Opinião
- 03 de outubro de 2008
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Cidadania e fé cristã
Num certo sentido, a afirmação da cidadania se torna uma crença funcional da descrença escatológica na modernidade. Não faz sentido algum para os cristãos reivindicarem seus direitos como cidadãos num contexto de forte expectativa de irrupção da “última ordem”, as “eschata kantiana” que sobrevivem na estrutura ontológica da fé esperante.
A secularização é a afirmação visceral contra a expectativa de irrupção da “ordem última”. O cristianismo moderno se desescatologizou ao eclipsar a crença cristã da futuridade de Deus. Neste sentido, a emergência de uma configuração social que reivindique a justiça social aqui e agora, que garanta a paridade de direitos a todos os cidadãos contribuintes em uma sociedade democrática, pode ser, sim, a afirmação de uma disfuncionalidade escatológica da crença central da fé cristã: a esperança de ressurreição dos mortos, e com ela a manifestação da “justiça escatológica”.
A pergunta “devo eu então abdicar meus direitos como cidadão por conta da crença na ressurreição que professo como cristão?” tem uma resposta de dois lados. Paulo é um bom exemplo a ser seguido. Quando viu sua atividade “querigmática” prejudicada pelos representantes legais do Império Romano, ele, na condição de cidadão romano, protegido formalmente pela lei romana, apelou para a efetivação dos seus direitos como tal. Em outros momentos, contudo, a resignação foi usada por ele para dar testemunho do seu culto racional prestado a Deus na forma de “sacrifício vivo” (Rm 12.1).
Quando a consciência da cidadania se torna um clichê de reivindicações ideológicas, aí sim temos um problema. Pois nossa reivindicação neste contexto pode esconder a falência das crenças vitais da fé que professamos publicamente. O juízo é interno, mas parte sempre desse princípio hermenêutico em que a afirmação da esperança escatológica ficará em evidência. Não negue sua cidadania. Entretanto, não permita que a esperança de sua fé seja sepultada nela. A dialética é: “Dai a César o que é de César; mas não dai a César o que é de Deus”. Talvez este seja o caminho de uma possível conciliação entre duas variáveis historicamente tão rivalizadas. Peça a Deus sabedoria para poder discernir o que fazer em situações complexas que exijam de você decência como cidadão e fidelidade como cristão.
• Anderson Clayton, casado, dois filhos, é doutor em teologia e doutorando em sociologia. É professor do Instituto Superior de Teologia Luterana e pastor colaborador na Igreja Confessional Luterana.
A secularização é a afirmação visceral contra a expectativa de irrupção da “ordem última”. O cristianismo moderno se desescatologizou ao eclipsar a crença cristã da futuridade de Deus. Neste sentido, a emergência de uma configuração social que reivindique a justiça social aqui e agora, que garanta a paridade de direitos a todos os cidadãos contribuintes em uma sociedade democrática, pode ser, sim, a afirmação de uma disfuncionalidade escatológica da crença central da fé cristã: a esperança de ressurreição dos mortos, e com ela a manifestação da “justiça escatológica”.
A pergunta “devo eu então abdicar meus direitos como cidadão por conta da crença na ressurreição que professo como cristão?” tem uma resposta de dois lados. Paulo é um bom exemplo a ser seguido. Quando viu sua atividade “querigmática” prejudicada pelos representantes legais do Império Romano, ele, na condição de cidadão romano, protegido formalmente pela lei romana, apelou para a efetivação dos seus direitos como tal. Em outros momentos, contudo, a resignação foi usada por ele para dar testemunho do seu culto racional prestado a Deus na forma de “sacrifício vivo” (Rm 12.1).
Quando a consciência da cidadania se torna um clichê de reivindicações ideológicas, aí sim temos um problema. Pois nossa reivindicação neste contexto pode esconder a falência das crenças vitais da fé que professamos publicamente. O juízo é interno, mas parte sempre desse princípio hermenêutico em que a afirmação da esperança escatológica ficará em evidência. Não negue sua cidadania. Entretanto, não permita que a esperança de sua fé seja sepultada nela. A dialética é: “Dai a César o que é de César; mas não dai a César o que é de Deus”. Talvez este seja o caminho de uma possível conciliação entre duas variáveis historicamente tão rivalizadas. Peça a Deus sabedoria para poder discernir o que fazer em situações complexas que exijam de você decência como cidadão e fidelidade como cristão.
• Anderson Clayton, casado, dois filhos, é doutor em teologia e doutorando em sociologia. É professor do Instituto Superior de Teologia Luterana e pastor colaborador na Igreja Confessional Luterana.
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