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Opinião

Conclave – amor ao poder ou o poder do amor?

"Que Deus nos dê um papa que tenha dúvidas, que peque, peça perdão e siga em frente"

Por Carlos Caldas

Conclave é um filme de 2024 do diretor suíço-alemão Edward Berger, baseado no livro homônimo do romancista inglês Robert Harris1– como não li o livro, não sei se o filme é ou não fiel ao texto que o originou. Por conta de seu tema, o filme fez – e segue fazendo – muito sucesso, e ao mesmo tempo, gerando controvérsias e polêmicas: o mote do filme é justamente o conclave, a reunião dos cardeais da Igreja Católica Romana para a escolha de seu líder máximo, o Papa. Conforme preceitua o direito canônico romano, os cardeais de todo o mundo escolhem quem será sua autoridade maior em uma reunião secreta. Tudo que é secreto chama a atenção das pessoas, e o conclave não é exceção. A partir desta situação, Harris escreveu uma “estória” a respeito, que inspirou o filme de Berger.

A narrativa começa com a morte do Papa, cujo nome não é mencionado nem uma vez. A partir daí o conclave tem que ser convocado, e cabe ao Cardeal Thomas Lawrence – magnificamente interpretado pelo ator inglês Ralph Fiennes (o Voldemort dos filmes da franquia Harry Potter), que dá uma soberba aula de interpretação – estar à testa dos trabalhos. Os votantes chegam, muitos deles já se conheciam, eles se confraternizam, tomam suas refeições juntos, e nas sessões de votação, se enclausuram em uma sala bastante grande, não podendo ter nesta hora nenhum contato com o mundo exterior. A propósito, vale lembrar que a palavra conclave vem do latim cum clavis – literalmente, “com chave”, por extensão, “fechado”. Antes da primeira sessão, Lawrence faz uma homilia na qual de maneira ousada afirma:
A certeza é a grande inimiga da unidade. A certeza é inimiga mortal da tolerância. Nem mesmo Cristo tinha certeza no final. “Deus meu, Deus meu, por que me abandonaste”, ele clamou em agonia na hora nona na cruz. Nossa fé é algo vivo, justamente porque anda de mãos dadas com a dúvida. Se houvesse apenas certeza, e nenhuma dúvida, não haveria mistério e, portanto, não haveria necessidade de se ter fé. Vamos pedir a Deus que nos dê um papa que tenha dúvidas, que ele nos dê um papa que peque e que peça perdão, e que siga em frente.2

O filme tem um tom de thriller de detetive, porque pouco a pouco Lawrence vai descobrindo segredos mundanos de alguns dos seus colegas cardeais. Não que ele o quisesse, muito pelo contrário. A narrativa deixa muito claro que ele não sente nenhum prazer em lidar com situações nem um pouco santas do passado de alguns deles, mas ele cumpre fielmente o seu dever, algumas vezes confrontando e repreendendo os colegas de sotaina3 que precisavam ser confrontados e repreendidos. Lawrence é um homem de fé sincera e coração pastoral, e é impressionante como Fiennes conseguiu demonstrar sentimentos de indignação, perplexidade, tristeza e alegria apenas com seu olhar sua expressão facial.

Aos poucos a “disputa” se afunila, com a possibilidade de quatro cardeais alcançarem o número necessário para a eleição, sendo dois representantes de uma posição progressista, e os outros dois representando a ala tradicionalista (ou ultra tradicionalista) da igreja romana. Os progressistas são o próprio Lawrence e o Cardeal Bellini (muito bem interpretado por Stanley Tucci) e os tradicionalistas são o Cardeal Adeyemi, um nigeriano, que pode ser o primeiro papa negro da história (interpretado pelo ator zimbabueano Lucian Msamati) e o Cardeal Tedesco, um italiano (interpretado pelo ator igualmente italiano Sergio Castellitto). Mas também “correndo por fora” no “páreo” está o Cardeal Tremblay (John Lithgow).

O personagem de Tedesco é uma caricatura: grosseiro, falastrão, exagerado em suas falas, caras e bocas, não esconde de ninguém que quer porque quer ser eleito papa. Tremblay também quer, e lança mão de recursos escusos, porque suborna alguns cardeais para votarem nele. Bellini e Lawrence não querem de jeito nenhum, e as cenas dos diálogos dos dois são excelentes, diálogos densos e ricos, nos quais argumentam mutuamente.

Mas aí eis que surge uma novidade que pega a todos de surpresa: a chegada do Cardeal Benitez (vivido pelo ator mexicano Carlos Diehz), um mexicano que havia sido nomeado para o Colégio Cardinalício pelo papa anterior in pectore, isto é, em segredo, para a Arquidiocese de Cabul, no Afeganistão. Nem mesmo Lawrence tinha conhecimento desta nomeação. Em meio às sessões de votação, todas inconclusivas, está também a Madre Agnes, uma coordenadora das freiras do Vaticano (interpretada por Isabela Rosselini, que tem um pedigree notável no cinema, pois é filha de Ingrid Bergman e Roberto Rosselini). Madre Agnes fala pouco, mas vê muito. É atenta e astuta, e sabe de tudo que se passa nos corredores vaticanos.

Pouco a pouco a trajetória do Cardeal Benitez vai sendo conhecida. Além do Afeganistão, onde os cristãos são, com perdão da redundância, minoria minúscula, ele havia trabalhado em outros lugares muito difíceis, contextos de guerra e pobreza extrema. E com isso, vai conquistando silenciosamente a simpatia dos votantes. Por fim, será eleito, escolhendo o nome papal de Inocêncio.

Outra inesperada e surpreendente virada na narrativa: descobre-se um segredo de Benitez, mas não algo errado que ele tenha feito no passado, como tinha sido o caso, por exemplo, do Cardeal Adeyemi. Benitez é portador de uma rara condição biológica, da qual o papa recentemente falecido tinha conhecimento. Ele seria operado em Genebra, com as despesas sendo cobertas pelo Vaticano, mas na última hora, declinou da oferta, preferindo-se manter “como Deus o havia criado”, em suas próprias palavras. Esta cena final do filme desagradou enormemente muitos fieis católicos, por lhes parecer uma reedição moderna da história/estória/lenda da Papisa Joana, que teria sido a única mulher a exercer o papado. Há um debate entre os historiadores quanto à veracidade deste relato. As evidências sugerem que tenha sido uma narrativa antipapal construída na Idade Média.

O filme inclui este turning point (“ponto de virada”) como um libelo em prol de uma renovação da mentalidade da Igreja Católica, que é a instituição mais conservadora do mundo? Ou o fez como uma forma de denúncia ou zombaria? Difícil, talvez impossível responder a esta pergunta. Verdade é que a narrativa teria sido perfeitamente compreendida se não houvesse o Cardeal Benitez.

Fato é que Conclave é um filme que provoca, faz pensar. Não se assiste a um filme como este de maneira impune. O que para mim mais chamou a atenção não foi nem tanto seu final, mas a diferença de perspectivas daqueles que, querendo ou não, disputaram a eleição. Para uns, era o amor ao poder. Para outros, era – ou teria sido – o exercício do poder do amor.

Notas
1. Não confundir o mencionado romance de Robert Harris com o livro homônimo do vaticanista norte-americano John Allen Jr., publicado no Brasil pela Record em 2003. A obra de Allen pode muito bem ser adaptada para um documentário televisivo sobre o processo da eleição papal, por ser rica em detalhes e bastante didática, texto de leitura fácil e acessível.

2. Extraído de https://www.instagram.com/reel/DGzLX7St2LK/ (tradução nossa). Acesso: 28 março 2025.

3. Sotaina é o nome da batina usada pelos cardeais romanos, de cor vermelha, que lembra e simboliza o sangue derramado por Jesus na cruz.



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