Opinião
- 22 de agosto de 2024
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Afastando as trevas: Promovendo o avanço do reino de Deus em nosso trabalho
Fundamentos sobre “O impacto do reino em cada esfera da sociedade”
Por Vinoth Ramachandra
Jesus começou seu ministério público na Galileia com estas palavras: “O tempo é chegado”, dizia ele. “O Reino de Deus está próximo. Arrependam-se e creiam nas boas novas!”(Mc 1.15). Ele faz mais referências ao “reino de Deus” do que a qualquer outro tema. Nos Evangelhos sinóticos, Mateus, Marcos e Lucas, essa expressão aparece 104 vezes. Se compararmos com expressões semelhantes, por exemplo, Jesus fala em “fé” ou “crer” apenas 70 vezes, “amor” 36 vezes e “Espírito Santo”, 35 vezes. Todos os evangelistas, portanto, concordam que o tema do reino de Deus constituía o cerne da pregação de Jesus.
O conceito não foi inventado por Jesus. Já está presente no Antigo Testamento. Jesus está partindo de uma premissa da antiga expectativa de seu povo de que Deus um dia estabeleceria seu governo libertador na terra. Se esquecermos a herança judaica de Jesus e o contexto cultural em que viveu, erraremos em nossa interpretação da sua mensagem.
No cerne do ministério de Jesus há um vigoroso desafio aos poderes das trevas, seja por meio das enfermidades que afligem o corpo, os demônios que atormentam a mente, a culpa e as indignidades que subjugam as pessoas, seja pela idolatria e a hipocrisia que destroem a harmonia dos homens. O desafio de Jesus aos poderes das trevas, no entanto, foi apresentado num momento de total vulnerabilidade, que o levou à agonia no Getsêmani e ao abandono de Deus no Gólgota.
Ao abraçar voluntariamente a vergonha e a humilhação da cruz, Jesus demonstrou a amorosa solidariedade de Deus para com todos os que sofrem brutalmente nas mãos de outras pessoas. É certo que ele morreu em solidariedade a todos os pecadores, fossem estes algozes, espectadores ou vítimas. Mas não devemos esquecer que ele foi vítima de um sistema político, alvo de uma acusação política. Sua solidariedade generalizada fez dele uma vítima específica, a quem o sofrimento foi infligido por outros. Por ter sido também uma vítima, o seu perdão se estende aos que apoiam o sistema. Estes últimos, contudo, só podem receber esse perdão quando estiverem dispostos a dar meia-volta (“arrepender-se”) da sua cumplicidade com estruturas que negam a Deus.
Aqueles que seguem Jesus são chamados a se identificar com os que estão “na parte inferior” dos nossos sistemas sociais e políticos, e a abraçar um sofrimento que talvez não seja diretamente seu. Isso envolveria aprender a ver o mundo a partir da perspectiva do outro, rejeitando assim os pontos de vista confortáveis daqueles que se beneficiam da presente ordem mundial.
O manifesto do reino
O Sermão do Monte, em Mateus 5–7, é o manifesto do reino de Jesus. Explica como é a cidadania no reino de Deus; marca o nascimento dessa nova ordem mundial. Começa listando oito elementos (5.3-12) que descrevem o caráter daqueles que pertencem ao reino de Jesus, aqueles para os quais a sua vinda é de fato “boas novas”.
Em primeiro lugar, eles são “pobres em espírito” (v.3) — que não têm controle sobre as coisas, incluindo suas próprias vidas, mas são fracos e totalmente dependentes de Deus; em segundo lugar, eles “choram” (v.4) – por seus próprios pecados e pelo sofrimento e pecados das pessoas que os cercam; em terceiro lugar, eles são “humildes” (v.5) – não de forma covarde e servil, mas são aqueles cujas ambições não estão centradas em si mesmos; eles não se colocam sob os holofotes, mas renunciam às posições de honra e privilégio; em quarto lugar, eles têm “fome e sede de justiça” (v.6) – os discípulos são conhecidos como pessoas que têm paixão pela justiça de Deus, que anseiam pela vindicação de Deus sobre os oprimidos; em quinto lugar, eles associam a fome de justiça, que por si só pode tornar as pessoas duras e até hipócritas, com a capacidade de demonstrar misericórdia (v.7) tanto para com as vítimas como para com os perpetradores da injustiça; em sexto lugar, eles são “puros de coração” (v.8) – indicando uma motivação única e absoluta lealdade de coração; em sétimo lugar, eles imitam a Deus sendo “pacificadores” (v.9) – tomam a iniciativa de mediar situações de conflito e violência, seja em famílias, cidades ou nações, para construir pontes e restaurar relações entre inimigos; e, finalmente, os discípulos são perseguidos – tanto por causa da justiça como por seu testemunho fiel de Jesus (v.10,11).
Jesus continua prevendo o impacto que seus discípulos teriam na sociedade. Ele usa duas metáforas, uma negativa e outra positiva. Pela perspectiva negativa, eles serão como o sal (v.13) que, quando aplicado na carne ou no peixe, interrompe a decomposição bacteriana. Da mesma forma, os discípulos, quando integrados nas suas sociedades e vivendo de sua forma singular, impedirão a decadência moral e espiritual dessas sociedades. Pela perspectiva positiva, eles serão como a luz (v.14), expondo e dissipando as áreas obscuras dos negócios, dos governos e de outras instituições da sua nação. Observe que não é por sua pregação, mas por suas “boas obras” – as obras de justiça, misericórdia e pacificação – que os discípulos atraem outros céticos a se voltarem e “glorificarem ao Pai” (v.16).
A igreja, portanto, é chamada a viver como um sinal, uma prévia e um instrumento do reino de Deus, que é uma realidade simultaneamente presente e futura. Não podemos edificar nem trazer o reino de Deus [à terra]. Podemos dar testemunho dele.
Testemunhando o caminho de Jesus
Sendo assim, o caminho de Jesus é o caminho que ele chama sua igreja a seguir. E não é isolar-se do mundo e refugiar-se em um santuário religioso, nem se envolver com o mundo nos termos do próprio mundo. É unicamente um desafio intrépido, porém vulnerável, aos poderes que controlam a atual ordem mundial, mas em nome do reino de Deus manifesto na pessoa do Cristo crucificado e ressurreto. Ao participar do caminho contracultural de Jesus, incluindo seu sofrimento, a igreja se torna estandarte da vida ressurreta de Jesus para benefício do mundo.
Esse tipo de pensamento está muito distante dos parâmetros de “progresso” missionário e das estratégias de crescimento da igreja que abundam hoje nos círculos evangélicos ocidentais. A missão cristã não é uma “história de sucesso” em curso segundo a perspectiva que o mundo tem de “sucesso”.
A principal forma pela qual a igreja impacta o mundo não é por meio de seus programas evangelísticos ou sociais, ou pela multiplicação de profissionais religiosos ou de organizações missionárias; mas por meio do caráter e testemunho cristão de homens e mulheres que trabalham diariamente em escritórios, escolas, fábricas, câmaras municipais, laboratórios de pesquisa, salas de reuniões corporativas e assim por diante. São estes os locais da missão cristã contemporânea.
Lembro-me de uma reunião em um país asiático, com alguns políticos cristãos íntegros que representavam diferentes partidos políticos da oposição naquele país de maioria muçulmana. Eles vinham de uma variedade de tradições eclesiásticas, incluindo católica romana e pentecostal. Perguntei: “Qual é sua maior fonte de frustração no trabalho?”. Eu esperava ouvir algo como: “As concessões que precisamos de fazer como membros do partido”, mas em vez disso a resposta foi unânime: “A nossa igreja”. Eles não recebiam qualquer apoio de suas igrejas, quer fosse por meio de orações regulares, assistência financeira ou voluntários para ajudar na implementação de políticas sociais ou apenas para administrar seus escritórios. Uma mulher, membro do parlamento, disse-me que a sua igreja havia captado uma grande soma em recursos para enviar missionários transculturais e jovens em “viagens missionárias” de curta duração a outras partes da Ásia. No entanto, o seu trabalho na política não era considerado “missão”. A única vez em que os líderes da igreja haviam demonstrado algum interesse no que essas pessoas faziam foi quando os próprios cristãos sofreram assédio político e os líderes pediram que falassem em nome deles no parlamento. Histórias assim se repetem em todo o mundo.
Tenho trabalhado principalmente com cristãos que têm empregos seculares, ajudando-os a viver o evangelho e a comunicar a verdade e a justiça de Deus nos campos da ciência, dos negócios, das artes, da medicina, da educação e outros. Esses homens e mulheres que se envolvem de forma “cristã” na esfera pública estão na vanguarda da obra missionária. Enfrentam enormes desafios éticos que emergem, por exemplo, nas questões de novas tecnologias médicas, novos meios de comunicação social, culturas geneticamente modificadas, estratégias de investimento [hedge funds], contratos negociados em bolsa de futuros, leis antiterrorismo, mudanças climáticas e perda de biodiversidade. Tudo isso exige maior envolvimento missionário e reflexão missiológica.
Vejamos o caso de Rocio Parra, uma advogada acadêmica no Chile que, inspirada por sua convicção cristã de cuidar da criação, está tentando incorporar os mares e o oceano no conceito tradicional de “território” e assim garantir a proteção ambiental na nova constituição do seu país.
A República Democrática do Congo tem sido dilacerada pela guerra que se estende há mais de duas décadas, envolvendo chefes militares locais rivais e empresas multinacionais que exploram as ricas reservas minerais do país. O estupro em massa tem sido uma arma usada nessa guerra. Denis Mukwege é um ginecologista cristão que desenvolveu um sistema escalonado de cuidados para essas mulheres – associando atendimento e assistência psicológica, ajudando-as a desenvolver competências para o mercado de trabalho e oferecendo o suporte jurídico para que elas possam levar seus agressores ao tribunal. Mukwege recebeu o Prêmio Nobel da Paz em 2013.1 A maioria de nós não terá, nesta vida, o reconhecimento pelo trabalho realizado para o reino. É possível que o impacto a longo prazo do nosso trabalho seja revelado somente no Dia do Juízo Final. Muitas vezes enfrentaremos oposição, desânimo ou um profundo sentimento de fracasso. No entanto, não fomos chamados ao sucesso, mas à fidelidade.
Artigo publicado originalmente no site do Movimento Lausanne. Reproduzido com permissão.
REVISTA ULTIMATO | PARA QUE SERVE A TEOLOGIA?
A resposta à pergunta “Para que serve a teologia?” revela que ela serve a Deus, exaltando-o como Senhor. Serve a igreja, ajudando-a a conhecer e a adorar seu Deus. Serve o mundo, revelando a verdadeira fonte de sabedoria, beleza, sentido e salvação.
A teologia é resultado de esforço acadêmico e também do convívio singular entre cristãos; envolve profundo estudo, mas também ocorre na singela e comprometida leitura das Escrituras. Depende do Espírito, por isso implica humildade. Ajuda a conhecer a Deus e a amá-lo.
É disso que trata a matéria de capa da edição 408 da revista Ultimato. Para assinar, clique aqui.
Saiba mais:
» O Evangelho em uma Sociedade Pluralista, Lessline Newbigin
» Lendo o Sermão do Monte com John Stott, John Stott
» A Grande História – Um Convite para Professores Cristãos, Rick Hove, Heather Holleman
Por Vinoth Ramachandra
Jesus começou seu ministério público na Galileia com estas palavras: “O tempo é chegado”, dizia ele. “O Reino de Deus está próximo. Arrependam-se e creiam nas boas novas!”(Mc 1.15). Ele faz mais referências ao “reino de Deus” do que a qualquer outro tema. Nos Evangelhos sinóticos, Mateus, Marcos e Lucas, essa expressão aparece 104 vezes. Se compararmos com expressões semelhantes, por exemplo, Jesus fala em “fé” ou “crer” apenas 70 vezes, “amor” 36 vezes e “Espírito Santo”, 35 vezes. Todos os evangelistas, portanto, concordam que o tema do reino de Deus constituía o cerne da pregação de Jesus.
O conceito não foi inventado por Jesus. Já está presente no Antigo Testamento. Jesus está partindo de uma premissa da antiga expectativa de seu povo de que Deus um dia estabeleceria seu governo libertador na terra. Se esquecermos a herança judaica de Jesus e o contexto cultural em que viveu, erraremos em nossa interpretação da sua mensagem.
No cerne do ministério de Jesus há um vigoroso desafio aos poderes das trevas, seja por meio das enfermidades que afligem o corpo, os demônios que atormentam a mente, a culpa e as indignidades que subjugam as pessoas, seja pela idolatria e a hipocrisia que destroem a harmonia dos homens. O desafio de Jesus aos poderes das trevas, no entanto, foi apresentado num momento de total vulnerabilidade, que o levou à agonia no Getsêmani e ao abandono de Deus no Gólgota.
Ao abraçar voluntariamente a vergonha e a humilhação da cruz, Jesus demonstrou a amorosa solidariedade de Deus para com todos os que sofrem brutalmente nas mãos de outras pessoas. É certo que ele morreu em solidariedade a todos os pecadores, fossem estes algozes, espectadores ou vítimas. Mas não devemos esquecer que ele foi vítima de um sistema político, alvo de uma acusação política. Sua solidariedade generalizada fez dele uma vítima específica, a quem o sofrimento foi infligido por outros. Por ter sido também uma vítima, o seu perdão se estende aos que apoiam o sistema. Estes últimos, contudo, só podem receber esse perdão quando estiverem dispostos a dar meia-volta (“arrepender-se”) da sua cumplicidade com estruturas que negam a Deus.
Aqueles que seguem Jesus são chamados a se identificar com os que estão “na parte inferior” dos nossos sistemas sociais e políticos, e a abraçar um sofrimento que talvez não seja diretamente seu. Isso envolveria aprender a ver o mundo a partir da perspectiva do outro, rejeitando assim os pontos de vista confortáveis daqueles que se beneficiam da presente ordem mundial.
O manifesto do reino
O Sermão do Monte, em Mateus 5–7, é o manifesto do reino de Jesus. Explica como é a cidadania no reino de Deus; marca o nascimento dessa nova ordem mundial. Começa listando oito elementos (5.3-12) que descrevem o caráter daqueles que pertencem ao reino de Jesus, aqueles para os quais a sua vinda é de fato “boas novas”.
Em primeiro lugar, eles são “pobres em espírito” (v.3) — que não têm controle sobre as coisas, incluindo suas próprias vidas, mas são fracos e totalmente dependentes de Deus; em segundo lugar, eles “choram” (v.4) – por seus próprios pecados e pelo sofrimento e pecados das pessoas que os cercam; em terceiro lugar, eles são “humildes” (v.5) – não de forma covarde e servil, mas são aqueles cujas ambições não estão centradas em si mesmos; eles não se colocam sob os holofotes, mas renunciam às posições de honra e privilégio; em quarto lugar, eles têm “fome e sede de justiça” (v.6) – os discípulos são conhecidos como pessoas que têm paixão pela justiça de Deus, que anseiam pela vindicação de Deus sobre os oprimidos; em quinto lugar, eles associam a fome de justiça, que por si só pode tornar as pessoas duras e até hipócritas, com a capacidade de demonstrar misericórdia (v.7) tanto para com as vítimas como para com os perpetradores da injustiça; em sexto lugar, eles são “puros de coração” (v.8) – indicando uma motivação única e absoluta lealdade de coração; em sétimo lugar, eles imitam a Deus sendo “pacificadores” (v.9) – tomam a iniciativa de mediar situações de conflito e violência, seja em famílias, cidades ou nações, para construir pontes e restaurar relações entre inimigos; e, finalmente, os discípulos são perseguidos – tanto por causa da justiça como por seu testemunho fiel de Jesus (v.10,11).
Jesus continua prevendo o impacto que seus discípulos teriam na sociedade. Ele usa duas metáforas, uma negativa e outra positiva. Pela perspectiva negativa, eles serão como o sal (v.13) que, quando aplicado na carne ou no peixe, interrompe a decomposição bacteriana. Da mesma forma, os discípulos, quando integrados nas suas sociedades e vivendo de sua forma singular, impedirão a decadência moral e espiritual dessas sociedades. Pela perspectiva positiva, eles serão como a luz (v.14), expondo e dissipando as áreas obscuras dos negócios, dos governos e de outras instituições da sua nação. Observe que não é por sua pregação, mas por suas “boas obras” – as obras de justiça, misericórdia e pacificação – que os discípulos atraem outros céticos a se voltarem e “glorificarem ao Pai” (v.16).
A igreja, portanto, é chamada a viver como um sinal, uma prévia e um instrumento do reino de Deus, que é uma realidade simultaneamente presente e futura. Não podemos edificar nem trazer o reino de Deus [à terra]. Podemos dar testemunho dele.
Testemunhando o caminho de Jesus
Sendo assim, o caminho de Jesus é o caminho que ele chama sua igreja a seguir. E não é isolar-se do mundo e refugiar-se em um santuário religioso, nem se envolver com o mundo nos termos do próprio mundo. É unicamente um desafio intrépido, porém vulnerável, aos poderes que controlam a atual ordem mundial, mas em nome do reino de Deus manifesto na pessoa do Cristo crucificado e ressurreto. Ao participar do caminho contracultural de Jesus, incluindo seu sofrimento, a igreja se torna estandarte da vida ressurreta de Jesus para benefício do mundo.
Esse tipo de pensamento está muito distante dos parâmetros de “progresso” missionário e das estratégias de crescimento da igreja que abundam hoje nos círculos evangélicos ocidentais. A missão cristã não é uma “história de sucesso” em curso segundo a perspectiva que o mundo tem de “sucesso”.
A principal forma pela qual a igreja impacta o mundo não é por meio de seus programas evangelísticos ou sociais, ou pela multiplicação de profissionais religiosos ou de organizações missionárias; mas por meio do caráter e testemunho cristão de homens e mulheres que trabalham diariamente em escritórios, escolas, fábricas, câmaras municipais, laboratórios de pesquisa, salas de reuniões corporativas e assim por diante. São estes os locais da missão cristã contemporânea.
Lembro-me de uma reunião em um país asiático, com alguns políticos cristãos íntegros que representavam diferentes partidos políticos da oposição naquele país de maioria muçulmana. Eles vinham de uma variedade de tradições eclesiásticas, incluindo católica romana e pentecostal. Perguntei: “Qual é sua maior fonte de frustração no trabalho?”. Eu esperava ouvir algo como: “As concessões que precisamos de fazer como membros do partido”, mas em vez disso a resposta foi unânime: “A nossa igreja”. Eles não recebiam qualquer apoio de suas igrejas, quer fosse por meio de orações regulares, assistência financeira ou voluntários para ajudar na implementação de políticas sociais ou apenas para administrar seus escritórios. Uma mulher, membro do parlamento, disse-me que a sua igreja havia captado uma grande soma em recursos para enviar missionários transculturais e jovens em “viagens missionárias” de curta duração a outras partes da Ásia. No entanto, o seu trabalho na política não era considerado “missão”. A única vez em que os líderes da igreja haviam demonstrado algum interesse no que essas pessoas faziam foi quando os próprios cristãos sofreram assédio político e os líderes pediram que falassem em nome deles no parlamento. Histórias assim se repetem em todo o mundo.
Tenho trabalhado principalmente com cristãos que têm empregos seculares, ajudando-os a viver o evangelho e a comunicar a verdade e a justiça de Deus nos campos da ciência, dos negócios, das artes, da medicina, da educação e outros. Esses homens e mulheres que se envolvem de forma “cristã” na esfera pública estão na vanguarda da obra missionária. Enfrentam enormes desafios éticos que emergem, por exemplo, nas questões de novas tecnologias médicas, novos meios de comunicação social, culturas geneticamente modificadas, estratégias de investimento [hedge funds], contratos negociados em bolsa de futuros, leis antiterrorismo, mudanças climáticas e perda de biodiversidade. Tudo isso exige maior envolvimento missionário e reflexão missiológica.
Vejamos o caso de Rocio Parra, uma advogada acadêmica no Chile que, inspirada por sua convicção cristã de cuidar da criação, está tentando incorporar os mares e o oceano no conceito tradicional de “território” e assim garantir a proteção ambiental na nova constituição do seu país.
A República Democrática do Congo tem sido dilacerada pela guerra que se estende há mais de duas décadas, envolvendo chefes militares locais rivais e empresas multinacionais que exploram as ricas reservas minerais do país. O estupro em massa tem sido uma arma usada nessa guerra. Denis Mukwege é um ginecologista cristão que desenvolveu um sistema escalonado de cuidados para essas mulheres – associando atendimento e assistência psicológica, ajudando-as a desenvolver competências para o mercado de trabalho e oferecendo o suporte jurídico para que elas possam levar seus agressores ao tribunal. Mukwege recebeu o Prêmio Nobel da Paz em 2013.1 A maioria de nós não terá, nesta vida, o reconhecimento pelo trabalho realizado para o reino. É possível que o impacto a longo prazo do nosso trabalho seja revelado somente no Dia do Juízo Final. Muitas vezes enfrentaremos oposição, desânimo ou um profundo sentimento de fracasso. No entanto, não fomos chamados ao sucesso, mas à fidelidade.
- Vinoth Ramachandra vive no Sri Lanka. Por mais de quatro décadas, serviu em vários cargos de liderança na Comunidade Internacional de Estudantes Evangélicos – uma rede global de mais de 165 ministérios independentes em universidades federais.É autor de vários ensaios, artigos e livros que relacionam a teologia cristã com os vários desafios sociais, políticos e ideológicos que os cristãos enfrentam em vários contextos nacionais. Ramachandra também atuou no Faraday Institute of Science & Religion (Reino Unido), no Oxford Centre for Mission Studies, na rede de conservação ambiental A Rocha e na Micah Global.
Artigo publicado originalmente no site do Movimento Lausanne. Reproduzido com permissão.
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A resposta à pergunta “Para que serve a teologia?” revela que ela serve a Deus, exaltando-o como Senhor. Serve a igreja, ajudando-a a conhecer e a adorar seu Deus. Serve o mundo, revelando a verdadeira fonte de sabedoria, beleza, sentido e salvação.
A teologia é resultado de esforço acadêmico e também do convívio singular entre cristãos; envolve profundo estudo, mas também ocorre na singela e comprometida leitura das Escrituras. Depende do Espírito, por isso implica humildade. Ajuda a conhecer a Deus e a amá-lo.
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