Opinião
- 14 de janeiro de 2022
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A resposta da igreja frente aos refugiados climáticos
Por Erick Perez e Karen Pereira
A variação na temperatura de meio ou um grau na média global pode parecer inofensiva, mas cada 0,5ºC desta variação acarreta estrondosas mudanças climáticas traduzidas em frequências e intensidades maiores de eventos extremos tais como tempestades, secas, tufões, entre outros fenômenos naturais e consequentemente pessoas tendo que migrar destas regiões em busca de segurança e sobrevivência.
Encontramos relatos bíblicos que demonstram o fenômeno das migrações ambientais que é algo que permeia a história da humanidade. São diversos os relatos de catástrofes naturais, doenças, pestes e surtos epidêmicos, grandes períodos de seca, fome e tantos outros eventos que obrigaram pessoas e grupos a se deslocarem.
O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente define refugiados ambientais como “pessoas forçadas a deixar seu habitat natural, temporária ou permanentemente, por causa de uma marcante perturbação ambiental” (natural e/ou desencadeada pela ação humana como mudanças físicas, químicas, e/ou biológicas no ecossistema), que colocou em risco sua existência e/ou seriamente afetou sua qualidade de vida. Alguns outros fatores podem fazer parte dos problemas ambientais, tais como o crescimento populacional, pobreza generalizada, fome e doença pandêmica.
Qual é a realidade da América Latina no contexto das mudanças climáticas?
Em 2010 aconteceu o célebre terremoto no Haiti que foi considerado o maior do país em 200 anos e um dos piores desastres urbanos da atualidade resultando em mais de 300 mil mortes e 1,5 milhão de pessoas desabrigadas. O custo da catástrofe foi avaliado em 7.9 bilhões de dólares, e o país teve que depender de organismos internacionais para financiar a reconstrução. O Estado haitiano enfrentou e enfrenta diversas dificuldades para conseguir vencer este processo devido a inúmeras questões, o que gerou um processo migratório massivo para outras partes do próprio país, países vizinhos e outros países do continente americano, incluindo o Brasil. O Haiti enfrentou vários desafios no ano de 2021, em julho, o assassinato do Presidente Jovenel Moise, e em agosto, um terremoto na região sul do país, levando mais de 2.248 mortes, intensificou a migração de haitianos para outras partes da América Latina.
No Peru, a migração interna não é algo novo, porém o número crescente de deslocamento devido às causas climáticas traz grandes desafios para o governo e organismos internacionais. O fenômeno El Niño Costero, afeta Perú e Equador, com o aquecimento anômalo do mar, resultando em chuvas e inundações. Em 2017, as consequências desta anomalia deixaram 101 mortos, 353 feridos e 19 desaparecidos, segundo números oficiais. Provocaram o deslocamento de quase 300.000 pessoas, segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM), que é uma agência da ONU. A maioria das famílias se deslocaram para a capital do país, Lima, onde vivem em residências precárias e ganham suas vidas de maneira informal.
No ano de 2020 houve 30 tempestades tropicais, sendo 13 furações, mostrando os riscos que as mudanças climáticas podem trazer à América Central, influenciadas pelos ciclones e fenômenos El Niño e La Niña, vulcões ativos e por se encontrarem em áreas de terremotos. A estes fatores, acrescenta-se a grande desigualdade social, a falta de planejamento e as infraestruturas com mau estado de conservação.
Hoje, a América Central, sobretudo El Salvador, Guatemala e Honduras enfrentam uma massiva migração rumo aos Estados Unidos ocasionada sobretudo pela pobreza e violência, acentuada pelos problemas climáticos.
No Brasil, a região nordeste deve sofrer um processo de desertificação. Diante deste cenário, milhões de pessoas serão obrigadas a se deslocarem para outras regiões do país. Não se pode ignorar estas mudanças climáticas, pois este tipo de ação colocará em risco a população e a própria estrutura do país.
Quais são as estratégias da Igreja?
Abordar a temática da migração dentro do contexto de mudanças climáticas faz com que se dê um rosto humano aos debates dentro da temática das mudanças climáticas. É importante mostrar os migrantes, suas famílias e comunidades, a compreensão de suas ações, desafios que encontrarão e as possibilidades de mobilidade que estão disponíveis a eles.
Dessa forma, a Igreja conta com recursos suficientes não apenas para participar das mudanças necessárias que resultem numa ação transformadora dentro das comunidades de fé, mas também em ações protagonistas que impactarão de forma direta o debate, produzindo dessa forma, uma práxis que gere mudanças contextualizadas em favor do meio-ambiente e os migrantes climáticos.
Nos textos bíblicos, encontramos alguns exemplos da migração produzida por mudanças climáticas:
Em primeiro lugar, no texto veterotestamentário de Gênesis 21 e 26 observamos o impacto produzido pela falta de água ou mesmo pelo acesso precário ao vital recurso, que produziu grande fome na terra de Abraão, e por consequência, uma tensa situação com grande potencial de se tornar violenta, devido ao conflito entre os empregados de Abraão e os empregados do Abimeleque por causa da escassez de água. Já em Gênesis 26, Isaque, filho do já falecido Abraão, deslocou-se para a terra dos filisteus como seu pai tinha feito, novamente devido à grande fome que impactou à terra por causa da seca.
Em segundo lugar, o texto de Gênesis 41, apresenta o início de uma devastadora crise ambiental, produto de uma extensa seca que atingiu a terra por sete anos e resultou no deslocamento forçado de milhares de pessoas para o Egito, incluindo a família do José, pois estes precisaram abrir mão do seu lar para encontrar comida e assim não perecer.
Estas duas histórias que o texto bíblico nos apresenta evidenciam de qual forma as mudanças climáticas impactam não apenas o povo no antigo oriente próximo, mas os povos hoje em dia. Dessa forma, como igreja cristã devemos ser sensíveis às necessidades e motivações que levam milhares de pessoas a “abrir mão” de seus lares, povos, cidades e países, numa tentativa de preservar a suas vidas e as vidas de suas famílias.
Para isso, a teologia cristã tem trabalhado intensamente para fornecer recursos teológicos, como por exemplo, a ecoteologia, amplamente abordada por teólogos como Moltmann, Haught e Arnould, como também, em ações práticas desenvolvidas por ministérios e organizações cristãs como a Tearfund em favor da preservação do meio ambiente e do acolhimento dos migrantes deslocados devido às mudanças climáticas cada vez mais visíveis e presentes nos dias de hoje.
Como ajudar:
1. Reconheça que como imagem de Deus, temos a responsabilidade de cuidar da criação como representantes do Criador neste mundo (Gênesis 1.26);
2. Se envolva no cuidado e preservação do meio-ambiente, assim você estará cuidando dos pobres e também dos excluídos, pois são eles que mais sofrem com os desequilíbrios ambientais ocasionados pelas mudanças climáticas (Zacarias 7.10);
3. Participe e produza ações de sensibilização na sua comunidade de fé que busquem o cuidado com a natureza (Mateus 5.13).
Erick Pérez Ortuño, Nascido na Venezuela e naturalizado Brasileiro, Seminarista da Segunda Igreja Presbiteriana Independente de Maringá, Engenheiro Agroindustrial, Bacharel em Teologia pela Unicesumar, Pesquisador na área de participação religiosa no acolhimento de refugiados e imigrantes, Empreendedor Social e é o atual presidente do Instituto Sendas.
Karen Fernanda Ramos Pereira, é enfermeira e mobilizadora do Movimento Como Nascido Entre Nós que apoia igrejas e organizações cristãs que trabalham com migrantes e refugiados no Brasil.
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