Quanto ao MST - Carta de um cristão

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Quanto aos sem terra, carta de um cristão a seu amigo evangélico:

Caro amigo evangélico das periferias das grandes cidades e do campo de gente simples esquecida do mundo.

Também fui pobre de um bairro pobre em uma cidade de terra roxa das mais ricas do mundo no interior do Paraná. Me lembro da arrogância dos filhos dos fazendeiros latifundiários do clube 10, da inexistência social dos que não tem um "sobrenome", dos estudantes ricos do col. Mal Rondom. e o tratamento dado aos estudantes pobres.

E da total displicência dos governos em relação a juventude pobre desta cidade, que é igual a tantas outras deste país, que no máximo tem sua juventude considerada mão de obra barata pelos donos do poder desta região. Aqui começou o MST, quer gostemos ou não.

Me lembro das notícias dos bóias frias que morriam a cada acidente de caminhão, como eram levados como gado, morriam como os ruminantes. Aqui começou o MST, quer gostemos ou não.

Não me lembro de campanhas de oração nas igrejas da cidade por causas sociais, pra que Deus tivesse misericórdia de tudo isto que acontecia e ainda acontece, você sabe, nosso país ainda possui trabalho escravo e muitos trabalhadores "livres" só tem o nome de cidadãos.

Apenas dávamos nosso evangelho destituído de ação social ou posicionamento sócio-político, nunca nos importamos realmente com a miséria que nos cercava. Hoje nos importamos? Aqui começou o MST, quer gostemos ou não.

Você como jornalista deve saber que somos um dos países mais injustos socialmente deste planeta, e sabe como cristão que Deus nos pedirá contas de nossa passividade. Aqui começou o MST, quer gostemos ou não.

Seja em relação a concentração pornográfica de recursos, terras e dinheiro, ou em relação a violência de poucos. Aqui começou o MST, quer gostemos ou não.

Nada justifica violência de qualquer lado, inclusive do MST. Quer gostemos ou não.

Mas é importante também saber que um ser-humano sem esperança, privado de se desenvolver como ser humano é infligir a pior das violências, esta que rouba a imagem e semelhança de Deus em nós. Esta é mais sutil do que a violência física.

Vivi isto quando criança e você sabe disto. Hoje acredito que "Buscar em primeiro lugar o reino de Deus e a sua justiça" é a nossa mais profunda expressão de amor ao Pai, que nos fez homens no tempo e no espaço, para através da fé em Cristo Jesus sermos Sal e Luz por toda terra e nas mais densas trevas também no tempo e no espaço, em amor a Deus a aos outros como a nos mesmos.

A justiça de Deus não é conivente com a injustiça dos homens. Se os movimentos sociais tem problemas, nossa injustiça social que vem da concentração de tudo nas mãos de poucos, que gera falta de humanidade, é um imenso problema, tanto para os que tudo tem quanto para os que pouco ou nada possuem, ambos precisam de humanização e libertação. Já afirmava Paulo Freire em sua Pedagogia do Oprimido.

Se os cristãos orassem e se posicionassem firmemente a favor dos valores do Reino de Deus a míséria humana em nosso país seria bem menor. É o que me ensina Jesus, os profetas, Tiago, Wilbeforce, Luther King, Bonhofer, o Pr Jeremias Wrigth e tantos outros, e ainda eu e você. Talvez assim não seria necessária a existência do MST, nem dos "radicais" de esquerda, ou dos defensores dos direitos humanos, ou até mesmo assistentes sociais. Nós seríamos porta-vozes dos valores do Reino de Deus frente aos anti-valores das trevas. Seríamos realmente Sal e Luz.

Aqui as palavras de quem também viveu a dor da injustiça no campo, o boiadeiro Amós.

Amós 4
1 Ouvi esta palavra vós, vacas de Basã, que estais no monte de Samaria, que oprimis aos pobres, que esmagais os necessitados, que dizeis a vossos senhores: Dai cá, e bebamos.
2 Jurou o Senhor DEUS, pela sua santidade, que dias estão para vir sobre vós, em que vos levarão com ganchos e a vossos descendentes com anzóis de pesca.
3 E saireis pelas brechas, uma após outra, e sereis lançados para Harmom, disse o SENHOR.


Em homenagem a Ricardo Silva - um pobre brasileiro do Brasil de campos ricos.

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