Opinião
- 13 de julho de 2010
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Conferência de Edimburgo, cem anos depois
Antonia Leonora Van der Meer
Em junho de 1910, houve um importante congresso missionário que reuniu missionários, líderes de agências e outros obreiros cristãos de países da Europa e da América do Norte. Quase todos eram homens brancos, a representação da Ásia e da África era mínima e não havia nenhum latino-americano.
Entre os dias 2 e 6 de junho de 2010, cem anos depois, na mesma cidade de Edimburgo (Escócia), aconteceu um congresso menor -- em parte porque vários outros congressos missionários significativos acontecem em vários continentes --, com trezentos delegados e mais de cem participantes, na Universidade de Edimburgo. Houve uma maior participação de outros continentes, incluindo a América Latina, mais mulheres, um número ainda pequeno de jovens e quase unicamente obreiros de tempo integral. Havia poucos leigos -- profissionais cuja participação na missão da igreja é importante e indispensável, como comentou Vinoth Ramachandra, um dos representantes da IFES ao Congresso, em sua avaliação pública final.
A Fraternidade Teológica Latino Americana foi representada por Victor Reyes (presidente da FTLA) do Chile, Alejandra (obreira do Compañerismo, movimento irmão da ABU no México) e por mim, o que foi uma surpresa. Eu já havia pensado em ir, pois escrevi um texto (sobre missionários para e do Brasil nesses últimos 100 anos) para o livro “Atlas of Global Christianity”. Porém, por dificuldades financeiras e algumas outras, pensei em desistir -- até que veio o convite para representar a Fraternidade Teológica, uma das entidades cooperadoras com o Congresso (além da IFES, do Movimento Lausanne etc.). Tivemos vários encontros, incluindo a participação de Andrew Kirk, um dos fundadores da Fraternidade, e Tito Paredes, um dos “viejos leones”.
Além da variedade de denominações protestantes da linha do Conselho Mundial de Igrejas e da Aliança Evangélica Mundial, incluindo o movimento Pentecostal, havia participantes ortodoxos e católicos romanos. A importância de fundamentos bíblicos para a obra missionária teve um lugar de destaque. Foi enfatizado que a missão é, em primeiro lugar, Missio Dei, e houve uma ênfase em Jesus Cristo como nosso Salvador e na necessidade da atuação do Espírito Santo, sem o qual a missão se torna impossível.
Pode-se ter uma ideia do conteúdo acessando o documento final “Our Common Call” no site Edinburgh 2010 Conference. É um documento equilibrado, um chamado à missão integral e à atuação conjunta, com respeito mútuo, dando uma ênfase aos países do chamado “Global South”: Ásia, África e America Latina, mencionando que hoje a missão é de todo lugar para todo lugar. Houve um chamado à unidade no Corpo de Cristo e a uma cooperação crescente, e um compromisso em lidar com os assuntos controversos que persistem.
Os Temas dos Estudos Principais, que começaram antes e continuam depois do Congresso, são os seguintes:
1. Os fundamentos para a missão
2. A missão cristã entre outras religiões
3. A missão e o pós-modernismo
4. A missão e o poder
5. Novas formas de engajamento missionário
6. A educação e a formação teológica
7. As comunidades cristãs em contextos contemporâneos
8. A missão e a unidade -- a eclesiologia e a missão
9. A espiritualidade da missão e o discipulado autêntico
Cada um era dividido em três linhas (track) e cada pessoa tinha de se inscrever numa delas. Fui selecionada para participar do grupo dos “ouvintes” como mulher latino-americana. Tínhamos encontros diários no grupo maior para discutir o que se passava e nos subdividimos em grupos de três, cada subgrupo seguindo uma linha. Depois discutíamos o conteúdo e a relevância para a igreja atual nos grupos menores, e um de nós ficava responsável pelo relatório de quinhentas palavras. Meu subgrupo era da linha 2, que incluía os temas 4, 5 e 7.
Meu relatório foi sobre o tema 4: missão e poder. Houve vários estudos e testemunhos que mostraram a triste realidade do abuso de poder, que causou muito sofrimento a povos nativos, como aconteceu no Canadá, onde crianças indígenas foram forçadas a deixar os pais e ir para escolas internas missionárias. Era-lhes proibido falar sua língua e manter contato com seus irmãos. Havia um regime quase militar, cujo objetivo era purificar as crianças da cultura nativa. Entendemos que ainda hoje as missões podem exercer um poder e controle não-saudável ou contrário ao modelo de Jesus quando, por possuírem recursos financeiros e outros, impõem uma autoridade não cristocêntrica.
Gostei de participar do Congresso. Foi uma convivência interessante e enriquecedora com pessoas diferentes, e gostei muito do chamado para aproveitar e respeitar a força missionária das igrejas de emigrantes em diversos países. Há grupos de africanos, filipinos, coreanos e outros, exercendo não só um ministério significativo entre seus compatriotas, mas exercendo também influências revitalizadoras em igrejas de vários países. Essa influência globalizadora pode fortalecer a igreja quando há receptividade mútua e boa integração.
O louvor era totalmente multicultural e muito gostoso. Era uma amostra de como será no céu, com pessoas de todas as línguas, tribos, povos e nações. Outro fato importante é que sempre havia tradução simultânea para o espanhol e o francês, além de testemunhos, cânticos e orações em várias línguas.
O culto de celebração final contou com mais de mil participantes, incluindo convidados das igrejas locais, um coral africano exuberante, um grupo de moças indianas apresentando o relato da mulher samaritana através de uma dança, e a pregação do arcebispo de York, John Sentamu.
Quero chamar a atenção para o CLADE V, que será realizado na Costa Rica, com o lema “Sigamos a Jesús en su Reino de Vida: Guíanos Santo Espíritu”. Há vínculos bem claros entre a ênfase e o conteúdo de Edimburgo 2010, cujo lema foi “Testemunhar de Cristo hoje”, e o CLADE V. Houve ênfase no ministério do Espírito Santo, indispensável para a obra missionária, na missão integral, que inclui questões de justiça social, valorização dos grupos mais fracos e marginalizados e responsabilidade pelo meio ambiente, além de um chamado a uma maior cooperação entre os vários grupos cristãos representados. Houve um chamado a dar espaço para a liderança feminina e dar valor às crianças, não só como objetos de nossa missão, mas como parceiras na obra missionária. Todas essas questões são também fundamentais no programa e no fundamento teológico do CLADE V.
• Antonia Leonora van der Meer foi missionária da IFES em Angola por dez anos e hoje é coordenadora de desenvolvimento da Escola de Missões do Centro Evangélico de Missões, em Viçosa, MG. É autora de Eu, Um Missionário? e Missionários Feridos.
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Em junho de 1910, houve um importante congresso missionário que reuniu missionários, líderes de agências e outros obreiros cristãos de países da Europa e da América do Norte. Quase todos eram homens brancos, a representação da Ásia e da África era mínima e não havia nenhum latino-americano.
Entre os dias 2 e 6 de junho de 2010, cem anos depois, na mesma cidade de Edimburgo (Escócia), aconteceu um congresso menor -- em parte porque vários outros congressos missionários significativos acontecem em vários continentes --, com trezentos delegados e mais de cem participantes, na Universidade de Edimburgo. Houve uma maior participação de outros continentes, incluindo a América Latina, mais mulheres, um número ainda pequeno de jovens e quase unicamente obreiros de tempo integral. Havia poucos leigos -- profissionais cuja participação na missão da igreja é importante e indispensável, como comentou Vinoth Ramachandra, um dos representantes da IFES ao Congresso, em sua avaliação pública final.
A Fraternidade Teológica Latino Americana foi representada por Victor Reyes (presidente da FTLA) do Chile, Alejandra (obreira do Compañerismo, movimento irmão da ABU no México) e por mim, o que foi uma surpresa. Eu já havia pensado em ir, pois escrevi um texto (sobre missionários para e do Brasil nesses últimos 100 anos) para o livro “Atlas of Global Christianity”. Porém, por dificuldades financeiras e algumas outras, pensei em desistir -- até que veio o convite para representar a Fraternidade Teológica, uma das entidades cooperadoras com o Congresso (além da IFES, do Movimento Lausanne etc.). Tivemos vários encontros, incluindo a participação de Andrew Kirk, um dos fundadores da Fraternidade, e Tito Paredes, um dos “viejos leones”.
Além da variedade de denominações protestantes da linha do Conselho Mundial de Igrejas e da Aliança Evangélica Mundial, incluindo o movimento Pentecostal, havia participantes ortodoxos e católicos romanos. A importância de fundamentos bíblicos para a obra missionária teve um lugar de destaque. Foi enfatizado que a missão é, em primeiro lugar, Missio Dei, e houve uma ênfase em Jesus Cristo como nosso Salvador e na necessidade da atuação do Espírito Santo, sem o qual a missão se torna impossível.
Pode-se ter uma ideia do conteúdo acessando o documento final “Our Common Call” no site Edinburgh 2010 Conference. É um documento equilibrado, um chamado à missão integral e à atuação conjunta, com respeito mútuo, dando uma ênfase aos países do chamado “Global South”: Ásia, África e America Latina, mencionando que hoje a missão é de todo lugar para todo lugar. Houve um chamado à unidade no Corpo de Cristo e a uma cooperação crescente, e um compromisso em lidar com os assuntos controversos que persistem.
Os Temas dos Estudos Principais, que começaram antes e continuam depois do Congresso, são os seguintes:
1. Os fundamentos para a missão
2. A missão cristã entre outras religiões
3. A missão e o pós-modernismo
4. A missão e o poder
5. Novas formas de engajamento missionário
6. A educação e a formação teológica
7. As comunidades cristãs em contextos contemporâneos
8. A missão e a unidade -- a eclesiologia e a missão
9. A espiritualidade da missão e o discipulado autêntico
Cada um era dividido em três linhas (track) e cada pessoa tinha de se inscrever numa delas. Fui selecionada para participar do grupo dos “ouvintes” como mulher latino-americana. Tínhamos encontros diários no grupo maior para discutir o que se passava e nos subdividimos em grupos de três, cada subgrupo seguindo uma linha. Depois discutíamos o conteúdo e a relevância para a igreja atual nos grupos menores, e um de nós ficava responsável pelo relatório de quinhentas palavras. Meu subgrupo era da linha 2, que incluía os temas 4, 5 e 7.
Meu relatório foi sobre o tema 4: missão e poder. Houve vários estudos e testemunhos que mostraram a triste realidade do abuso de poder, que causou muito sofrimento a povos nativos, como aconteceu no Canadá, onde crianças indígenas foram forçadas a deixar os pais e ir para escolas internas missionárias. Era-lhes proibido falar sua língua e manter contato com seus irmãos. Havia um regime quase militar, cujo objetivo era purificar as crianças da cultura nativa. Entendemos que ainda hoje as missões podem exercer um poder e controle não-saudável ou contrário ao modelo de Jesus quando, por possuírem recursos financeiros e outros, impõem uma autoridade não cristocêntrica.
Gostei de participar do Congresso. Foi uma convivência interessante e enriquecedora com pessoas diferentes, e gostei muito do chamado para aproveitar e respeitar a força missionária das igrejas de emigrantes em diversos países. Há grupos de africanos, filipinos, coreanos e outros, exercendo não só um ministério significativo entre seus compatriotas, mas exercendo também influências revitalizadoras em igrejas de vários países. Essa influência globalizadora pode fortalecer a igreja quando há receptividade mútua e boa integração.
O louvor era totalmente multicultural e muito gostoso. Era uma amostra de como será no céu, com pessoas de todas as línguas, tribos, povos e nações. Outro fato importante é que sempre havia tradução simultânea para o espanhol e o francês, além de testemunhos, cânticos e orações em várias línguas.
O culto de celebração final contou com mais de mil participantes, incluindo convidados das igrejas locais, um coral africano exuberante, um grupo de moças indianas apresentando o relato da mulher samaritana através de uma dança, e a pregação do arcebispo de York, John Sentamu.
Quero chamar a atenção para o CLADE V, que será realizado na Costa Rica, com o lema “Sigamos a Jesús en su Reino de Vida: Guíanos Santo Espíritu”. Há vínculos bem claros entre a ênfase e o conteúdo de Edimburgo 2010, cujo lema foi “Testemunhar de Cristo hoje”, e o CLADE V. Houve ênfase no ministério do Espírito Santo, indispensável para a obra missionária, na missão integral, que inclui questões de justiça social, valorização dos grupos mais fracos e marginalizados e responsabilidade pelo meio ambiente, além de um chamado a uma maior cooperação entre os vários grupos cristãos representados. Houve um chamado a dar espaço para a liderança feminina e dar valor às crianças, não só como objetos de nossa missão, mas como parceiras na obra missionária. Todas essas questões são também fundamentais no programa e no fundamento teológico do CLADE V.
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