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Palavra do leitor

Palavras de ordem, palavras vazias

Existem duas visões evangélicas da realidade e da história que são comodistas e, em alguns aspectos, ingênuas. Uma é otimista demais e a outra pessimista demais.

Explico-me. Tenho ouvido insistentemente a afirmação de que o "Brasil é do Senhor Jesus, povo de Deus, declare isso! " A ingenuidade está em pensar que o simples fato de desferir palavras de ordem ao vento, mudará uma realidade complexa. Gostaria muito que a realidade fosse mudada a golpes de palavras de ordem. Mas, para minha decepção não é isso que acontece. Eu ficaria muito triste se realmente o Brasil fosse de Jesus, vendo crescer a corrupção; a falta de vergonha da maioria dos políticos; o crescimento vertiginoso do número de participantes da parada do “orgulho” gay; a iniciação sexual cada dia mais cedo dos jovens; o aumento do consumo de drogas; a glamourização da ingestão de bebidas alcoólicas; a violência incontrolável; o abuso sexual de crianças; a exploração do trabalho infantil; a violência contra as mulheres; o abandono dos idosos; o caos no trânsito. E ainda sermos ao mesmo tempo o maior país católico, espírita e evangélico do mundo. Sim, somos tudo isso ao mesmo tempo e ainda, segundo o IBGE, cresce de forma significativa o número de ateus em nosso país. Ao longo desses anos, todas as palavras de ordem pronunciadas não foram capazes de mudar essa realidade.

Por outro lado, ainda sobrevive em alguns dos cristãos que ainda esperam a vinda do Senhor Jesus Cristo, aquele princípio de “quanto pior melhor”. É verdade que a Bíblia aponta para uma serie de sinais que são indicativos da vinda de Cristo e que em sua essência são catastróficos. Porém não devemos confundir a alegria com a expectativa da vinda do Senhor Jesus Cristo, da noiva que ansiosamente aguarda o seu noivo, com os sinais que antecedem essa vinda, caracterizados por vários acontecimentos dramáticos e ruinosos. Somos chamados a uma atitude misericordiosa, de compaixão e de amor. A nós, cabe alimentar e dessedentar o inimigo, como vemos na carta aos Romanos no capítulo 12. O juízo cabe a Deus. Muitas vezes, os cristãos usam essa visão para se acomodar frente aos desafios que têm no mundo, pois se Jesus disse que as coisas seriam assim, dramáticas e difíceis, temos que nos conformar. Mas, a Igreja enquanto estiver aqui, tem um papel profético e sacerdotal no mundo. Profético para confrontar este mundo mau com os valores do Reino de Deus "que não é comida nem bebida, mas justiça, paz e alegria no Espírito Santo" Romanos 14.17. E sacerdotal no papel de intercessora, de se apresentar diante de Deus intercedendo pelos perdidos.

A atitude cristã nem pode ser otimista, nem pessimista, tem que ser realista e proativa.
O cristão tem em primeiro lugar a obrigação de orar. Há uma determinação clara na 1ª Carta de Paulo a Timóteo no capítulo 2: “Antes de tudo, pois, exorto que se use a prática de súplicas, orações, intercessões, ações de graça, em favor de todos os homens”. A oração é a arma mais poderosa do Cristão para mudar a realidade. A Igreja tem desprezado a oração como instrumento de transformação da realidade. A oração tem que ser sempre o primeiro recurso.

Em segundo lugar é preciso uma atitude de inconformação, de insatisfação, como o apóstolo Paulo nos diz na Carta aos Romanos, capítulo 12: “não vos conformeis com este século”.

Em terceiro lugar, é preciso uma atitude de contestação. Os cristãos têm que se unir e se manifestar contra todas as coisas contrárias ao Reino de Deus. Precisamos erguer a nossa voz contra a injustiça, a corrupção, a imoralidade e a violência que estão entranhadas nas estruturas pecaminosas da nossa sociedade. Existe o pecado individual, que está presente na vida de cada pessoa. Mas, existe um pecado estrutural. O inimigo, de maneira astuta está agindo por meio das estruturas da sociedade, usando os legisladores, os governantes, os meios de comunicação, para atingir seus objetivos.
Por isso, precisamos nos mobilizar contra leis que exploram os trabalhadores; que defendem o aborto; que querem silenciar a voz da igreja quando esta diz que o homossexualismo é uma corrupção da criação de Deus que nos fez homens e mulheres.

Devemos nos mobilizar contra os meios de comunicação que estão destruindo os valores familiares, que estão fazendo com que o é certo pareça errado e o que é errado pareça certo.

Temos exemplos de cristãos que exerceram influência e produziram mudanças em seu tempo. Martin Luther King, na luta pelos direitos civis, que sem armas e sem violência, quebrou a força de um sistema iníquo, sistema que, era apoiado inclusive por igrejas. Podemos mencionar ainda, Desmond Tutu na África do Sul, William Wiberforce, na Inglaterra e Eduardo Carlos Pereira, fundador da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil, que foi um abolicionista e se posicionou contra a infâmia da escravidão no Brasil.
A igreja não pode deixar de orar, de demonstrar o seu inconformismo. Ela tem que erguer a sua voz.
Natal - RN
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