Palavra do leitor
- 04 de setembro de 2009
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Quando a ética do reino se torna pedra de tropeço
A cidade de Corinto, na Grécia do século I de nossa era, assemelha-se às nossas metrópoles atuais. Alta densidade populacional (perto de 250.000 habitantes), com a maior parte do trabalho dedicado ao comércio, executado por pessoas das mais variadas partes do império romano, sem raízes. Reerguida pelo império, que a ela encaminhou grande quantidade de ex-militares como colonos, era uma mistura de escravos, livres, mercadores, filósofos, marinheiros e "promotores de toda a sorte de vícios".
Nesta cidade, Paulo chega para pregar o evangelho "com grande temor", sem seus companheiros habituais. A esta altura, já tinha sido apedrejado, açoitado, expulso de cidades; seu ministério em Atenas rendera apenas uma igreja.
Como ele prega? Faz sinais e maravilhas? Chama representantes das diversas correntes filosóficas e com elas debate?
"Não o fiz com ostentação de linguagem ou de sabedoria. Porque decidi nada saber entre vós, senão a Jesus Cristo, e este crucificado".
Ele discutiu sabedoria com alguns sim, mas aquela que é loucura para os gentios e escândalo para os judeus, e que é poder de Deus.
Quando leio estas palavras parece-me que o apóstolo está deixando bem claro que o núcleo de sua pregação não eram as questões éticas ou morais, ou as grandes discussões filosóficas do momento, mas que "de tal maneira amou Deus ao mundo que deu o Seu Filho Unigênito para que todo aquele que nEle crer não pereça, mas tenha a vida eterna".
Posteriormente ele escreve à igreja que deixa em Corinto, pastoreando-a. Ela é marcada por divisões internas, que usam apóstolos e evangelistas como "patronos" (Paulo, Pedo, Apolo); por espetáculos de embriaguez durante a ceia do Senhor; por comportamentos sexuais altamente reprováveis (o filho ter relações sexuais com a mulher do pai) até mesmo para a sociedade não cristã local; por disputas internas levadas ao tribunal civil...Quadro bem distante da igreja idealizada por nós hoje, quando imaginamos as comunidades cristãs do primeiro século muito superiores as nossas atuas. Na verdade, parece que pouco mudou, apesar de dois mil anos de discipulado...
Ele não apresenta aos gentios de Corinto a ética cristã - ele apresenta aos cristãos de Corinto a ética do Reino, e procura convencê-los que, ao confessarem Jesus como Senhor e Salvador, abraçaram um referencial teológico e ético específico. Aos não cristãos ele apresenta a mensagem do senhorio, da morte na cruz e ressurreição ao terceiro dia - a ética do Reino é para os convertidos.
Hoje parece existir uma confusão entre testemunho e pregação, entre Igreja e mundo. O testemunho único deveria ser a mudança de comportamento causada por um genuíno arrependimento (como João Batista demandou dos fariseus) daqueles que creram, secundado pelo amor mútuo. Ponto. Nada mais. Sem testemunhos de feitos milagrosos, ou benefícios pessoais, porque Paulo aprendeu que o "poder se aperfeiçoa na fraqueza" e que o poder real não é de mandar um monte se mudar de lugar, mas o da exposição do Evangelho através de um processo de convencimento intelectual, espiritual e psicológico contínuos. Este, um milagre muito maior que transplantar Everest de lugar.
Hoje o nosso testemunho como igreja não é diferente daquela comunidade grega. Quantos escândalos financeiros envolvem membros confessos de igrejas evangélicas? Quantos políticos batizados na fé da morte e ressurreição de Cristo adotam táticas de campanha absolutamente contrárias às normas do Reino? Pelo menos um alega ter sido abençoado repetidas vezes através de acertos em bilhetes de loteria, em um país repleto de miseráveis! Não somos conhecidos por sermos comunidades acolhedoras, mas por exigirmos santidade pessoal antes de participar dos cultos, por não acolhemos a todos, sem distinção de qualquer espécie.
Hoje alguns de nós querem impor ao mundo a ética do Reino, quando esta é compulsória apenas para aqueles que nele entram por livre escolha, sabendo que a porta é estreita, que sofrimentos existirão como consequência da escolha, e que nada é prometido a não ser que seremos tratados assim como Jesus o foi.
Hoje não vivemos segundo a ética do Reino, mas queremos impô-la àqueles a quem ela não faz nenhum sentido...
--
Postado também no Crer é Pensar
Nesta cidade, Paulo chega para pregar o evangelho "com grande temor", sem seus companheiros habituais. A esta altura, já tinha sido apedrejado, açoitado, expulso de cidades; seu ministério em Atenas rendera apenas uma igreja.
Como ele prega? Faz sinais e maravilhas? Chama representantes das diversas correntes filosóficas e com elas debate?
"Não o fiz com ostentação de linguagem ou de sabedoria. Porque decidi nada saber entre vós, senão a Jesus Cristo, e este crucificado".
Ele discutiu sabedoria com alguns sim, mas aquela que é loucura para os gentios e escândalo para os judeus, e que é poder de Deus.
Quando leio estas palavras parece-me que o apóstolo está deixando bem claro que o núcleo de sua pregação não eram as questões éticas ou morais, ou as grandes discussões filosóficas do momento, mas que "de tal maneira amou Deus ao mundo que deu o Seu Filho Unigênito para que todo aquele que nEle crer não pereça, mas tenha a vida eterna".
Posteriormente ele escreve à igreja que deixa em Corinto, pastoreando-a. Ela é marcada por divisões internas, que usam apóstolos e evangelistas como "patronos" (Paulo, Pedo, Apolo); por espetáculos de embriaguez durante a ceia do Senhor; por comportamentos sexuais altamente reprováveis (o filho ter relações sexuais com a mulher do pai) até mesmo para a sociedade não cristã local; por disputas internas levadas ao tribunal civil...Quadro bem distante da igreja idealizada por nós hoje, quando imaginamos as comunidades cristãs do primeiro século muito superiores as nossas atuas. Na verdade, parece que pouco mudou, apesar de dois mil anos de discipulado...
Ele não apresenta aos gentios de Corinto a ética cristã - ele apresenta aos cristãos de Corinto a ética do Reino, e procura convencê-los que, ao confessarem Jesus como Senhor e Salvador, abraçaram um referencial teológico e ético específico. Aos não cristãos ele apresenta a mensagem do senhorio, da morte na cruz e ressurreição ao terceiro dia - a ética do Reino é para os convertidos.
Hoje parece existir uma confusão entre testemunho e pregação, entre Igreja e mundo. O testemunho único deveria ser a mudança de comportamento causada por um genuíno arrependimento (como João Batista demandou dos fariseus) daqueles que creram, secundado pelo amor mútuo. Ponto. Nada mais. Sem testemunhos de feitos milagrosos, ou benefícios pessoais, porque Paulo aprendeu que o "poder se aperfeiçoa na fraqueza" e que o poder real não é de mandar um monte se mudar de lugar, mas o da exposição do Evangelho através de um processo de convencimento intelectual, espiritual e psicológico contínuos. Este, um milagre muito maior que transplantar Everest de lugar.
Hoje o nosso testemunho como igreja não é diferente daquela comunidade grega. Quantos escândalos financeiros envolvem membros confessos de igrejas evangélicas? Quantos políticos batizados na fé da morte e ressurreição de Cristo adotam táticas de campanha absolutamente contrárias às normas do Reino? Pelo menos um alega ter sido abençoado repetidas vezes através de acertos em bilhetes de loteria, em um país repleto de miseráveis! Não somos conhecidos por sermos comunidades acolhedoras, mas por exigirmos santidade pessoal antes de participar dos cultos, por não acolhemos a todos, sem distinção de qualquer espécie.
Hoje alguns de nós querem impor ao mundo a ética do Reino, quando esta é compulsória apenas para aqueles que nele entram por livre escolha, sabendo que a porta é estreita, que sofrimentos existirão como consequência da escolha, e que nada é prometido a não ser que seremos tratados assim como Jesus o foi.
Hoje não vivemos segundo a ética do Reino, mas queremos impô-la àqueles a quem ela não faz nenhum sentido...
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