Palavra do leitor
- 14 de julho de 2020
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Saudades de casa
"Às margens dos rios da Babilônia, nós nos assentávamos e chorávamos, lembrando de Sião". Assim inicia o salmo 137 cujo conteúdo é um lamento do povo judeu quando no exílio babilônico, seis séculos antes de Cristo. Sua autoria é desconhecida, embora a tradição judaica o atribua a Jeremias. Uma famosa canção intitulada ‘Rivers of Babylon’, que contém trechos deste salmo foi gravada em 1969, e ganhou projeção através do cantor Jimmy Cliff.
Saudade: esta era a palavra que sintetizava o que os judeus sentiam quando feitos cativos numa terra estranha e pagã. Distantes de casa, usavam a poesia do saltério para externalizar seus sentimentos e sonhos. A distante Sião, Jerusalém, era agora uma lembrança, um retrato na parede que os fazia viajar no imaginário trazendo à mente milhares de anos de uma cultura e de uma religião que os diferenciavam de todos os outros povos vizinhos. A terra para aquele povo sempre fora sinal de forte identidade e, principalmente, de comunhão com Yaveh, o Deus único e soberano que havia decidido se revelar ao mundo através deste povo nômade liberto das garras de uma nação pagã e peregrina por décadas em um deserto que os levaria a uma terra prometida. E estar longe do templo onde outrora adoravam ao seu Deus era talvez o pior dos castigos que o inimigo usurpador poderia lhes impor.
Assim como o salmista, vivemos nestes dias tempo de saudades. Saudades dos irmãos com quem orávamos, saudades do abraço gostoso após as reuniões, saudades das crianças correndo pelos corredores, saudades do bate-papo no salão durante o cafezinho após os cultos, saudades de sorrisos e palavras afáveis, saudades de cantarmos juntos hinos de louvor ao Nosso Deus, saudades do pão e vinho tomados juntos que são o memorial da obra salvífica de Cristo em nossas vidas, saudades do templo de quem fomos separados pelo vírus globalizado e invisível. Saudades, saudades…
O que aprender com tudo isso? Podemos ser outras pessoas ao retornarmos aos nossos encontros presenciais? Talvez sim. Quem sabe, a partir de agora, não aguardaremos o dia do Senhor com mais expectativa e o louvaremos com mais fervor e alegria. Quem sabe nos comportaremos com mais intimidade, levantaremos nossas mãos com mais ousadia, participaremos da ceia com mais santidade. Quem sabe deixaremos de ser meros ouvintes e expectadores e nos tornemos verdadeiros adoradores. Sabe aquele irmão ou irmã a quem você nunca deu um "bom dia, ou boa noite", quem sabe agora ele ou ela será seu parceiro de caminhada e de oração. Quem sabe você e eu olharemos para o outro com um olhar mais compassivo e lhe daremos um sorriso mais sincero. Quem sabe não riremos juntos a partir de agora contando e compartilhando nossas histórias. Quem sabe choraremos com as perdas uns com os outros como nunca fizemos. Quem sabe o templo passe a ser muito mais do que um simples prédio de tijolos e assentos frios e se torne um lugar de novos e belos relacionamentos regados pelas Boas Novas com as quais o Pai nos ministra a cada domingo. Quem sabe agora, após tanto tempo que tivemos para reflexões e autodescobertas não nos tornemos mais parecidos com o Filho de Deus que veio para servir e não para ser servido (Mt 20.28). Quem sabe nosso coração não voltará mais sensível, mais aberto, e assim as palavras do profeta serão uma realidade quando diz: "E buscar-me-eis e me achareis quando me buscardes de todo o vosso coração" (Jr 29.13). Quem sabe, quem sabe…
Provavelmente muitos de nós temos chorado, como o salmista acima desejoso de estar novamente na sua cidade natal, quando nos lembramos da nossa igreja e de tudo o que ela representa. Para muitos de nós ela tem sido uma extensão das nossas próprias casas. Ao retornarmos teremos a oportunidade de mostrar para nós mesmos e para o outro o que o Senhor fez em nosso interior nesse kairos que ele providenciou mudando nossas agendas e nossos planos.
Que nossa ansiedade possa ser traduzida nas palavras de outro salmista quando declarou: "Alegrei-me quando me disseram: vamos à casa do Senhor". (Sl 122.1)
Sim, vamos. E levemos esta alegria de volta ao mundo que nos rodeia!
Tony
faos.ead@gmail.com
Saudade: esta era a palavra que sintetizava o que os judeus sentiam quando feitos cativos numa terra estranha e pagã. Distantes de casa, usavam a poesia do saltério para externalizar seus sentimentos e sonhos. A distante Sião, Jerusalém, era agora uma lembrança, um retrato na parede que os fazia viajar no imaginário trazendo à mente milhares de anos de uma cultura e de uma religião que os diferenciavam de todos os outros povos vizinhos. A terra para aquele povo sempre fora sinal de forte identidade e, principalmente, de comunhão com Yaveh, o Deus único e soberano que havia decidido se revelar ao mundo através deste povo nômade liberto das garras de uma nação pagã e peregrina por décadas em um deserto que os levaria a uma terra prometida. E estar longe do templo onde outrora adoravam ao seu Deus era talvez o pior dos castigos que o inimigo usurpador poderia lhes impor.
Assim como o salmista, vivemos nestes dias tempo de saudades. Saudades dos irmãos com quem orávamos, saudades do abraço gostoso após as reuniões, saudades das crianças correndo pelos corredores, saudades do bate-papo no salão durante o cafezinho após os cultos, saudades de sorrisos e palavras afáveis, saudades de cantarmos juntos hinos de louvor ao Nosso Deus, saudades do pão e vinho tomados juntos que são o memorial da obra salvífica de Cristo em nossas vidas, saudades do templo de quem fomos separados pelo vírus globalizado e invisível. Saudades, saudades…
O que aprender com tudo isso? Podemos ser outras pessoas ao retornarmos aos nossos encontros presenciais? Talvez sim. Quem sabe, a partir de agora, não aguardaremos o dia do Senhor com mais expectativa e o louvaremos com mais fervor e alegria. Quem sabe nos comportaremos com mais intimidade, levantaremos nossas mãos com mais ousadia, participaremos da ceia com mais santidade. Quem sabe deixaremos de ser meros ouvintes e expectadores e nos tornemos verdadeiros adoradores. Sabe aquele irmão ou irmã a quem você nunca deu um "bom dia, ou boa noite", quem sabe agora ele ou ela será seu parceiro de caminhada e de oração. Quem sabe você e eu olharemos para o outro com um olhar mais compassivo e lhe daremos um sorriso mais sincero. Quem sabe não riremos juntos a partir de agora contando e compartilhando nossas histórias. Quem sabe choraremos com as perdas uns com os outros como nunca fizemos. Quem sabe o templo passe a ser muito mais do que um simples prédio de tijolos e assentos frios e se torne um lugar de novos e belos relacionamentos regados pelas Boas Novas com as quais o Pai nos ministra a cada domingo. Quem sabe agora, após tanto tempo que tivemos para reflexões e autodescobertas não nos tornemos mais parecidos com o Filho de Deus que veio para servir e não para ser servido (Mt 20.28). Quem sabe nosso coração não voltará mais sensível, mais aberto, e assim as palavras do profeta serão uma realidade quando diz: "E buscar-me-eis e me achareis quando me buscardes de todo o vosso coração" (Jr 29.13). Quem sabe, quem sabe…
Provavelmente muitos de nós temos chorado, como o salmista acima desejoso de estar novamente na sua cidade natal, quando nos lembramos da nossa igreja e de tudo o que ela representa. Para muitos de nós ela tem sido uma extensão das nossas próprias casas. Ao retornarmos teremos a oportunidade de mostrar para nós mesmos e para o outro o que o Senhor fez em nosso interior nesse kairos que ele providenciou mudando nossas agendas e nossos planos.
Que nossa ansiedade possa ser traduzida nas palavras de outro salmista quando declarou: "Alegrei-me quando me disseram: vamos à casa do Senhor". (Sl 122.1)
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