Opinião
- 13 de setembro de 2018
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Atentado a mando de Deus. Que Deus?
Por Gerson Borges
À propósito da coluna de Helio Schwartsman na Folha de S. Paulo da última terça-feira, dia11 (Atentado a mando de Deus?), sobre Adélio Bispo de Oliveira, autor do atentado contra Jair Bolsonaro, escrevo ao colunista.
Caro Hélio, saúde!
Como seu leitor insistente e assíduo, conquanto discorde de muitas das suas teses, penso merecer leitura recíproca – pelo menos das poucas vezes que sua pena ou teclado me fazem rir para não chorar. E eu resolvi escrever para comentar sua coluna. Você é uma contradição e tanto, amigo.
Escreve contra os crentes sem perceber que tem (muita) fé – invertida, estranha, sui generis, avessadamente constituída de premissas filosóficas rasas (deve ser o parco espaço que o jornal lhe concede, imagino), às vezes desonestas até. Você diz que não crê em Deus por que os que creem não podem provar que Ele existe – se posso resumir sua ojeriza à espiritualidade. Puxa, como alguém tão inteligente não percebe que o ateu também crê – crê que Deus não existe pois igualmente não pode provar matemática e cientificamente sua existência!
Você vive argumentando coisas como a tolice de se achar que possa existir uma única religião verdadeira, ou como um Deus bondoso pode permitir o sofrimento, e sublinha a camisa de força que é o Cristianismo, não é mesmo? Relembra com ardor que a Igreja é responsável por muitas injustiças e que um Deus de amor não condenaria nenhum pobre pecador à danação eterna em um inferno pra lá de dantesco. Isso sem falar na sua insistência irada em tentar provar que a ciência moderna, filha do iluminismo, racionalismo cartesiano desacredita de vez o Cristianismo ou a Religião. Especialmente enxovalha a Bíblia.
Vamos lá – seja intelectualmente honesto, aguente o tranco e leia até o fim.
Como você odeia um ser que não existe? Fico bobo de pensar nisso, como diria um mineiro. Eu também não acredito no Deus que você odeia. Um Deus que manda um pobre diabo esfaquear um candidato polêmico. Eu não acredito num Deus que cabe na palavra “Deus”. Deus não é o nome de Deus, amigo. Use sua lógica cunhada na graduação em filosofia e defina melhor as premissas. Apesar do judaísmo mal-resolvido que o seu sobrenome parece sugerir, o Deus que eu creio se revelou a Moisés como sendo “aquele que é”. É, apesar de crermos ou não nEle. Suspeito que a recíproca não seja verdadeira. (sim, lá vem você com o papo da mitologia, lenda, etecetera. Se você conhece seu parça Freud e discípulo proscrito Jung sabe que mito é coisa séria...religião não é algo irracional, amigo – nenhum animal irracional crê. Conhece algum pelicano Hindu ou Sabiá muçulmano?
Você sabe – é um jornalista sabido, ora – que não há nenhum registro cultural e civilizatório sem marcas da Religião. Como uma “tolice infantil“ sobreviveria no século XXI? Porque a transcendência não morre, apesar do que raivosamente vaticinaram nesse sentido o próprio Freud, Marx e Nietzsche, seus camaradas da hermenêutica da suspeita, como se tornaram conhecidos? Você sabe que tanto o ceticismo quanto a fé continuam crescendo nesses nossos tempos bicudos. Você sabe que “se não há verdade absoluta“ não podemos usar essa proposição como sendo uma. Você sabe que se “tudo é relativo“ o relativismo pode ser relativizado, sô ! São contraditórias mesmo essas certezas da pós-modernidade sobre as incertezas… E, falando em contradições, que doideira essa coisa de “moralidade relativa”. Se a Moralidade é relativa, o que diremos da Justiça?
Amigo, há idiotas que creem e idiotas descrentes. A idiotice não requer fé. Há tanto o fanatismo religioso, claro, e o secular – o que me perturba ainda mais. Quando estudei psicologia, causava-me espécie o ortodoxismo obtuso de alguns professores quanto à psicanálise. Religiosidade psicanalítica. Um cruzado medieval ou terrorista islâmico que matam e morrem por esperanças metafísicas até se espera, mas e o genocídio perpetuado por materialistas históricos? Pensar como você pensa que todo aquele que crê em um Criador Bom e Todo-poderoso é ignóbil, boçal e retardado é tão incorreto quanto achar que todo cientista é honesto, bem-motivado e marcado por excelências de caráter.
Enfim, nobre articulista, examine as suas dúvidas como faço com as minhas. Elas não são nossas inimigas, assim como o pobre coitado que esfaqueou o candidato não era assim tão diferente do mesmo – ambos creem e falam em nome de Deus. A pergunta volta, antes de me despedir com um abraço e votos de vida longa: não seria mesmo uma fraude um Deus que manda assassinar alguém que também se diz seu representante? Concordo contigo. Esse Deus não merece minha devoção. Mas nem você precisa ser advogado do Diabo nem eu de Deus. Se Deus é Deus, ele está no Trono dos tronos. E o caso do Diabo? Transitado e julgado. Como diz o Darth Vader numa cena deliciosa de Star Wars, “acho perturbadora ...a sua falta de fé”. Por que você tem fé – invertida, contrária, negativa mas tem.
Tudo de bom.
Gerson.
Foto: Agressor do deputado Jair Bolsonaro deixa a Polícia Federal em Juiz de Fora após cerca de três horas de interrogatório. (Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil)
À propósito da coluna de Helio Schwartsman na Folha de S. Paulo da última terça-feira, dia11 (Atentado a mando de Deus?), sobre Adélio Bispo de Oliveira, autor do atentado contra Jair Bolsonaro, escrevo ao colunista.
Caro Hélio, saúde!
Como seu leitor insistente e assíduo, conquanto discorde de muitas das suas teses, penso merecer leitura recíproca – pelo menos das poucas vezes que sua pena ou teclado me fazem rir para não chorar. E eu resolvi escrever para comentar sua coluna. Você é uma contradição e tanto, amigo.
Escreve contra os crentes sem perceber que tem (muita) fé – invertida, estranha, sui generis, avessadamente constituída de premissas filosóficas rasas (deve ser o parco espaço que o jornal lhe concede, imagino), às vezes desonestas até. Você diz que não crê em Deus por que os que creem não podem provar que Ele existe – se posso resumir sua ojeriza à espiritualidade. Puxa, como alguém tão inteligente não percebe que o ateu também crê – crê que Deus não existe pois igualmente não pode provar matemática e cientificamente sua existência!
Você vive argumentando coisas como a tolice de se achar que possa existir uma única religião verdadeira, ou como um Deus bondoso pode permitir o sofrimento, e sublinha a camisa de força que é o Cristianismo, não é mesmo? Relembra com ardor que a Igreja é responsável por muitas injustiças e que um Deus de amor não condenaria nenhum pobre pecador à danação eterna em um inferno pra lá de dantesco. Isso sem falar na sua insistência irada em tentar provar que a ciência moderna, filha do iluminismo, racionalismo cartesiano desacredita de vez o Cristianismo ou a Religião. Especialmente enxovalha a Bíblia.
Vamos lá – seja intelectualmente honesto, aguente o tranco e leia até o fim.
Como você odeia um ser que não existe? Fico bobo de pensar nisso, como diria um mineiro. Eu também não acredito no Deus que você odeia. Um Deus que manda um pobre diabo esfaquear um candidato polêmico. Eu não acredito num Deus que cabe na palavra “Deus”. Deus não é o nome de Deus, amigo. Use sua lógica cunhada na graduação em filosofia e defina melhor as premissas. Apesar do judaísmo mal-resolvido que o seu sobrenome parece sugerir, o Deus que eu creio se revelou a Moisés como sendo “aquele que é”. É, apesar de crermos ou não nEle. Suspeito que a recíproca não seja verdadeira. (sim, lá vem você com o papo da mitologia, lenda, etecetera. Se você conhece seu parça Freud e discípulo proscrito Jung sabe que mito é coisa séria...religião não é algo irracional, amigo – nenhum animal irracional crê. Conhece algum pelicano Hindu ou Sabiá muçulmano?
Você sabe – é um jornalista sabido, ora – que não há nenhum registro cultural e civilizatório sem marcas da Religião. Como uma “tolice infantil“ sobreviveria no século XXI? Porque a transcendência não morre, apesar do que raivosamente vaticinaram nesse sentido o próprio Freud, Marx e Nietzsche, seus camaradas da hermenêutica da suspeita, como se tornaram conhecidos? Você sabe que tanto o ceticismo quanto a fé continuam crescendo nesses nossos tempos bicudos. Você sabe que “se não há verdade absoluta“ não podemos usar essa proposição como sendo uma. Você sabe que se “tudo é relativo“ o relativismo pode ser relativizado, sô ! São contraditórias mesmo essas certezas da pós-modernidade sobre as incertezas… E, falando em contradições, que doideira essa coisa de “moralidade relativa”. Se a Moralidade é relativa, o que diremos da Justiça?
Amigo, há idiotas que creem e idiotas descrentes. A idiotice não requer fé. Há tanto o fanatismo religioso, claro, e o secular – o que me perturba ainda mais. Quando estudei psicologia, causava-me espécie o ortodoxismo obtuso de alguns professores quanto à psicanálise. Religiosidade psicanalítica. Um cruzado medieval ou terrorista islâmico que matam e morrem por esperanças metafísicas até se espera, mas e o genocídio perpetuado por materialistas históricos? Pensar como você pensa que todo aquele que crê em um Criador Bom e Todo-poderoso é ignóbil, boçal e retardado é tão incorreto quanto achar que todo cientista é honesto, bem-motivado e marcado por excelências de caráter.
Enfim, nobre articulista, examine as suas dúvidas como faço com as minhas. Elas não são nossas inimigas, assim como o pobre coitado que esfaqueou o candidato não era assim tão diferente do mesmo – ambos creem e falam em nome de Deus. A pergunta volta, antes de me despedir com um abraço e votos de vida longa: não seria mesmo uma fraude um Deus que manda assassinar alguém que também se diz seu representante? Concordo contigo. Esse Deus não merece minha devoção. Mas nem você precisa ser advogado do Diabo nem eu de Deus. Se Deus é Deus, ele está no Trono dos tronos. E o caso do Diabo? Transitado e julgado. Como diz o Darth Vader numa cena deliciosa de Star Wars, “acho perturbadora ...a sua falta de fé”. Por que você tem fé – invertida, contrária, negativa mas tem.
Tudo de bom.
Gerson.
Foto: Agressor do deputado Jair Bolsonaro deixa a Polícia Federal em Juiz de Fora após cerca de três horas de interrogatório. (Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil)
Gerson Borges, casado com Rosana Márcia e pai de Bernardo e Pablo, pastoreia a Comunidade de Jesus no ABCD Paulista. É autor de Ser Evangélico sem Deixar de Ser Brasileiro, cantor, compositor e escritor, licenciado em letras e graduando em psicologia.
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