Opinião
- 17 de abril de 2017
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C. S. Lewis: estabelecendo pontes entre o protestantismo e o catolicismo
Por Gabriele Greggersen
C. S. Lewis defendia o ecumenismo e o diálogo inter-religioso?
Muitos que já tiveram contato com o legado de Lewis como apologista cristão têm se perguntado a que vertente do cristianismo ele pertencia. Alguns o fazem por simples curiosidade; outros por força do hábito da classificação de cristãos em caixinhas; outros ainda, com a intenção de estabelecer um partidarismo.
O fato é que ele tem admiradores de todos os ramos do cristianismo e aqueles que o leram em profundidades não parecem se preocupar com essa questão, mesmo porque ele não hasteava nenhuma bandeira em particular. Pelo contrário, como fica claro em “Cristianismo Puro e Simples”, ele encarava o cristianismo como uma casa com um grande hall de entrada que leva a vários cômodos. Cada um escolhe em qual deles vai preferir passar o seu tempo. Assim, como bom anglicano que era (vertente do cristianismo, aliás, muito pouco conhecida no Brasil), ele defendia o ecumenismo cristão e, eu diria até, o diálogo inter-religioso. Isso pode ser observado em “A Abolição do Homem”, em que ele coloca ditos e provérbios de diversas culturas e religiões lado a lado, para provar que elas dizem basicamente as mesmas coisas.
É claro que ele também defendia o fato de Jesus ser o único caminho, a verdade, e a vida; mas isso não o impedia de dialogar e respeitar os posicionamentos dos outros. Tanto que ele tinha muitos amigos católicos, entre padres e freiras, sem falar no célebre J.R.R. Tolkien. E ele até levou muitas pessoas a abraçarem o catolicismo, o que inspirou um artigo recente de Joseph Pearce, intitulado: “Was the 20th Century’s Best Evangelist for Catholicism a Protestant?” [“Era o maior evangelista do catolicismo do século 20 um protestante?”].
Lewis foi o maior evangelista do catolicismo no século 20?
Após arrolarem os nomes de eminentes católicos que se converteram através de C. S. Lewis, como Thomas Howard, Carl E. Olson, seu secretário Walter Hooper, e Peter Kreeft, e algumas ideias de Lewis, que mostram influências católicas, o autor especula que ele fez mais pelo catolicismo do que muito católico. No final Pearce afirma que é bem provável que, se Lewis tivesse vivido mais tempo, ele teria se tornado um católico.
Essa é uma especulação deveras fantasiosa, por tudo que eu conheço de C.S. Lewis, e nada mais do que uma prova adicional de que ele era um legítimo e convicto anglicano, que não mudaria de posição no fim da vida, se não mudou com toda a pressão que teve para tanto ao longo da vida.
E não é uma alegada decadência atual do anglicanismo que tornará Lewis menos anglicano, o que seria, ademais, um anacronismo absurdo...
E ele não era mais católico do que protestante. Suas convicções protestantes ficam claras nos seus livros sobre literatura inglesa, como “A Alegoria do Amor” e “A Imagem Descartada” (Editora É-realizações), que tive o privilégio de traduzir, e outros dois que ainda estão para sair. Nessas obras, ele se posiciona clara e historicamente a favor da Reforma.
Nem católico, nem protestante, muito menos calvinista...
Mas o fato de protestantes e católicos se digladiarem para reivindicar Lewis para o seu lado (já vi um vídeo no youtube, em que se jura de pé junto até que ele era calvinista) é para mim a prova cabal de que ele era o que era: um legítimo anglicano. Pois o anglicanismo pretende isso mesmo: estabelecer uma via média entre católicos e protestantes, extraindo o que há de melhor nessas duas vertentes do cristianismo e lançando pontes entre elas.
Lewis adota atitudes típicas dos anglicanos em relação a diversas controvérsias teológicas: ele não diz claramente que é a favor da oração pelos mortos, mas diz que orou pela falecida Joy em “Anatomia de uma Dor”. Ele não defende o purgatório com todas as letras, mas especula sobre ele em “O Grande Abismo” e “Cartas a Malcolm” e até confessa que crê nele. Portanto, ele tem fortes influências do catolicismo e o aprecia em muitas coisas, mas não se rende a ele, como todo bom anglicano. (Não é para menos que muitos confundem certos templos e liturgias anglicanas com as católicas. Mas o bom entendedor vai notar as diferenças).
Ortodoxo nos pontos essenciais do cristianismo e “liberal” nos secundários
A postura de Lewis diante das controvérsias do cristianismo é de assumir a tensão entre os opostos e não dar respostas definitivas. Ao invés de aderir a essa ou aquela crença, que não seja básica do “cristianismo puro e simples” ou essencial, ele adere ao mistério. Ou seja, ele é ortodoxo nas coisas essenciais do cristianismo, e “liberal” nas demais.
Por isso eu desconfio de todos aqueles que alegam que Lewis acreditava piamente nisso ou naquilo, quando se trata de temas secundários do cristianismo, e brigam por causa disso, tanto a favor como contra ele. Tais pessoas não entenderam nada! Simplesmente não captaram do que trata toda literatura do autor: de estabelecer o diálogo e chegar a pontos comuns a todos os cristãos, que são as suas doutrinas essenciais, como as expressas pelo Credo dos Apóstolos, e não se fixar nas diferenças.
Essa postura radical contra os extremismos também é o motivo por que os fundamentalistas rejeitam Lewis. Para eles, Lewis é liberal demais. Mas os liberais também o rejeitam, dessa vez, por o considerarem demasiadamente fundamentalista. Graças a Deus por isso! Ele não adota nenhuma das duas posições extremas. E se recusa a orientar os leitores em relação a qualquer denominação cristã, como deixa claro no prefácio de “Cristianismo Puro e Simples”. Mas para o bom entendedor, não há melhor prova de sua opção clara pelo anglicanismo, sem uma única palavra de proselitismo a favor do mesmo. Mesmo porque os anglicanos não hasteiam bandeiras, mesmo que isso signifique serem muitas vezes impopulares e esquecidos.
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C. S. Lewis defendia o ecumenismo e o diálogo inter-religioso?
Muitos que já tiveram contato com o legado de Lewis como apologista cristão têm se perguntado a que vertente do cristianismo ele pertencia. Alguns o fazem por simples curiosidade; outros por força do hábito da classificação de cristãos em caixinhas; outros ainda, com a intenção de estabelecer um partidarismo.
O fato é que ele tem admiradores de todos os ramos do cristianismo e aqueles que o leram em profundidades não parecem se preocupar com essa questão, mesmo porque ele não hasteava nenhuma bandeira em particular. Pelo contrário, como fica claro em “Cristianismo Puro e Simples”, ele encarava o cristianismo como uma casa com um grande hall de entrada que leva a vários cômodos. Cada um escolhe em qual deles vai preferir passar o seu tempo. Assim, como bom anglicano que era (vertente do cristianismo, aliás, muito pouco conhecida no Brasil), ele defendia o ecumenismo cristão e, eu diria até, o diálogo inter-religioso. Isso pode ser observado em “A Abolição do Homem”, em que ele coloca ditos e provérbios de diversas culturas e religiões lado a lado, para provar que elas dizem basicamente as mesmas coisas.
É claro que ele também defendia o fato de Jesus ser o único caminho, a verdade, e a vida; mas isso não o impedia de dialogar e respeitar os posicionamentos dos outros. Tanto que ele tinha muitos amigos católicos, entre padres e freiras, sem falar no célebre J.R.R. Tolkien. E ele até levou muitas pessoas a abraçarem o catolicismo, o que inspirou um artigo recente de Joseph Pearce, intitulado: “Was the 20th Century’s Best Evangelist for Catholicism a Protestant?” [“Era o maior evangelista do catolicismo do século 20 um protestante?”].
Lewis foi o maior evangelista do catolicismo no século 20?
Após arrolarem os nomes de eminentes católicos que se converteram através de C. S. Lewis, como Thomas Howard, Carl E. Olson, seu secretário Walter Hooper, e Peter Kreeft, e algumas ideias de Lewis, que mostram influências católicas, o autor especula que ele fez mais pelo catolicismo do que muito católico. No final Pearce afirma que é bem provável que, se Lewis tivesse vivido mais tempo, ele teria se tornado um católico.
Essa é uma especulação deveras fantasiosa, por tudo que eu conheço de C.S. Lewis, e nada mais do que uma prova adicional de que ele era um legítimo e convicto anglicano, que não mudaria de posição no fim da vida, se não mudou com toda a pressão que teve para tanto ao longo da vida.
E não é uma alegada decadência atual do anglicanismo que tornará Lewis menos anglicano, o que seria, ademais, um anacronismo absurdo...
E ele não era mais católico do que protestante. Suas convicções protestantes ficam claras nos seus livros sobre literatura inglesa, como “A Alegoria do Amor” e “A Imagem Descartada” (Editora É-realizações), que tive o privilégio de traduzir, e outros dois que ainda estão para sair. Nessas obras, ele se posiciona clara e historicamente a favor da Reforma.
Nem católico, nem protestante, muito menos calvinista...
Mas o fato de protestantes e católicos se digladiarem para reivindicar Lewis para o seu lado (já vi um vídeo no youtube, em que se jura de pé junto até que ele era calvinista) é para mim a prova cabal de que ele era o que era: um legítimo anglicano. Pois o anglicanismo pretende isso mesmo: estabelecer uma via média entre católicos e protestantes, extraindo o que há de melhor nessas duas vertentes do cristianismo e lançando pontes entre elas.
Lewis adota atitudes típicas dos anglicanos em relação a diversas controvérsias teológicas: ele não diz claramente que é a favor da oração pelos mortos, mas diz que orou pela falecida Joy em “Anatomia de uma Dor”. Ele não defende o purgatório com todas as letras, mas especula sobre ele em “O Grande Abismo” e “Cartas a Malcolm” e até confessa que crê nele. Portanto, ele tem fortes influências do catolicismo e o aprecia em muitas coisas, mas não se rende a ele, como todo bom anglicano. (Não é para menos que muitos confundem certos templos e liturgias anglicanas com as católicas. Mas o bom entendedor vai notar as diferenças).
Ortodoxo nos pontos essenciais do cristianismo e “liberal” nos secundários
A postura de Lewis diante das controvérsias do cristianismo é de assumir a tensão entre os opostos e não dar respostas definitivas. Ao invés de aderir a essa ou aquela crença, que não seja básica do “cristianismo puro e simples” ou essencial, ele adere ao mistério. Ou seja, ele é ortodoxo nas coisas essenciais do cristianismo, e “liberal” nas demais.
Por isso eu desconfio de todos aqueles que alegam que Lewis acreditava piamente nisso ou naquilo, quando se trata de temas secundários do cristianismo, e brigam por causa disso, tanto a favor como contra ele. Tais pessoas não entenderam nada! Simplesmente não captaram do que trata toda literatura do autor: de estabelecer o diálogo e chegar a pontos comuns a todos os cristãos, que são as suas doutrinas essenciais, como as expressas pelo Credo dos Apóstolos, e não se fixar nas diferenças.
Essa postura radical contra os extremismos também é o motivo por que os fundamentalistas rejeitam Lewis. Para eles, Lewis é liberal demais. Mas os liberais também o rejeitam, dessa vez, por o considerarem demasiadamente fundamentalista. Graças a Deus por isso! Ele não adota nenhuma das duas posições extremas. E se recusa a orientar os leitores em relação a qualquer denominação cristã, como deixa claro no prefácio de “Cristianismo Puro e Simples”. Mas para o bom entendedor, não há melhor prova de sua opção clara pelo anglicanismo, sem uma única palavra de proselitismo a favor do mesmo. Mesmo porque os anglicanos não hasteiam bandeiras, mesmo que isso signifique serem muitas vezes impopulares e esquecidos.
Leia mais
A relação de C. S. Lewis com a morte
Imaginação e autenticidade: C. S. Lewis e as ferramentas da fantasia
Príncipe Caspian e o Reino de Deus
Um Ano com C. S. Lewis
Surpreendido pela Alegria
É mestre e doutora em educação (USP) e doutora em estudos da tradução (UFSC). É autora de O Senhor dos Anéis: da fantasia à ética e tradutora de Um Ano com C.S. Lewis e Deus em Questão. Costuma se identificar como missionária no mundo acadêmico. É criadora e editora do site www.cslewis.com.br
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