Opinião
- 14 de outubro de 2019
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A síndrome de Bambi, a racionalista e o paganismo
Por Cláudio Marra
A sociobiologista norte-americana Rebecca Costa faz uma leitura evolucionista dos eventos e pensamento contemporâneos, propondo soluções racionalistas para os problemas sociais. Conhecida nos Estados Unidos por suas palestras e publicações, ela escreveu recentemente The Watchman’s Rattle ("O alarme do vigia"), livro em que avalia o modo e a razão por que caem e desaparecem civilizações. Segundo ela, esses grupos chegam a um ponto em que não conseguem enxergar o que lhes reserva o futuro e nem como avançar em sua caminhada, ofuscados pela própria situação que enfrentam, com obstáculos que lhes parecem intransponíveis.
Costa oferece, entre outros exemplos, o da civilização Maia, que surgiu e floresceu por um período de 3.500 anos aproximadamente, entre 2,600 a.C. e 900 d.C., nas regiões onde hoje se encontram México, Guatemala, Honduras, El Salvador e Belize. Com uma população estimada em 15 milhões de pessoas na época de seu apogeu, a civilização Maia deixou a escrita com hieróglifos, além de arte, arquitetura, matemática, calendário e sistema astronômico impressionantes. Historiadores dividiram sua história em período arcaico (até 2000 a.C.), período pré-clássico (de 2000 a.C. a 250 d.C.) e período clássico (de 250 a 900 d.C.), seguindo-se a rápida redução da população e decadência no pós-clássico, marcado por constantes disputas internas que enfraqueceram os Maias, esvaziaram as cidades e culminaram na derrota para os espanhóis e destruição de sua última grande fortaleza em Nojpetén, última cidade Maia, em 1697.
Por que uma queda relativamente rápida após 35 séculos de marcante existência? O golpe final dado pelos espanhóis foi exatamente isso: final, porque a queda já se tornara evidente a partir do ano 900 d.C. Pesquisadores têm suas teorias, sugerindo que tragédias naturais, superpopulação, escassez de alimentos ou epidemia, além das registradas lutas internas e uma combinação de tudo isso tenham implodido a civilização.
Na opinião de Rebecca Costa, o motivo por trás de quaisquer que tenham sido as causas diretas, havendo problemas demais e mais complexos do que os Maias conseguiam resolver, foi terem eles transferido indefinidamente o assunto para as próximas gerações, bem como, afinal, haverem adotado soluções insatisfatórias. Talvez essa não nos pareça uma brilhante conclusão e não precisemos de uma laureada sociobiologista para propô-la, mas instrutivo é analisar o que a autora chama de “soluções insatisfatórias”. Segundo Costa, os Maias buscaram refúgio na irracionalidade, desprezaram os fatos e correram para a religião, com a prática de sacrifícios humanos em larga escala.
Certo, a religiosidade Maia não explicava sua ascensão e florescimento, e não haveria agora de frear sua decadência. O caso, porém, é que a racionalista Costa está criticando nada sutilmente a religiosidade de seu próprio tempo. Para ela, a solução está na razão. Ora, a fé cristã não propõe que a solução para o aquecimento global potencialmente destrutivo – por exemplo – esteja na religiosidade, mesmo a cristã, mas muito menos na religiosidade racionalista. Deus nos encarregou do mandato cultural (de cuidarmos de seu jardim), do mandato social (de zelarmos pelas relações sociais) e – o que os racionalistas não admitem – encarregou-nos do mandato espiritual (de nos relacionarmos com ele). Crer que a resposta está no racionalismo seria adotarmos a solução errada e assim repetirmos o erro dos Maias e rumarmos nós também para a extinção.
A esta altura da reflexão, ocorre-me o quanto a visão de Costa está enraizada no paganismo que ela, claro, não alegaria professar.
Explico.
Lembro-me do desenho animado Bambi, de Walt Disney. Uma linda e inocente história. Muitos pais que afastariam seus filhos de outros entretenimentos os levariam tranquilamente para ver Bambi. Os pais que só em O Rei Leão passaram a ver o paganismo da Disney expressariam sua saudade de Bambi. Bons tempos aqueles!
A cosmovisão bambina, porém, está longe de ser cristã. Sua perspectiva do homem é negativa. Ele só aparece – e sem rosto – como o responsável pela trágica queimada. A natureza é exaltada. Ela se basta, e uma estação segue a outra completando ciclos sem fim. Não há na história uma perspectiva de uma consumação dos tempos, como nos ensina a Escritura.
Na cosmovisão de Rebecca Costa essa sequência de ciclos se aplica às civilizações. Elas vêm e – não sabendo resolver seus problemas – desaparecem. Os ciclos continuam. Não se fala em consumação.
A identidade cristã, porém, está livre dessa síndrome de Bambi. Segundo a Escritura, após a Criação ocorreu a Queda, mas o Senhor logo comunicou seu plano de Redenção, que foi imediatamente desencadeado e que ruma para a Consumação.
Ora, vem, Senhor Jesus.
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Casado com Sandra, é jornalista, pastor presbiteriano e editor da Cultura Cristã.
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