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Opinião

Como a ciência engrandece a fé?

Por Ruth Bancewicz
 
Existe uma trajetória básica para um estudante de doutorado em ciências, e é algo mais ou menos assim. Entusiasmo e prazer misturados com uma sensação de medo, um começo gradual de dura realidade e estresse, talvez uma pitada de tédio e possivelmente até algum desespero e desilusão. Isso é seguido por um longo período de determinação e trabalho árduo, que termina em alegria e alívio. Este é o teste em que o caráter é formado, as carreiras são estabelecidas e se desenvolvem habilidades que durarão toda a vida. Algumas das habilidades aprendidas são muito úteis: técnicas experimentais, formas de pensar, habilidades organizacionais e de gerenciamento de projetos e, claro, conhecimento. As menos úteis podem incluir técnicas de procrastinação, formas de blefar, jogos on-line e habilidades com mídias sociais e, claro, sobreviver por dias inteiros do conteúdo das máquinas de venda automática do departamento.
 
Brincadeiras à parte, eu sei que sou muito diferente depois de fazer um doutorado. Tendo percorrido minha educação com razoável facilidade até aquele ponto, finalmente cheguei ao meu limite e me perguntei se poderia concluir meu projeto de pesquisa. Eu fui forçada a confiar em Deus de uma maneira que eu nunca tinha feito até então. Eu tive que dar a Ele meus medos e inseguranças e aprender a encontrar minha confiança em quem Ele me fez como pessoa, ao invés de minhas ambições (e esse processo ainda está em andamento!). Eu tive que aprender a confiar mais nele, me apoiar um pouco mais nos meus amigos, ser honesta sobre minhas lutas, e continuar caminhando quando eu senti vontade de tirar longas férias. No geral, descobri que minha fé me ajudou neste momento. Concluí meus estudos com uma convicção mais forte de que Deus existia e foi capaz de me ajudar a trabalhar duro por Ele.
 
Também houve muito o que desfrutar nos meus estudos. Quando as coisas estavam indo bem, havia a sensação de união que vem de compartilhar o espaço do laboratório com um grupo diverso, a diversão de sair com pessoas criativas e a oportunidade de explorar minhas próprias ideias em minha pesquisa. Aprendi como a comunidade é criada, a dar tanto quanto receber de meus colegas, que as celebrações regulares são uma parte vital da vida e como respeitar meus colegas mais experientes sem levá-los tanto a sério. Essas experiências também ajudaram minha fé e meu caráter a crescer, me levaram a florescer em meu trabalho e alimentaram minha contribuição como membro de uma igreja.
 
 
Agora que estou fora do laboratório e trabalhando em tempo integral em ciência e religião, tenho o luxo de pensar sobre essas experiências com mais profundidade. Um dos meus projetos recentes envolveu olhar como a ciência alimenta a fé de uma forma positiva. Além do crescimento geral em habilidades e conhecimentos, fé, caráter e comunidade, cinco áreas específicas surgiram repetidas vezes em minhas conversas com cientistas em atividade. Estas eram criatividade, imaginação, beleza, maravilhamento e reverência. Algumas dessas experiências são talvez mais obviamente parte da ciência do que outras, mas todas as cinco são importantes para os cientistas, então vou dedicar um tempo em cada uma delas.
 
Criatividade
Somente aqueles de nós dentro do laboratório (ou no campo) conseguem entender completamente a criatividade envolvida em nossa pesquisa. Para termos um bom desempenho, precisamos ter ideias originais, ser engenhosos, resolver problemas e encontrar constantemente novas maneiras de olhar nossos dados e relacioná-los ao que já é conhecido. Sem criatividade, a ciência em qualquer nível significativo não iria para frente. Como cristã, acredito que nossa criatividade é um reflexo da criatividade de Deus. Ele nos criou, lenta e meticulosamente, e refletimos algo do caráter do Criador. Não podemos criar do nada, mas podemos nos inspirar nas coisas que vemos ao nosso redor, fazendo conexões entre elas e explorando o mundo de maneiras completamente novas. Acho que é essencial usar minha criatividade o mais regularmente possível, ou algo dentro de mim seca.
 
Imaginação
A imaginação é uma ferramenta essencial para a criatividade. Nós classificamos e examinamos nosso conhecimento, criamos cenários e pensamos no futuro. Alternamos perfeitamente entre o mundo material e um mundo imaginário de pensamentos e memórias. Testamos ideias diante da realidade, descartando ideias não realistas e rejeitando cenários que não funcionam. No final, formulamos formas de dar sentido ao mundo que levam em conta o máximo de dados possível. Este processo é semelhante tanto para a ciência quanto para a fé. Ambas envolvem a integração de evidências e experiência para chegar a um modelo de como o mundo funciona, embora em diferentes níveis: um estrito e detalhado, e um amplo e abrangente. A formação em ciência pode nos ajudar a usar nossa imaginação de forma mais frutífera, testando nossas ideias diante da realidade – desde que não percamos de vista o fato de que a fé cristã é muito mais ampla do que os dados científicos. Devemos aprender a olhar além de nosso campo acadêmico escolhido para a metafísica, relacionamentos, escrituras, experiência espiritual e muito mais.
 
Os cientistas também conseguem ver o próprio material da criação e compartilhar a alegria do Criador enquanto descobrimos coisas que nenhuma outra pessoa na Terra viu antes. Todos nós achamos certas coisas em nosso trabalho lindas, e algumas delas são lindas até para outras pessoas. Há grandes belezas de forma e cor, organização e padrões regulares, ou mesmo uma elegante simplicidade em nossas equações. Algumas pessoas apreciam técnicas, organismos ou formas específicas de apresentar dados. Para C.S Lewis, a beleza era um lembrete da fonte de toda a beleza que pode ser encontrada em Deus.
 
 
Maravilhamento
O maravilhamento é um atributo essencial para um cientista. Nós somos aqueles que nunca param de fazer perguntas sobre o que são as coisas e como elas funcionam. Sem maravilhamento, teríamos dificuldades em nos motivarmos para trabalhar, persistir diante de problemas difíceis ou examinar nossos dados com profundidade suficiente. O maravilhamento também é uma pequena parte da experiência muito mais ampla de reverência, que surge de vez em quando. Finalmente, o experimento está funcionando, as respostas estão chegando e novas surpresas estão por vir. Novas perguntas surgem, mas também uma sensação de que algo tremendamente significativo está acontecendo – você está recebendo o dom de uma visão sobre a própria estrutura do mundo. Este momento pode parecer uma recompensa por um longo período de trabalho árduo, como se você atingisse o topo de uma montanha e pudesse passar um tempo descansando e observando a vista antes de seguir para o próximo pico. Esses são os momentos em que às vezes usamos uma linguagem mais espiritual, como se palavras mais científicas fossem inadequadas para descrever a experiência. Para o cristão, uma experiência de admiração e reverência pode levar diretamente à adoração.
 
As próprias descobertas da ciência
Finalmente, as próprias descobertas da ciência também podem alimentar a fé de alguma forma. O modelo que uso para moldar meu pensamento nesta área vem do teólogo britânico Alister McGrath. Ele gosta de pensar na teologia como uma lente que é usada para olhar o mundo. Quando essa lente é usada, as coisas ficam mais nítidas? Elas fazem sentido? Por exemplo, as propriedades físicas do universo parecem finamente ajustadas para permitir que a vida se desenvolva. Essa ideia faria sentido se existisse um Deus que desejasse criar vida? Acho que sim! E a evolução repetida de estruturas úteis como olhos e asas? Ou a importância da cooperação no mundo vivo? Que cosmovisão abrangente dá sentido a esses dados? É preciso ter muito cuidado para não sustentar a fé com argumentos científicos, mas olhar para ela de outra maneira – como um experimento mental – pode ser um exercício útil.
 
Portanto, há muito na ciência que pode alimentar nossa fé de maneira positiva, como é o caso em todas as profissões. A questão é: como podemos aproveitar ao máximo essas oportunidades para crescer como indivíduos? Como podemos permitir que elas enriqueçam nossas comunidades estendidas? Algumas dessas experiências são exclusivas da ciência, então talvez devêssemos compartilhá-las  com nossas igrejas? No ambiente de laboratório, essas coisas podem desencadear conversas ou nos moldar de maneiras que podem ser únicas para um cristão. Então, como podemos discutir a relação entre ciência e fé de uma maneira interessante, relevante e útil?
 
Repostado em 1 de dezembro de 2016 com permissão do Emerging Scholars Network
  • Ruth Bancewicz é pesquisadora Associada Sênior do Faraday Institute for Science and Religion, onde trabalha na interação positiva entre fé e ciência. Depois de estudar genética na Universidade de Aberdeen, ela completou um doutorado na Universidade de Edimburgo. Ela passou dois anos como pesquisadora de pós-doutorado de meio período no Wellcome Trust Centre for Cell Biology na Universidade de Edimburgo, enquanto também trabalhava como Diretora de Desenvolvimento para a Christians in Science. Ruth chegou ao Faraday Institute em 2006 e atualmente é curadora do Christians in Science.

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