que parece lançar uma luz e esperança sobre o sentido das corporações:
“Há um novo tipo de corporativismo na Europa de hoje que tem um outro sentido, e que corresponde a um estágio mais avançado do sindicalismo. Nos países onde isto ocorre, o movimento sindical e associativo é tão independente, competente e organizado que pode, quando quer, paralisar a economia e impor sua vontade. O resultado, no entanto, não é o impasse, mas a corresponsabilidade, e um entendimento social que permite que soluções consensuais sejam buscadas para as questões de interesse nacional, com benefícios para todos. É difícil dizer se esta experiência, própria de países pequenos e ricos, tem alguma relevância para nós. O que ela sugere, no entanto, são duas coisas: primeiro, que as sociedades modernas necessitam de consenso e corresponsabilidade para prosperar; e, segundo, que esta corresponsabilidade requer a autonomia e o fortalecimento das entidades representativas da sociedade, e não sua dependência e acomodação à sombra dos benefícios do Estado.” (SCHWARZMAN, 1987, p. 2).
Então, o fenômeno do “Inner Ring” não é um conceito estranho a nós, e transcende as diferenças entre a direita e a esquerda, pois ocorre de ambos os lados. Que tal cristãos de esquerda e direita se unirem para combater o corporativismo selvagem e defender a organização de corporações sadias?
É mestre e doutora em educação (USP) e doutora em estudos da tradução (UFSC). É autora de O Senhor dos Anéis: da fantasia à ética e tradutora de Um Ano com C.S. Lewis e Deus em Questão. Costuma se identificar como missionária no mundo acadêmico. É criadora e editora do site www.cslewis.com.br
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