Opinião
- 18 de julho de 2012
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Apologética pura e simples
Eu sei, o título é pretensioso, evoca o clássico do guru C. S. Lewis, mas bateu aquela vontade de homenageá-lo nesse exercício que traz mais perguntas que respostas. Algo que o autor do mundo de Nárnia fazia como ninguém. Vamos às perguntas?
O que seria a apologética, em especial com relação à Palavra de Deus? Do que exatamente estamos falando quando usamos essa palavra?
Na história da igreja cristã já vimos diferentes aproximações à pergunta sobre como alguém chega a crer. Houve aqueles que defenderam que é necessário “compreender para crer”, outros que defenderam o paradigma de que é preciso “crer para entender”, e movimentos mais contemporâneos que defendem que é preciso “pertencer para crer”, em uma alusão à importância do sentir-se parte de uma comunidade no caminho da fé, antes mesmo de abraçá-la.
Quem tem a razão? Possivelmente cada uma das abordagens traz suas verdades, suas fortalezas, mas também suas debilidades. Assim talvez o melhor caminho seja a sensibilidade para entender que há diferentes pessoas, diferentes gerações e culturas, reconhecendo que as rotas que traçamos nos mapas da apologética podem ser variadas.
Bem, havendo usado a palavra apologética já três vezes nesse texto (ops, quatro…) digamos que ela merece uma tentativa de definição. Aqui vai uma comumente usada:
Apologética é a ciência da defesa da fé. Tudo bem, reconheço que a palavra “ciência” aí atrás já condiciona o conceito, como se o mais importante fosse o método científico, razoável, plausível, de apresentar a fé. E, claro, a outra palavrinha, “defesa”, nos complica mais ainda. Ela nos põe na defensiva, como aquela criança pega no pulo e que tenta se explicar. Se defesa nos transmite a ideia de que a fé é culpada de algo e tem que se justificar, então busquemos outra definição.
O tal do Lewis costumava fazer algo que era bacana. Ele dizia que uma coisa não era outra coisa, ou que não era um conjunto de outras coisas, só para no final dizer então do que em verdade se tratava essa coisa. Captou?
Por exemplo, apologética não é evangelismo, porque evangelizar é compartilhar uma boa notícia, com conteúdo, começo, meio e fim, apresentar e propor uma mensagem, de preferência dessas que explicam tudo, ou quase tudo, o que alguns chamam de metanarrativa. Bem, não se complique muito com essa última palavra.
Mas se você gostou, anote aí, apologética também não é metanarrativa, porque não procura dar uma explicação ampla sobre todas as coisas, como se fosse algo definitivo, acabado, com todas as respostas. Seria ambição demais para ela, lembre-se, ela deve ser “pura e simples”.
Apologética também não é confrontação, ameaça, nem argumentos para ganhar discussão. Tampouco é tergiversar, que é aquele negócio de distorcer o que o outro acredita só para parecer mais ridículo e assim desacreditar mais facilmente a posição do outro.
Se não é isso ou aquilo, o que seria? Aqui segue uma simples aproximação: apologética é limpar o caminho, sacar os obstáculos, lavar as lentes dos óculos, tirar a cera do ouvido, remover os preconceitos e convidar a um encontro honesto e genuíno.
Para o propósito específico desse artigo, que é o da apologética relacionada à Palavra de Deus, sugiro alguns passos para que ela seja saudável, pura e simples:
1. Escutar – Quais são as percepções que as pessoas têm a respeito dos textos das Escrituras? Antes de propor algo, busque sondar o que creem, se creem em algo, como creem. Veja se já leram algo, como leram, com que lentes. Que perguntas elas tem? Essa será uma importante etapa para chegar ao próximo passo.
2. Fazer perguntas – Comece com as perguntas que as pessoas, em especial seus amigos não cristãos, fazem ao texto. Às vezes são questões que os impedem de chegar ao texto, outras vezes são perguntas que levantam quando leem o texto. Que elas venham! Se forem prévias ao texto, por exemplo ao não acreditar nas intenções de quem escreveu, busque devolver as perguntas, com sensibilidade e respeito. Por quê? Seria mesmo tudo montado? Como você vê o texto? Certa vez recordo que um amigo da universidade disse que havia muita coisa “inventada”, “adicionada”. Eu lhe perguntei “quanto por cento?”. Depois de me olhar meio estranho, disse “sei lá, pelo menos uns 30% deve ser adição feita tempos depois”. Devolvi, “estou satisfeito com 70%, vamos ler juntos?”. Aí há um ponto de partida, um começo, que é onde a pessoa está e não onde eu gostaria que ela estivesse.
3. Construir pontes – A razão tem lugar? É razoável supor que sim. A emoção também? Intuo que esta também tenha o seu lugar. E se há objeções pessoais, morais, da história de vida de alguém que a impede ou de chegar à Palavra ou de aplicar em sua vida uma verdade aí descoberta? É preciso saber construir essas pontes, limpar o caminho, ajudar a que se deem esses encontros pessoais, no estilo de cada um, com a Palavra e o Espírito que a inspirou. Nossas opiniões, interpretações ou pregações não substituem a beleza e o poder desse encontro pessoal de cada um com o Senhor através da Palavra.
4. Construir relações – Aprendi desde cedo na ABU (Aliança Bíblica Universitária) que a Palavra também se lê e se entende em comunidade, que não é algo acessível só aos eruditos. Que ela também se lê em relação aos contextos (de quando foi escrita e os de agora), em um processo onde a realidade traz perguntas à Palavra e por sua vez as Escrituras também desafiam a realidade. É um ir e vir dinâmico, onde a comunidade é essencial porque vamos entendendo e obedecendo juntos. Apologética relacionada à Palavra é também “ler junto com” o outro.
5. Deixar a Palavra falar – Um grande perigo é achar que já sabe o que a Palavra irá dizer sobre qualquer assunto. O alerta serve para crentes e não crentes. Como saber se estou caindo nessa armadilha? Um bom indicativo é checar se você sempre está buscando no texto os argumentos que reforçam aquela sua posição já consolidada sobre algum tema. E um bom sinal positivo é se você fica encucado com um texto, se ele te desafia, se te provoca a pensar mais, a orar mais, a ver junto com outros na comunidade se é necessário rever uma postura que talvez seja mais fruto da tradição do que uma desafiadora verdade descoberta na Palavra.
Cinco sugestões sem muitos devaneios e argumentações que espero nos ajudem a entender os caminhos dessa tal apologética pura e simples.
Nota:
Artigo originalmente publicado no boletim Entre Nós da ABU.
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É casado com Ruth e pai de Ana Júlia e Carolina. Integra o corpo pastoral da Igreja Metodista Livre da Saúde, em São Paulo (SP), serve globalmente como secretário adjunto para o engajamento com as Escrituras na IFES (International Fellowship of Evangelical Students) e também apoia a equipe da IFES América Latina.
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