Opinião
- 26 de setembro de 2008
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A marca da intolerância
João Heliofar de Jesus Villar
“Examinei com cuidado o significado de um herege e não consigo fazê-lo significar mais que o seguinte: um herege é um homem de quem discordamos”. Essa afirmação, em tom irônico, data do século 16 e se deve a um protesto contra a intolerância que a Reforma Protestante começava a assumir na Genebra de Calvino. Um movimento que começou brandindo pelo direito à “liberdade de consciência”, e que não deveria “triunfar pelo fogo, mas pelos escritos” (Lutero), estava adotando métodos tão intolerantes quanto os de seus perseguidores. O próprio Lutero, como se sabe, concordou que anabatistas e membros de outros movimentos protestantes mais extremistas fossem condenados à morte pela autoridade civil.
O que aqui se escreve não é para infamar a memória daqueles reformadores ilustres. Eram filhos de seu tempo e não podem ser julgados pelos critérios de quem, no presente, pode observar seus erros com quase cinco séculos de vantagem. A necessidade de preservar verdades fundamentais num ambiente terrivelmente hostil, se não justifica, ao menos explica as ações agressivas que adotaram na ânsia de preservar o sistema que defendiam.
O que se pretende mostrar é que a intolerância, esse sentimento que nos leva a desprezar e nos afastar do diferente, e estabelecer a “nossa verdade” a fórceps, pode assaltar inclusive os mais sinceros e honestos homens de Deus. Se homens com aquela envergadura moral, evidentemente chamados por Deus para a realização de um propósito grandioso, incorreram em intolerância brutal, não é de imaginar que corremos o mesmo risco?
E é bom lembrar que quando somos intolerantes raramente o assumimos, mas sempre garantimos que assim agimos pelos mais nobres e espirituais motivos. E qual motivo poderia ser mais nobre e espiritual do que a defesa da verdade da Palavra de Deus? O problema é que escudado nessa boa razão – e é isso que nos mostra o teatro da história – podemos, em vez de defender a causa santa, dar vazão à nossa atávica intransigência. “Sou uma pessoa relativamente fácil de conviver, só não suporto que discordem de mim”, diz o “Deus” brasileiro do filme de Cacá Diegues, vivido por Antônio Fagundes. Talvez os líderes das igrejas no país devessem se perguntar aonde o cineasta foi buscar esse paradigma distorcido para retratar a Deus.
“Examinei com cuidado o significado de um herege e não consigo fazê-lo significar mais que o seguinte: um herege é um homem de quem discordamos”. Essa afirmação, em tom irônico, data do século 16 e se deve a um protesto contra a intolerância que a Reforma Protestante começava a assumir na Genebra de Calvino. Um movimento que começou brandindo pelo direito à “liberdade de consciência”, e que não deveria “triunfar pelo fogo, mas pelos escritos” (Lutero), estava adotando métodos tão intolerantes quanto os de seus perseguidores. O próprio Lutero, como se sabe, concordou que anabatistas e membros de outros movimentos protestantes mais extremistas fossem condenados à morte pela autoridade civil.
O que aqui se escreve não é para infamar a memória daqueles reformadores ilustres. Eram filhos de seu tempo e não podem ser julgados pelos critérios de quem, no presente, pode observar seus erros com quase cinco séculos de vantagem. A necessidade de preservar verdades fundamentais num ambiente terrivelmente hostil, se não justifica, ao menos explica as ações agressivas que adotaram na ânsia de preservar o sistema que defendiam.
O que se pretende mostrar é que a intolerância, esse sentimento que nos leva a desprezar e nos afastar do diferente, e estabelecer a “nossa verdade” a fórceps, pode assaltar inclusive os mais sinceros e honestos homens de Deus. Se homens com aquela envergadura moral, evidentemente chamados por Deus para a realização de um propósito grandioso, incorreram em intolerância brutal, não é de imaginar que corremos o mesmo risco?
E é bom lembrar que quando somos intolerantes raramente o assumimos, mas sempre garantimos que assim agimos pelos mais nobres e espirituais motivos. E qual motivo poderia ser mais nobre e espiritual do que a defesa da verdade da Palavra de Deus? O problema é que escudado nessa boa razão – e é isso que nos mostra o teatro da história – podemos, em vez de defender a causa santa, dar vazão à nossa atávica intransigência. “Sou uma pessoa relativamente fácil de conviver, só não suporto que discordem de mim”, diz o “Deus” brasileiro do filme de Cacá Diegues, vivido por Antônio Fagundes. Talvez os líderes das igrejas no país devessem se perguntar aonde o cineasta foi buscar esse paradigma distorcido para retratar a Deus.
45 anos, é procurador regional da República da 4ª Região (no Rio Grande do Sul) e cristão evangélico.
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