Opinião
- 18 de fevereiro de 2010
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Acima da lei
Marcos Inhauser
Não é de hoje que tenho visto religiosos folgados. Lembro-me de que uma vez, em um restaurante rodízio em Limeira em companhia de alguns estrangeiros, vi parar uma van com vidros fume e ar condicionado e descer alguém que veio falar com o dono do restaurante. Em seguida abriu-se a porta lateral e vi que estavam com a televisão ligada e um religioso, em trajes religiosos, entrou para também conversar com o dono. Depois de um tempo eles se foram. Perguntei mais tarde ao dono o que eles queriam e ele me contou que alegavam ser religiosos de uma irmandade que fez voto de pobreza e que queriam comer um rodízio, mas queriam que isto fosse uma oferta da casa.
A cada pouco vejo na mídia reclamações de vizinhos de determinadas igrejas, sejam elas “evangélicas ou católicas”, falando do barulho que fazem, mesmo depois das dez da noite. Cansei de ouvir pastor dizer que estão querendo impedir o culto ao tentarem silenciar as igrejas. A lei do PSIU (Programa Silêncio Urbano) em São Paulo caiu por pressão da bancada evangélica. Para estes, as igrejas estão acima da lei.
Há alguns dias fomos noticiados que um grupo de dez membros de uma igreja batista estava saindo do Haiti com um ônibus cheio de crianças, sem que houvesse qualquer autorização legal para fazê-lo, em um ato mais próximo do sequestro que da solidariedade. Dando a eles o benefício da dúvida, no mínimo foram imprudentes ao tentarem ajudar, passando por cima das autoridades e do mínimo de organização que ainda existe no país.
Se o fizeram de boa fé, é porque acreditavam que a ação era eticamente aceitável e acima de qualquer lei ou procedimento. E, acima de tudo, se era uma igreja, por meio de dez dos seus membros, que estava promovendo a ação solidária, quem poderia impedir tal gesto de amor?
Conheço a República Dominicana, conheço a fronteira com o Haiti e, acima de tudo, conheço o drama dos haitianos ilegais, o que já mereceu comentários em uma de minhas colunas (“Sem poder ficar, nem sair”). Não imagino que a situação deles seria muito diferente na vizinha república.
Por outro lado, por se tratar de uma igreja fundamentalista dos Estados Unidos, não me estranharia se houvesse um sentido messiânico nesta empreitada. Estavam resgatando crianças das garras do demônio do vudu, prática amplamente aceita no Haiti. E para isto, a guerra não era contra carne e sangue, mas contra principados e potestades celestiais. Pena que autoridades de carne e osso foram as que pararam a cruzada missionária, por desobedecerem leis ordinárias de uma nação em frangalhos. Não havia nada espiritual para impedi-los, e sim leis que deviam ser observadas.
• Marcos Inhauser é pastor, presidente da Igreja da Irmandade e colunista do jornal Correio Popular. www.inhauser.com.br / marcos@inhauser.com.br
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Não é de hoje que tenho visto religiosos folgados. Lembro-me de que uma vez, em um restaurante rodízio em Limeira em companhia de alguns estrangeiros, vi parar uma van com vidros fume e ar condicionado e descer alguém que veio falar com o dono do restaurante. Em seguida abriu-se a porta lateral e vi que estavam com a televisão ligada e um religioso, em trajes religiosos, entrou para também conversar com o dono. Depois de um tempo eles se foram. Perguntei mais tarde ao dono o que eles queriam e ele me contou que alegavam ser religiosos de uma irmandade que fez voto de pobreza e que queriam comer um rodízio, mas queriam que isto fosse uma oferta da casa.
A cada pouco vejo na mídia reclamações de vizinhos de determinadas igrejas, sejam elas “evangélicas ou católicas”, falando do barulho que fazem, mesmo depois das dez da noite. Cansei de ouvir pastor dizer que estão querendo impedir o culto ao tentarem silenciar as igrejas. A lei do PSIU (Programa Silêncio Urbano) em São Paulo caiu por pressão da bancada evangélica. Para estes, as igrejas estão acima da lei.
Há alguns dias fomos noticiados que um grupo de dez membros de uma igreja batista estava saindo do Haiti com um ônibus cheio de crianças, sem que houvesse qualquer autorização legal para fazê-lo, em um ato mais próximo do sequestro que da solidariedade. Dando a eles o benefício da dúvida, no mínimo foram imprudentes ao tentarem ajudar, passando por cima das autoridades e do mínimo de organização que ainda existe no país.
Se o fizeram de boa fé, é porque acreditavam que a ação era eticamente aceitável e acima de qualquer lei ou procedimento. E, acima de tudo, se era uma igreja, por meio de dez dos seus membros, que estava promovendo a ação solidária, quem poderia impedir tal gesto de amor?
Conheço a República Dominicana, conheço a fronteira com o Haiti e, acima de tudo, conheço o drama dos haitianos ilegais, o que já mereceu comentários em uma de minhas colunas (“Sem poder ficar, nem sair”). Não imagino que a situação deles seria muito diferente na vizinha república.
Por outro lado, por se tratar de uma igreja fundamentalista dos Estados Unidos, não me estranharia se houvesse um sentido messiânico nesta empreitada. Estavam resgatando crianças das garras do demônio do vudu, prática amplamente aceita no Haiti. E para isto, a guerra não era contra carne e sangue, mas contra principados e potestades celestiais. Pena que autoridades de carne e osso foram as que pararam a cruzada missionária, por desobedecerem leis ordinárias de uma nação em frangalhos. Não havia nada espiritual para impedi-los, e sim leis que deviam ser observadas.
• Marcos Inhauser é pastor, presidente da Igreja da Irmandade e colunista do jornal Correio Popular. www.inhauser.com.br / marcos@inhauser.com.br
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