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Palavra do leitor

Vergonha e honra evangélico-brasileiras

Nessa festa contraditória de Independência Nacional, num exercício de cidadania cristã, posto este artigo numa mistura de vergonha e orgulho. 

Como cidadão brasileiro e cristão propus-me, há três anos, um desafio pessoal de reunir as lideranças cristãs de nosso bairro em BH para oração e confraternização. Empolguei-me com a idéia. Escrevi uma carta convite com o título "creio na comunhão dos santos" e fui bater de porta em porta.

Como em qualquer outro lugar do Brasil, em nosso bairro a criminalidade cresce. Assassinatos, roubos, tráfico, prostituição, corrupção tornam o Brasil famoso mundialmente. Esse vexame poderia, quem sabe, ser remediado, pelo menos em nosso bairro, que tem o nome abençoado de Sagrada Família. Já que os políticos não conseguem lidar com essa questão, talvez na base, apelando pra Deus, algo poderia mudar. Naquela época a sociedade brasileira ainda consumia seu tempo com os escândalos do mensalão...

Vergonhosamente não somos uma família, muito menos sagrada. Refiro-me à igreja. Localmente estamos segmentados. Não há aproximação. Não há uma identidade cristã. As instituições abafaram o caráter pessoal do evangelho e cada um segue sua própria tradição.

Tivemos o apoio de um restaurante que cedeu-nos o local e o cafezinho para a reunião. O padre (primeiro que procurei) topou logo de início e disse-me que já havia tentado, sem sucesso, uma aproximação com pastores da redondeza (em torno de 15). Um pastor me falou: eu só vou se outros forem, não pega bem, né, só eu e o padre! Outro me disse depois do encontro: Rogério, não tinha como eu ir. Como explicar para o meu presbitério que estive numa reunião com pentecostais presentes? Outro já topou, mas só depois de eu visitá-lo perseverantemente (ou seria insistentemente) tentando vender a idéia.

Hoje em dia tornou-se muito comum as igrejas estabelecerem visão, missão e propósitos. Nesses propósitos (normalmente cinco, franqueados da Califórnia) não há mais espaço para a espontaneidade. O modelo contemporâneo de igreja instituição empresarial mostrou-se efetivo, foi coroado e vem superando a singeleza de Cristo. A criança, exemplo bíblico de grandeza, foi violentada pela pequenez medíocre do líder, e assim a brincadeira séria de ser cristão virou uma piada sem graça, onde você já é recebido no domingo no culto por alguém de crachá... O diácono é alguém responsável pela técnica do som... E o pastor de ovelhas é o funcionário assalariado responsável em fazer a máquina continuar funcionando.

Mas para minha surpresa alguns, todavia, abraçaram a idéia e juntos oramos ingenuamente pelo bairro. Orgulho-me de termos comido um pão de queijo e batido um bom papo informal. Orgulho-me de a coisa não ter virado um local para desfile de egos ou um blá-blá-blá pseudo-político, mas pelo contrário, houve ainda lugar para a camaradagem, reconhecimento e respeito mútuos. Hoje, refletindo naquela manhã, penso que foi desnecessária e até prejudicial uma rodada de auto-apresentação que fizemos, teria sido melhor apenas pedir para cada uma, das nove lideranças que estiveram presentes, contar algo bonito ou engraçado sobre um amigo em especial. Infelizmente por descuido, numa cochilada, deixamos que a máscara dos ministérios cobrisse novamente os rostos e corações das pessoas que ali estavam.

E assim vamos conspirando como cristãos modernos contra essa força colonizadora que nos sufoca. Buscamos relacionamentos genuínos onde podemos verdadeiramente ver e ser vistos. Ainda sonho com essa independência, se não em nossa pátria pelo menos em nossa Sagrada Família.

www.fraternus.de
Fürth - EX
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