Opinião
- 15 de setembro de 2020
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Da Lei Seca ao direito ao voto: o movimento e o avivamento feminino
Por Rute Salviano Almeida
“Se fosse somente para o meu próprio bem, eu não teria coragem, mas eu tenho por causa de ti, querida terra natal, porque a tua necessidade é bem maior que a minha e a tua esperança transcendente é bem maior que o interesse pessoal de teus humildes filhos. Por amor de vós, mulheres de corações partidos, cujos lábios trêmulos me abençoaram; por amor de vós, mães doces, que, à sombra dos berços, ajoelharam-se esta noite ao lado de seus bebês; e vocês, pequenas crianças aflitas, que escutam nesta hora, com faces estranhamente velhas (...); por amor a vocês tenho falado assim.”1
Essas palavras tocam o fundo de nossa alma. Uma mulher doando sua vida, seu talento, somente pelo bem de seu povo. Ela enxergava as mulheres entristecidas e acabadas, as crianças envelhecidas e sem esperança, e se dispõe à luta. Nessa época da revolução industrial, além de exploradas nas fábricas com salários ínfimos e longas jornadas de trabalho, mulheres e crianças sofriam espancamentos e xingamentos de pais bêbados.
Frances Willard, nascida em 1839, foi uma das personalidades importantes do metodismo estadunidense, que com sua personalidade, eloquência, habilidade administrativa e completa devoção, tornou-se uma líder intrépida pela temperança e pelos direitos das mulheres. Ela foi presidente nacional da União de Mulheres Cristãs pela Temperança (WCTU) e foi a fundadora da WCTU mundial. Nesse início, a ênfase principal dessa união de mulheres cristãs era o evangelismo.
As mulheres cristãs uniram-se em uma cruzada pela temperança, que foi um dos eventos mais notáveis e surpreendentes da história dos Estados Unidos. A cruzada varreu o país como um fogo na pradaria, queimando a velha ordem das coisas e abrindo espaço para o crescimento de uma nova ordem.
Senhoras tímidas que nunca pensaram em falar em público levantavam-se e oravam em voz alta, mulheres idosas guiavam grupos para as ruas e as esposas de cidadãos ilustres seguiam-nas. Todos os tipos de mulheres se juntaram à Cruzada: esposas e mães de bêbados vinham chorando para as reuniões, professoras, estrangeiras, funcionárias, avós, ricas e pobres, idosas e jovens, todas marchavam juntos cantando e indo corajosamente aos piores lugares, até que a cidade parecia estar “entregue nas mãos de Deus e das mulheres”.
Em um espírito cristão, para o bem da humanidade e amor aos seus próprios filhos, os proprietários eram persuadidos e, um após o outro, fechavam suas lojas e derramavam as bebidas na sarjeta, até que em uma semana não havia mais bebida vendida abertamente em toda a cidade.
Elas, então, decidiram fazer uma petição ao Congresso para ser votada uma lei que impedisse o comércio de bebidas alcoólicas. Um dos líderes políticos, pressionado pela esposa, mas ligado ao comércio de bebidas, lhes respondeu, com lágrimas nos olhos e lábios trêmulos: “Eu quero ajudá-las senhoras, mais do que imaginam, mas simplesmente não posso."2
Um dos motivos mais fortes para a negação do direito de voto das mulheres foi exatamente essa questão do combate ao alcoolismo, porque se temia que as mulheres usassem o seu voto para proibir a venda de bebidas alcoólicas.
Frances Willard faleceu em 1898 sem contemplar a vitória de sua causa. Foi somente em 1920 que entrou em vigor a Lei Seca, com o objetivo de salvar o país dos problemas relacionados com o vício do álcool, e foi também nesse ano que três quartos dos legislativos estaduais ratificaram a 19ª emenda, concedendo pleno direito de voto para as mulheres estadunidenses.
Foi uma longa luta.
Notas
1. GORDON, Anna A. The beautiful life of Frances Willard, p. 125.
2. WILLARD, Frances E. Glimpses of fifty years, p. 365.
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1. GORDON, Anna A. The beautiful life of Frances Willard, p. 125.
2. WILLARD, Frances E. Glimpses of fifty years, p. 365.
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Mulheres cantando em frente a um bar (saloon). Frank Leslie’s Illustrated Newspaper. 21. fev. 1874. Fonte: Association of Religion Data Archives.
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Mestre em teologia e pós-graduada em história do cristianismo, é autora de Vozes Femininas nos Avivamentos (Ultimato), além de Vozes Femininas no Início do Cristianismo, Uma Voz Feminina Calada pela Inquisição, Uma Voz Feminina na Reforma e Vozes Femininas no Início do Protestantismo Brasileiro (Prêmio Areté 2015).
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