Opinião
- 15 de fevereiro de 2008
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A sobrevivência da empresa cristã
A entrevista abaixo foi feita pelo Instituto Jetro (www.institutojetro.com) com Klênia César Fassoni, administradora da Editora Ultimato e também assessora administrativa da revista Mãos Dadas. Nesta entrevista, Klênia compartilha das lutas que envolvem a existência de uma empresa que não visa lucro mas, sim, a expansão do Reino de Deus.
Um conhecido autor cristão afirma que "Empresa tem que ser vista como negócio, e não extensão da igreja ou ministério”. De que forma Ultimato é administrada? Como uma empresa ou como um ministério?
Klênia - Esta é uma pergunta complexa. Não há uma resposta simples para ela. A Editora Ultimato tem sido administrada como empresa e como ministério. O diretor e fundador da revista tem afirmado ao longo dos 40 anos que Ultimato é um ministério que por motivos legais se constituiu em uma empresa familiar. Talvez seja importante ter algumas definições em mente. Uma empresa visa lucro. O seu objetivo final é ganho financeiro. Não é o caso da Ultimato. Ela visa à expansão do Reino de Deus. Os recursos são encarados como ferramentas para isso. Talvez chegue o tempo em que poderemos nos referir a uma organização assim administrada simplesmente como ministério ou empresa cristã. Nós dicotomizamos muito. Temos dificuldade em compreender que uma empresa cristã pode (e deve) pedir a bênção de Deus para o seu trabalho e em favor de seus resultados. E os seus colaboradores podem se considerar “missionários” ou comissionados para uma missão. A empresa pode contar com a ação sobrenatural de Deus... é claro que mantendo também toda a estrutura legal que abrange os direitos trabalhistas dos colaboradores e tantos outros arranjos organizacionais. Certa ocasião estudamos o livro de Neemias com toda a equipe. É incrível como no livro estão mesclados a burocracia e o carisma. Deus levanta homens para uma missão, mas também se utiliza de decretos devidamente arquivados. Deus abre o coração de pessoas para ofertarem, mas é necessário gerir bem esses recursos e fazer uma prestação de contas detalhada. Outro dia li na revista Cidade Nova (do movimento Folcolares, da Igreja Católica) o depoimento de empresários e colaboradores ligados a Empresas de Comunhão declarando como Deus respondia às suas orações.
Ao pensarmos em sobrevivência, o aspecto financeiro geralmente aparece como principal dificuldade. É assim também com a Ultimato?
Klênia - O aspecto financeiro é sim uma grande dificuldade para a sobrevivência de organizações, sejam elas cristãs ou seculares. Ultimato tem tido crises financeiras cíclicas desde o seu início em 1968. Por não estar ligada a uma denominação nem a um grupo específico foi preciso partir logo nos primeiros anos para a tentativa de auto-sustentabilidade. Recebemos ao longo dos anos contribuições de amigos e organizações, mas a nossa política é não solicitar ofertas (sempre que as recebemos são transformadas em assinaturas doadas). Temos sobrevivido financeiramente graças à venda de assinaturas, livros e espaços publicitários. A revista Ultimato foi pioneira na veiculação de anúncios na década de 70. Nos últimos sete anos tem crescido a quantidade de projetos feitos em parceria que nos permitiram aumentar o alcance temático e de público.
É possível e viável manter uma empresa funcionando no Brasil se cumprirmos com todas as exigências legais?
Klênia - Acredito que sim. A nossa experiência é de uma empresa de pequeno porte na área de publicações. É uma luta, mas temos procurado atender a todas as exigências fiscais e trabalhistas. Devemos confessar que não chegamos ao ideal ainda. Com relação à infra-estrutura, precisamos melhorar alguns aspectos.
Você diria que a Ultimato tem um desafio a mais como empresa por estar em um país de poucos leitores?
Klênia - Sem dúvida. Alegra-nos muito o fato de termos cerca de 18 mil assinantes da revista e o índice de renovação das assinaturas se manter em torno de 75 a 85%. Mas quando pensamos que Ultimato tem 40 anos percebemos que esses resultados são muito pequenos. Ficamos sabendo de muita gente que aprecia a leitura, faz uso intenso de textos da revista disponíveis no site. Sabemos também de pastores que usam matérias nos seus sermões, mas não assinam a revista. No entanto, sabemos que Ultimato não é uma revista de gosto popular, de fácil digestão... Todas as tentativas de venda em bancas foram frustradas. Isso acontece também com alguns de nossos livros. A Editora Ultimato, que começou em 1993, já publicou 110 títulos. Há livros de excelentes autores, de extraordinário conteúdo, cuja venda não alcançou mil exemplares. Não são muitos os títulos da editora que chegaram à casa dos 3 mil exemplares vendidos. Temos consciência de que em parte a falha é nossa. Não temos tido uma estratégia eficiente e abrangente de divulgação e vendas.
A publicidade seria a principal das estratégias que vocês usam para sobreviver? Como gerenciar os meses de poucos anunciantes?
Klênia - A venda de espaços publicitários já foi responsável por mais de 50% dos recursos da Editora Ultimato. Hoje não chega a 30%. Não que tenha havido uma redução no valor absoluto, mas a receita de outros itens cresceu mais, especialmente a venda de assinaturas, de livros e a parcela proveniente de projetos em parceria. Mas continua a ser uma estratégia muito importante e à qual dedicamos bastante atenção. A maior parte dos anunciantes declara que tem tido um retorno satisfatório aos anúncios veiculados na revista. Na última entrevista que fizemos com nossos assinantes, 80% declararam que lêem os anúncios e que estes os ajudam nas decisões de compra. Além de credibilidade, a partir de uma história de 40 anos, acreditamos que esse retorno favorável tem a ver com a distribuição: 80% dos exemplares têm circulação dirigida. Como a revista é bimestral, a receita de anúncios acontece de dois em dois meses. Em algumas edições não temos alcançado a cota suficiente para fazer frente aos custos da revista.
E quanto aos anunciantes não-pagadores? Sabe-se que muitos cristãos não têm o bolso convertido. O que a Ultimato faz nesses casos?
Klênia - Não temos tido um número muito grande de clientes inadimplentes. Acredito que bem menos do que a média de muitas outras empresas. Ainda assim dificilmente desistimos de cobrar uma dívida antiga. Mesmo que as possibilidades de pagamento sejam remotas temos a norma de continuar incomodando os inadimplentes. Isso tem sido feito inclusive com relação a clientes que compram livros, embora o valor devido seja bem menor do que aqueles que veiculam anúncios, por exemplo. Isso faz parte da nossa cultura, pois achamos que dívida é inadmissível para cristãos e não queremos nos conformar com a idéia de que crentes são maus pagadores. Não temos usado recursos judiciais para receber as dívidas.
Se o Senhor é o dono de todo o ouro e prata por que muitas empresas cristãs naufragam, inclusive deixando dívidas para trás?
Klênia - Uma empresa cristã geralmente se estabelece a partir de um objetivo, um alvo a ser alcançado com o objetivo de promover o Reino de Deus. E Deus provê os recursos para que isso seja alcançado. Algumas empresas cristãs fecham suas portas porque “chegou a hora”. Outras provavelmente porque os recursos foram mal administrados -- o que se relaciona à ausência de bons mordomos do ouro e da prata. Há outras que encerram suas atividades por falta de gente para continuar com a visão. Temos nos inspirado freqüentemente na frase “Orem como se tudo dependesse de Deus e trabalhem como se tudo dependesse de vocês” (Lutero).
Com 40 anos de estrada vocês certamente sabem o que fazer e o que não fazer para sobreviver. Você poderia compartilhar algumas dessas lições com nossos leitores?
Klênia - Acho que não conhecemos os segredos da sobrevivência... Quando nos reunimos e refletimos sobre nossa caminhada nos surpreendemos por termos chegado até aqui. Com unanimidade afirmamos que essa longevidade é diretamente decorrente da bênção de Deus. Uma boa prática é depender do Senhor (se nosso objetivo como empresa -- ou ministério -- é servi-lo, temos de procurar sua orientação e bênçãos o tempo todo). Isso é concretizado em orações diárias com toda a equipe. É muito importante manter uma estrutura simples com custos bem enxutos. Ter compromisso com produtos relevantes é outro fator determinante. No nosso caso, devemos ter compromisso também com qualidade editorial e de conteúdo. Além disso, uma equipe comprometida é vital para uma empresa cristã. Temos tido momentos aos quais chamamos de “subir ao mirante”, ocasiões em que toda a equipe sai da rotina de trabalho e ampliamos o alcance de nossa visão, refletimos sobre a missão da empresa e de cada um. Isso tem nos ajudado a manter o coração aquecido e as mãos na massa.
Um conhecido autor cristão afirma que "Empresa tem que ser vista como negócio, e não extensão da igreja ou ministério”. De que forma Ultimato é administrada? Como uma empresa ou como um ministério?
Klênia - Esta é uma pergunta complexa. Não há uma resposta simples para ela. A Editora Ultimato tem sido administrada como empresa e como ministério. O diretor e fundador da revista tem afirmado ao longo dos 40 anos que Ultimato é um ministério que por motivos legais se constituiu em uma empresa familiar. Talvez seja importante ter algumas definições em mente. Uma empresa visa lucro. O seu objetivo final é ganho financeiro. Não é o caso da Ultimato. Ela visa à expansão do Reino de Deus. Os recursos são encarados como ferramentas para isso. Talvez chegue o tempo em que poderemos nos referir a uma organização assim administrada simplesmente como ministério ou empresa cristã. Nós dicotomizamos muito. Temos dificuldade em compreender que uma empresa cristã pode (e deve) pedir a bênção de Deus para o seu trabalho e em favor de seus resultados. E os seus colaboradores podem se considerar “missionários” ou comissionados para uma missão. A empresa pode contar com a ação sobrenatural de Deus... é claro que mantendo também toda a estrutura legal que abrange os direitos trabalhistas dos colaboradores e tantos outros arranjos organizacionais. Certa ocasião estudamos o livro de Neemias com toda a equipe. É incrível como no livro estão mesclados a burocracia e o carisma. Deus levanta homens para uma missão, mas também se utiliza de decretos devidamente arquivados. Deus abre o coração de pessoas para ofertarem, mas é necessário gerir bem esses recursos e fazer uma prestação de contas detalhada. Outro dia li na revista Cidade Nova (do movimento Folcolares, da Igreja Católica) o depoimento de empresários e colaboradores ligados a Empresas de Comunhão declarando como Deus respondia às suas orações.
Ao pensarmos em sobrevivência, o aspecto financeiro geralmente aparece como principal dificuldade. É assim também com a Ultimato?
Klênia - O aspecto financeiro é sim uma grande dificuldade para a sobrevivência de organizações, sejam elas cristãs ou seculares. Ultimato tem tido crises financeiras cíclicas desde o seu início em 1968. Por não estar ligada a uma denominação nem a um grupo específico foi preciso partir logo nos primeiros anos para a tentativa de auto-sustentabilidade. Recebemos ao longo dos anos contribuições de amigos e organizações, mas a nossa política é não solicitar ofertas (sempre que as recebemos são transformadas em assinaturas doadas). Temos sobrevivido financeiramente graças à venda de assinaturas, livros e espaços publicitários. A revista Ultimato foi pioneira na veiculação de anúncios na década de 70. Nos últimos sete anos tem crescido a quantidade de projetos feitos em parceria que nos permitiram aumentar o alcance temático e de público.
É possível e viável manter uma empresa funcionando no Brasil se cumprirmos com todas as exigências legais?
Klênia - Acredito que sim. A nossa experiência é de uma empresa de pequeno porte na área de publicações. É uma luta, mas temos procurado atender a todas as exigências fiscais e trabalhistas. Devemos confessar que não chegamos ao ideal ainda. Com relação à infra-estrutura, precisamos melhorar alguns aspectos.
Você diria que a Ultimato tem um desafio a mais como empresa por estar em um país de poucos leitores?
Klênia - Sem dúvida. Alegra-nos muito o fato de termos cerca de 18 mil assinantes da revista e o índice de renovação das assinaturas se manter em torno de 75 a 85%. Mas quando pensamos que Ultimato tem 40 anos percebemos que esses resultados são muito pequenos. Ficamos sabendo de muita gente que aprecia a leitura, faz uso intenso de textos da revista disponíveis no site. Sabemos também de pastores que usam matérias nos seus sermões, mas não assinam a revista. No entanto, sabemos que Ultimato não é uma revista de gosto popular, de fácil digestão... Todas as tentativas de venda em bancas foram frustradas. Isso acontece também com alguns de nossos livros. A Editora Ultimato, que começou em 1993, já publicou 110 títulos. Há livros de excelentes autores, de extraordinário conteúdo, cuja venda não alcançou mil exemplares. Não são muitos os títulos da editora que chegaram à casa dos 3 mil exemplares vendidos. Temos consciência de que em parte a falha é nossa. Não temos tido uma estratégia eficiente e abrangente de divulgação e vendas.
A publicidade seria a principal das estratégias que vocês usam para sobreviver? Como gerenciar os meses de poucos anunciantes?
Klênia - A venda de espaços publicitários já foi responsável por mais de 50% dos recursos da Editora Ultimato. Hoje não chega a 30%. Não que tenha havido uma redução no valor absoluto, mas a receita de outros itens cresceu mais, especialmente a venda de assinaturas, de livros e a parcela proveniente de projetos em parceria. Mas continua a ser uma estratégia muito importante e à qual dedicamos bastante atenção. A maior parte dos anunciantes declara que tem tido um retorno satisfatório aos anúncios veiculados na revista. Na última entrevista que fizemos com nossos assinantes, 80% declararam que lêem os anúncios e que estes os ajudam nas decisões de compra. Além de credibilidade, a partir de uma história de 40 anos, acreditamos que esse retorno favorável tem a ver com a distribuição: 80% dos exemplares têm circulação dirigida. Como a revista é bimestral, a receita de anúncios acontece de dois em dois meses. Em algumas edições não temos alcançado a cota suficiente para fazer frente aos custos da revista.
E quanto aos anunciantes não-pagadores? Sabe-se que muitos cristãos não têm o bolso convertido. O que a Ultimato faz nesses casos?
Klênia - Não temos tido um número muito grande de clientes inadimplentes. Acredito que bem menos do que a média de muitas outras empresas. Ainda assim dificilmente desistimos de cobrar uma dívida antiga. Mesmo que as possibilidades de pagamento sejam remotas temos a norma de continuar incomodando os inadimplentes. Isso tem sido feito inclusive com relação a clientes que compram livros, embora o valor devido seja bem menor do que aqueles que veiculam anúncios, por exemplo. Isso faz parte da nossa cultura, pois achamos que dívida é inadmissível para cristãos e não queremos nos conformar com a idéia de que crentes são maus pagadores. Não temos usado recursos judiciais para receber as dívidas.
Se o Senhor é o dono de todo o ouro e prata por que muitas empresas cristãs naufragam, inclusive deixando dívidas para trás?
Klênia - Uma empresa cristã geralmente se estabelece a partir de um objetivo, um alvo a ser alcançado com o objetivo de promover o Reino de Deus. E Deus provê os recursos para que isso seja alcançado. Algumas empresas cristãs fecham suas portas porque “chegou a hora”. Outras provavelmente porque os recursos foram mal administrados -- o que se relaciona à ausência de bons mordomos do ouro e da prata. Há outras que encerram suas atividades por falta de gente para continuar com a visão. Temos nos inspirado freqüentemente na frase “Orem como se tudo dependesse de Deus e trabalhem como se tudo dependesse de vocês” (Lutero).
Com 40 anos de estrada vocês certamente sabem o que fazer e o que não fazer para sobreviver. Você poderia compartilhar algumas dessas lições com nossos leitores?
Klênia - Acho que não conhecemos os segredos da sobrevivência... Quando nos reunimos e refletimos sobre nossa caminhada nos surpreendemos por termos chegado até aqui. Com unanimidade afirmamos que essa longevidade é diretamente decorrente da bênção de Deus. Uma boa prática é depender do Senhor (se nosso objetivo como empresa -- ou ministério -- é servi-lo, temos de procurar sua orientação e bênçãos o tempo todo). Isso é concretizado em orações diárias com toda a equipe. É muito importante manter uma estrutura simples com custos bem enxutos. Ter compromisso com produtos relevantes é outro fator determinante. No nosso caso, devemos ter compromisso também com qualidade editorial e de conteúdo. Além disso, uma equipe comprometida é vital para uma empresa cristã. Temos tido momentos aos quais chamamos de “subir ao mirante”, ocasiões em que toda a equipe sai da rotina de trabalho e ampliamos o alcance de nossa visão, refletimos sobre a missão da empresa e de cada um. Isso tem nos ajudado a manter o coração aquecido e as mãos na massa.
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