Palavra do leitor
- 11 de outubro de 2013
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Uma verdade inquietante
Foi uma noite daquelas! Depois de tentar discorrer um texto emblemático, em pleno domingo à noite, exausto, rendi-me ao convite da Juventude da igreja à La Bella Pizza. Mal sabia eu que aquela noite seria um marco para minha vida pastoral. Acomodei-me na cadeira. Outros me acompanharam. Outros à margem, porém atentos. Minha intenção era clara. Saborear uma bela pizza temperada com bom papo.
Então, logo nos primeiros minutos, a conversa surgiu em torno de experiências espirituais. O tema é recorrente, mas as inovações recentes em busca do sagrado, não. Renovam-se. Dai, , logo, meu interlocutor se posiciona em defesa da liberdade particular. Afinal de contas, parafraseando, assegurou: “Toda experiência espiritual é subjetiva.” Refleti em sua frase e, sem objeção, concordei com ele.
Entretanto, algo na entrelinha dos fatos noticiava as demandas de seu coração. Dava a impressão que algo em sua experiência espiritual o havia surpreendido. Tentei me conter, mas não me contive. Questionei-o por várias vezes. E ele convicto argumentou a favor, buscou apoio com o olhar, mas não me convenceu. Além do mais, aproveitei e fiz algumas afirmações severas a respeito das inovações carismáticas. O debate ganhou forma. Aqueceu meu coração. Provoquei-o, confesso.
Ademais, encontrei algumas explicações para os nossos questionamentos. Cada ser humano constrói ao seu redor o seu mundo simbólico. Projeta algo em si. A construção religiosa então, não é exceção. Por isso a religião pressupõe as mais estranhas experiências incorpóreas em nome de Deus. De igual modo, os cristãos numa outra época, aponta Karen Armstrong, em seu livro "Em Nome de Deus". “Enquanto os Judeus enfrentavam as traumáticas consequências de sua expulsão da Espanha e os muçulmanos estabeleciam por um caminho que os afastaria das certezas e das santidades do passado”.
O fato é que, com o mundo, a subcultura evangélica, especialmente o universo neopentecostal brasileiro produz verdadeiras “pérolas preciosas” cuja marca distingue seu comportamento. Na mesma direção, a manipulação das massas adquire um capítulo à parte. O apóstolo Paulo já profetizava há mais de dois mil anos: “Pois virá o tempo em que não suportarão a sã doutrina; ao contrario, sentido coceira nos ouvidos, juntarão mestres para si mesmos, segundo os seus próprios desejos (2Tm 4: 3)
De fato, a ênfase ao êxtase espiritual faria Jesus corar de vergonha.
Com a pentecostalização do movimento evangélico observa-se uma maior ligação entre emocional e o espiritual. No pentecostalismo, espiritualidade tem forte vinculação com a emotividade. As experiências com o sagrado geram respostas emocionais de temor, espanto, riso, choro. Não é incomum observar em ambientes emocionalmente carregados que a espiritualidade serviu para catalisar êxtases. O pentecostalismo brasileiro acabou se viciando na emotividade. E logo surgiram oportunistas, especialistas em produzir tais experiências. (GONDIM, 2011)[1]
O êxtase estético por mais estranho que possa parecer, prolonga-se a cada dia no imaginário evangélico. Com efeito, o insaciável desejo pelo místico é embalado pelas neuroses – a solução mágica de um deus que funcione e nos dê prazer. Mais parece mímica da cultura pagã diluída em novos modelos de fé. Feitiço. Alienação. Nesse sentido, Peter Berger[2] adverte: “Aquele que janta com o diabo da modernidade tem de ter uma colher comprida.”
Vale salientar, antes da experiência particular, o bom senso adverte: faz-se necessário uma análise equilibrada das escrituras, sem tender, sem privilegiar a experiência pessoal voltada para as necessidades e interesses particulares.
De fato, sob certo aspecto, a dimensão ética se esvazia. Corremos sérios riscos de ter uma geração inteira reproduzindo modelos engessados. Ou uma geração que prefere suas próprias interpretações com balizamento nas experiências subjetivas a inspiração, a gramática do dia a dia imersa na vida das pessoas.
No entanto, meus amigos, ainda assim, cheguei à conclusão de que a abordagem do assunto foi proveitosa. Levou-me à reflexão. Porque não me canso de pedir a Deus sobriedade. Capacidade para cuidar de vidas. Pensar assuntos do Reino e quando necessário, debater sem contender. Ser tolerante e, principalmente, respeitar os atos de fé.
Não obstante, se por algum momento vibrei na defesa de meus argumentos, foi por amor ao Evangelho, o qual creio. Foi para não ser omisso, nem tão pouco covarde no exercício da vocação. Portanto, de maneira merecida, obrigado por contribuir para minha experiência pastoral. Fui tremendamente enriquecido.
Que a graça te seja multiplicada.
[1] GOUVEIA, Ricardo Quadros. (Org.) O que estão falando da Igreja. Fonte Editorial, São Paulo: 2011, p. 93
[2] BERGER, Peter. Sociólogo com diversos escritos na área de sociologia.
Então, logo nos primeiros minutos, a conversa surgiu em torno de experiências espirituais. O tema é recorrente, mas as inovações recentes em busca do sagrado, não. Renovam-se. Dai, , logo, meu interlocutor se posiciona em defesa da liberdade particular. Afinal de contas, parafraseando, assegurou: “Toda experiência espiritual é subjetiva.” Refleti em sua frase e, sem objeção, concordei com ele.
Entretanto, algo na entrelinha dos fatos noticiava as demandas de seu coração. Dava a impressão que algo em sua experiência espiritual o havia surpreendido. Tentei me conter, mas não me contive. Questionei-o por várias vezes. E ele convicto argumentou a favor, buscou apoio com o olhar, mas não me convenceu. Além do mais, aproveitei e fiz algumas afirmações severas a respeito das inovações carismáticas. O debate ganhou forma. Aqueceu meu coração. Provoquei-o, confesso.
Ademais, encontrei algumas explicações para os nossos questionamentos. Cada ser humano constrói ao seu redor o seu mundo simbólico. Projeta algo em si. A construção religiosa então, não é exceção. Por isso a religião pressupõe as mais estranhas experiências incorpóreas em nome de Deus. De igual modo, os cristãos numa outra época, aponta Karen Armstrong, em seu livro "Em Nome de Deus". “Enquanto os Judeus enfrentavam as traumáticas consequências de sua expulsão da Espanha e os muçulmanos estabeleciam por um caminho que os afastaria das certezas e das santidades do passado”.
O fato é que, com o mundo, a subcultura evangélica, especialmente o universo neopentecostal brasileiro produz verdadeiras “pérolas preciosas” cuja marca distingue seu comportamento. Na mesma direção, a manipulação das massas adquire um capítulo à parte. O apóstolo Paulo já profetizava há mais de dois mil anos: “Pois virá o tempo em que não suportarão a sã doutrina; ao contrario, sentido coceira nos ouvidos, juntarão mestres para si mesmos, segundo os seus próprios desejos (2Tm 4: 3)
De fato, a ênfase ao êxtase espiritual faria Jesus corar de vergonha.
Com a pentecostalização do movimento evangélico observa-se uma maior ligação entre emocional e o espiritual. No pentecostalismo, espiritualidade tem forte vinculação com a emotividade. As experiências com o sagrado geram respostas emocionais de temor, espanto, riso, choro. Não é incomum observar em ambientes emocionalmente carregados que a espiritualidade serviu para catalisar êxtases. O pentecostalismo brasileiro acabou se viciando na emotividade. E logo surgiram oportunistas, especialistas em produzir tais experiências. (GONDIM, 2011)[1]
O êxtase estético por mais estranho que possa parecer, prolonga-se a cada dia no imaginário evangélico. Com efeito, o insaciável desejo pelo místico é embalado pelas neuroses – a solução mágica de um deus que funcione e nos dê prazer. Mais parece mímica da cultura pagã diluída em novos modelos de fé. Feitiço. Alienação. Nesse sentido, Peter Berger[2] adverte: “Aquele que janta com o diabo da modernidade tem de ter uma colher comprida.”
Vale salientar, antes da experiência particular, o bom senso adverte: faz-se necessário uma análise equilibrada das escrituras, sem tender, sem privilegiar a experiência pessoal voltada para as necessidades e interesses particulares.
De fato, sob certo aspecto, a dimensão ética se esvazia. Corremos sérios riscos de ter uma geração inteira reproduzindo modelos engessados. Ou uma geração que prefere suas próprias interpretações com balizamento nas experiências subjetivas a inspiração, a gramática do dia a dia imersa na vida das pessoas.
No entanto, meus amigos, ainda assim, cheguei à conclusão de que a abordagem do assunto foi proveitosa. Levou-me à reflexão. Porque não me canso de pedir a Deus sobriedade. Capacidade para cuidar de vidas. Pensar assuntos do Reino e quando necessário, debater sem contender. Ser tolerante e, principalmente, respeitar os atos de fé.
Não obstante, se por algum momento vibrei na defesa de meus argumentos, foi por amor ao Evangelho, o qual creio. Foi para não ser omisso, nem tão pouco covarde no exercício da vocação. Portanto, de maneira merecida, obrigado por contribuir para minha experiência pastoral. Fui tremendamente enriquecido.
Que a graça te seja multiplicada.
[1] GOUVEIA, Ricardo Quadros. (Org.) O que estão falando da Igreja. Fonte Editorial, São Paulo: 2011, p. 93
[2] BERGER, Peter. Sociólogo com diversos escritos na área de sociologia.
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