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Palavra do leitor

Sonhos são adiados, mas não esquecidos

Sempre corremos atrás de um sonho, às vezes sonhamos alto, às vezes voamos baixo. Já percebeu? Quando estamos quase perto... Ai, ai, ai, não foi dessa vez. Sonhos são assim, ora palpáveis, ora abstratos como uma pintura exposta.

Flávio era um menino esperto e sadio, inteligente, só tirava notas altas na escola. Gostava sempre de se sentar na frente, para não perder nada do que a professora dissesse.

De família humilde, cresceu em meio á circunstâncias não favoráveis, mas, não perdia as esperanças nunca. Estudava pela manhã e a tarde trabalhava como engraxate, ajudava em casa sua mãe e seus irmãos, mas, guardava um sonho dentro do seu coração, um sonho que começou quando ao passar em frente a uma loja, deparou-se com uma vitrola, no momento em que a viu, seus olhos brilharam, seu coração disparou e sua boca ficou seca. Aquilo era o que ele sempre sonhara, imaginam ouvir as músicas que ele gostava, os discos românticos que sua mãe gostava isso seria muito bom, essa vitrola tem que ser minha, disse o menino.

Rapidamente ele entrou como um raio pela loja do seu Oswaldo à dentro, ainda ofegante perguntou:

- Seu Oswaldo! Seu Oswaldo! Quanto custa essa vitrola?

- 30,00 cruzeiros, respondeu o velho.

- Eu posso comprar, se eu trabalhar duro engraxando meus sapatos, eu consigo juntar, fora as gorjetas.

O velho para não acabar com as esperanças do menino disse:

- Vai sim. Se você se esforçar, vai conseguir.

Flávio mal podia trabalhar direito naquele dia, não via a hora de comprar sua vitrola. Assim que chegou em casa foi logo falando para sua mãe sua descoberta e seu sonho, a mãe do menino olhou para dentro da casa humilde, seus olhos marejaram um pouco, mas, não podia dizer para o filho que seu sonho estava distante, somente o abraçou com um daqueles abraços de mãe que podem até curar.

Nisso o tempo passou, o menino continuava a ajudar em casa, mas, no fundo da gaveta da sua cômoda escorada com um tijolo, estava todo o dinheiro que conseguia juntar.

Ele trabalhou duro, mais do que podia, o Natal parecia demorar a chegar mais do que nos outros anos, e Flávio com toda a sua garra não desistia.

Logo veio o Natal, as ruas enfeitadas com as luzes brilhantes, as lojas fervilhando de gente, nas igrejas os corais começavam seus ensaios, e Flávio ficava deslumbrado com tudo aquilo.

Chegou a casa mais cedo, correu para o quarto, pegou todo o dinheiro que conseguiu juntar no decorrer do ano, contou, e com um sorriso gritou aos quatro ventos:

- Consegui! Consegui! Agora vou ter minha vitrola. Vou correndo na loja do seu Oswaldo comprar logo minha vitrola.

A loja estava cheia, pessoas chegando, outras saindo, mercadorias espalhadas por todos os lados, e Flávio procurando na prateleira sua vitrola. Ele olhou, olhou, procurou, e não achou. Perguntou para o seu Oswaldo:

- Onde está minha vitrola? Acabou? Estou com todo o dinheiro aqui.

Seu Oswaldo olhou para o menino com tristeza e disse:

- Não acabou Flávio, o fabricante apenas recolheu das prateleiras, agora eles não fabricam mais vitrolas, trouxeram uma novidade para ser lançado nesse Natal que vai acabar de vez com os discos de vinil, se chama aparelho de Cd.

O menino não sabia o que fazer, afinal de contas trabalhara duro naquele ano para comprar a vitrola, não conseguia se conformar. Aquilo era duro demais para um menino.O velho com o coração partido abraçou o menino como se fosse à última vez e disse:

- Não desista dos seus sonhos, ainda que eles possam parecer longe, ainda que pense que não vão se realizar, eles podem ser adiados, mas nunca esquecidos.
Muriaé - MG
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