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Opinião

A teologia é inútil. Não serve para nada

Resenha
Por Oswaldo Prado

Quando estava por concluir a leitura do livro Para Que Serve a Teologia?, deparei-me com uma frase do Dr. John Mackay, teólogo, que serviu como missionário no Peru no início do século 20, e que foi chamado de “um escocês de alma latina”:
“A teologia pertence ao caminho, não à varanda.”

Essa afirmação, de certa forma, resume em boa parte, o conteúdo do fantástico livro de Alister McGrath.

Não é surpresa que, mais uma vez, McGrath consiga nos presentear com um texto que consegue conjugar muito bem a linguagem acadêmica com o nosso cotidiano.

Conhecido por seu envolvimento com a ciência e a fé cristã, esse ex-ateu, com doutorado em teologia, pós-doutorado em biofísica molecular tem oferecido em seus escritos e palestras o que é chamado de teologia científica.

Esse lançamento, ao contrário de muitos outros, chega em nossas mãos praticamente junto com sua edição original “What’s the Point of Theology”, publicado em 2022.

Ao longo do texto, o autor cita inúmeros teólogos e filósofos, mas percebe-se claramente a forte influência de C. S. Lewis, que foi quem o levou a abraçar o cristianismo, por meio do ensaio Teologia é poesia, apresentado por Lewis, em 1944, na Universidade de Oxford e que, entre outras coisas, afirmava:
“A teologia cristã pode acomodar a ciência, a arte, a moralidade, e as religiões não-cristãs. A perspectiva da ciência não é capaz de acomodar nenhuma dessas coisas, nem mesmo a própria ciência. Creio no cristianismo assim como creio que o sol nasceu, não apenas porque o vejo, mas porque por meio dele eu vejo tudo mais”.

Sabiamente, o autor posiciona-se diante de um fato inquestionável: a constante e estranha dicotomia que boa parte dos cristãos fazem entre a teologia e fé cristã.

Ele afirma que, ao conhecer o cristianismo, nunca havia ouvido falar da teologia. Isso só veio a acontecer anos depois, quando já estava para se graduar na Universidade de Oxford.

Mesmo assim, ficava claro para ele que a teologia era um campo sem qualquer utilidade prática para aqueles que se diziam religiosos.

Na verdade, essa é uma história que conhecemos bem, e que, infelizmente, nos acompanha até hoje.

Corajosamente, ele inicia esse livro fazendo uma afirmação categórica que servirá de balizamento para seus argumentos posteriores:
“A teologia é inútil. Não serve para nada. Os ministérios práticos são o que realmente importa. Por que perder tempo ensinando os futuros líderes cristãos sobre teologia quando eles poderiam, em vez disso, alimentar-se com as mais recentes teorias acerca de crescimento da Igreja, gestão eclesiástica e habilidades de aconselhamento?”.

Nada mais claro e verdadeiro! Esse parece ser o retrato de nossas igrejas, seus pastores e líderes.

O pragmatismo, que tem suas raízes no humanismo, tem sido o fio condutor que ocupa mente e coração de muitos em nossos dias.

O que se busca são consequências práticas e não o estudo e a reflexão da teologia bíblica: vale muito mais uma boa performance do que o labor teológico.

Com isso, as nossas comunidades têm se esmerado na busca de modelos de crescimento de suas igrejas, levando os ouvintes a receberem uma palavra que lhes seja agradável e que não os leve a um compromisso verdadeiro com os valores do Reino de Deus.

Alister McGrath afirma que é impossível desassociar a teologia e a fé. E sendo assim, tanto as igrejas, como as pessoas que fazem parte dela (e também as que não fazem) precisam, através da teologia, “descompactar os temas centrais da fé”.

Essa caminhada precisa ser trilhada dentro da tradição histórica, estando sempre atentos ao tempo e a cultura, que devem ser respeitados.

E o autor nos alerta:
“Sem a teologia, as igrejas cristãs são apenas guardiãs de memórias e de hábitos que, antes, podem ter sido significativos, mas que, agora, parecem ultrapassados e sem sentido para quem está de fora – e para alguns de dentro”.

A segunda parte do livro busca responder a uma pergunta crucial: por que a teologia importa?

Surpreendentemente e, a meu ver, de forma inédita, McGrath, trata de três temas: sabedoria, bem-estar e beleza.

Em relação a sabedoria, o autor estabelece a diferença entre ela e o conhecimento. Segundo ele, “uma pessoa sábia se envolve com um mundo complexo e incerto, usando uma visão profunda e um julgamento reflexivo”.

Exatamente por isso descobre-se as profundezas da fé através da sabedoria. E essa sabedoria não pode ficar circunscrita ao tempo que vivemos, mas precisa-se buscar “o que já foi escrito no passado”.

Sendo assim, a leitura de C. S. Lewis, G. K. Chesterton, Agostinho de Hipona e Dante, entre outros, torna-se imprescindível.

A sabedoria, segundo o autor, deve nos levar a ir em busca do que já foi escrito ao longo de centenas de anos e ser capaz de aplicar esses estudos para o momento atual.

Em seguida, McGrath trata daquilo que ele chama de bem-estar.

Para ele, há um vínculo entre a teologia e o bem-estar, já que o cristianismo oferece resgatar e transformar o ser humano, e o ministério de Jesus mostra claramente essa abordagem.

Mas não somente isso: para o autor deve-se buscar o real significado desse bem-estar. Os seres humanos buscam compreender todas as dimensões da vida e a teologia é uma ferramenta que será útil para compreender aquilo que é bom, que ele chama de “vida boa”, que para ele é definitivamente o cristianismo.

Para ele as pessoas buscam mais do que simplesmente viver o dia a dia – elas buscam o significado de tudo o que está ao seu redor.

Será o cristianismo que poderá “curar, renovar e transformar uma humanidade quebrada e ferida”.

Ou ainda: “A felicidade que você está buscando, a felicidade que você tem o direito de desfrutar, tem um nome e um rosto: é Jesus de Nazaré.” (Bento XVI)

Para concluir essa tríade, Alister McGrath ressalta que o estudo da teologia nos leva àquilo que ele chama de “senso de beleza”.

Nesse sentido, ele resgata as palavras de uma das palestras de Karl Barth, quando ele se alegra profundamente por ser um teólogo:
“De todas as disciplinas, a teologia é a mais formosa, a que mais move a cabeça e o coração...é uma paisagem como as da Úmbria e da Toscana, com vistas distantes, e ao mesmo tempo, nítidas” .

Para o autor, é importante reconhecer o encanto e a beleza da teologia, mesmo que ela tenha sua característica intelectual.

Sem ela o ser humano fica impossibilitado de se envolver com uma nova narrativa de vida, que pode levá-lo a experimentar o bem-estar e a própria felicidade. Além disso, indica um novo caminho para a generosidade, pois passamos a olhar para aqueles que estão ao nosso redor.

C. S. Lewis, segundo o autor, resume essa necessidade de plenitude, que pode ser encontrada somente em Deus.

Tudo isso fica ainda mais claro quando McGrath afirma: “A teologia nos oferece uma lente para ver o mundo natural não como um objeto para exploração, mas como uma criação de Deus que nos foi confiada para ser guardada" – que é presença da beleza diante de nossos olhos.

Concluindo, o autor deixa claro que os mistérios continuarão sempre a fazer parte da teologia.

“A tarefa da teologia é descobrir como a revelação desse mistério inesgotável na Bíblia e a longa história da reflexão cristã sobre o texto bíblico podem ajudar-nos a envolver-nos com novas questões e a lidar com novas situações. Precisamente porque Deus é inesgotável, nenhum teólogo ou geração de teólogos pode esperar compreender de modo pleno a maravilha de Deus. Há sempre mais para descobrir e experimentar.”

Esse livro marcante leva os leitores a reconhecer que a teologia precisa ser recolocada em um lugar de destaque, especialmente entre os cristãos.

Para o autor “a teologia importa porque o cristianismo importa...se o cristianismo é como uma pérola de grande valor, a teologia tenta descrever essa pérola, revelando como pode ser encontrada e que diferença faz, na vida de alguém, encontrá-la e possuí-la”.

A teologia sempre será crucial para que os cristãos possam crescer e desenvolver sua fé. Se isso não acontecer, (e temos visto sinais evidentes disso), nossas igrejas se tornarão apenas instituições vazias e sem vida.

O desafio desse livro é que você busque se aprofundar naquilo que afirma crer.
Isso não tem a ver somente com a busca de informações, antes, com o desejo intencional de buscar a prática constante da reflexão teológica.

Para Que Serve a Teologia? é um livro imprescindível para todos nós – não somente para aqueles que transitam no mundo acadêmico.

Ele chega em um momento importante na vida da igreja evangélica brasileira, na qual a busca do conhecimento das Escrituras tem sido extremamente superficial e nossas leituras, quando acontecem, ficam circunscritas aos textos de nossos dias, desprezando os escritores que viveram antes de nós.

McGrath é um autor que busca fundamentar seus argumentos sobre a teologia naquilo que aprendeu de autores do passado, trazendo esses pensamentos para os nossos dias.

Boa leitura!
  • Oswaldo Prado, missionário Sepal Portugal e pastor de missionários na Europa.
>> Para Que Serve a Teologia? é um lançamento ABU Editora e Editora Ultimato.


Saiba mais:
>> Para Que Serve a Teologia? – Sabedoria, Significado e Beleza, Alister McGrath
>> Teologia Pura e Simples – O lugar da mente na vida cristã, Alister McGrath
>> Série Grande Teólogos Para Todos, Stephen A. Cooper e Ron Hill
>> Teologia Para o Cotidiano –A sabedoria bíblica para a vida diária, Elben Magalhães Lenz César

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