Palavra do leitor
- 30 de novembro de 2024
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Os Irmãos Karamázov
Na minha caminhada de leitor, iniciada na tenra idade lá no meu querido Ceará, já tive o prazer de me deparar com obras maravilhosas que ajudaram a formar meu caráter e minha personalidade. Aliás, livros são assim mesmo: precisam nos transformar, nos evoluir. Entre as obras que mais me inquietaram e desafiaram até hoje, do aspecto intelectual até o físico (confesso que o cansaço me fez pensar em desistir várias vezes diante das quase mil páginas - há outras versões com dois volumes), está, sem dúvidas, o romance policial escrito pelo filósofo russo Fiódor Dostoiévski. Refiro-me ao clássico "Os irmãos Karamázov", cuja leitura me dediquei por quase três meses durante o ano de 2024.
Nesta que é a última obra deste escritor russo, terminada em 1880, todas as questões trabalhadas pelo autor ao longo de toda sua trajetória recebem um tratamento aprofundado. O livro foi a ferramenta que Fiódor usou para tratar as inúmeras questões históricas, teológicas e morais que o atormentaram por décadas, e apresenta um grau de complexidade incomum. Não foi à toa que Freud e Nietzsche falaram dele como sendo a maior realização literária da história da humanidade.
Dentre as várias "máximas" encontradas no clássico, uma das mais polêmicas e marcantes certamente é: "Se Deus não existe, então tudo é permitido", atribuída a Ivan Karamázov, um dos personagens da obra em questão. Esta e outras afirmações mostram um pouco da cosmovisão de Fiódor, que tentou apresentar aos leitores o mundo de sua época, a alma e o coração dos homens, suas idiossincrasias marcadas pela política, religião e cultura vigente. Talvez aqui a palavra alemã "Zeitgeist", conjunto de ideias que caracterizam o espírito de uma época, seja a melhor tradução.
O livro é sim cansativo, detalhista nas suas explicações sobre o comportamento das pessoas, sobre o ambiente, principalmente na primeira metade. De repente, um parricídio (homicídio do pai pelo próprio filho) aumenta a temperatura da narração e leva o leitor a querer entrar dentro da história e descobrir quem é o assassino e quais foram as motivações para tal ato. E devido ao comportamento imoral do morto durante a vida, Fiodor Pávlovitch, o pai dos três filhos Karamazov (e de mais um possível quarto filho bastardo), há muitos suspeitos possíveis de ter tirado a vida do patriarca dessa família russa disfuncional.
E então se nos apresenta a incrível capacidade de Dostoiévski de prender seus leitores numa trama que se desenvolverá a cada página, levando-nos a uma verdadeira viagem às entranhas psicológicas do ser humano. Aprendemos muito com o autor que demonstra ser um grande conhecedor do coração do homem. Ao dissecar o interior dos filhos, parece que está falando de cada um de nós. Eles representam os vários tipos de pessoas que vivem deste lado da eternidade, cada uma com seus valores e princípios.
Dizem que Dostoiévski escreveu "Os Irmãos Karamazov" para ser uma condensação, um resumo do nosso tempo, uma espécie de "Ilíada" de Homero. Desconfio que tenha conseguido. Assim como "Hamlet" está para os ingleses, esta obra está para os russos. Mais do que um caso policial, o livro é um romance filosófico e é considerado por muitos a obra-prima de Fiódor. Ele tratou de maneira brilhante e professoral temas de sua época, como o fim da escravidão, a reforma judiciária, o espectro do socialismo, o embate entre a ortodoxia cristã e o liberalismo emergente na Europa, dentre outros.
Além de seu vasto conhecimento da cultura humana universal, cita várias passagens da Bíblia mostrando assim sua cosmovisão cristã não apenas aqui, mas em todas as suas obras (foi educado no cristianismo ortodoxo), embora tenha flertado com o ateísmo durante a juventude.
Seria muita pretensão minha resumir aqui tudo que se pode apreender desse magnífico clássico de Dostoiévski. Contudo, não poderia deixar de registrar minhas percepções e meu privilégio de poder ter caminhado nas páginas desta monumental obra que como tal, marcou a história da literatura mundial conquistando mentes e corações ao longo dos séculos.
Se você ainda não desfrutou dessa oportunidade única, o convido a fazê-lo assim que possível. Afinal, ler um clássico universal é viajar sem sair do lugar, é adentrar mundos distantes e ricos que nos farão acessar realidades outras, alargar nossa visão e nos fazer atores mais eficazes na compreensão do mundo ao nosso redor.
Tony Oliveira - Autor dos livros "Pingos da Graça" e "Cartas do Atlântico".
Para outros textos do autor, acesse: https://pingosdagraca.wordpress.com/
Contato: faos.ead@gmail.com INSTAGRAM: tonyoliveira_69
Nesta que é a última obra deste escritor russo, terminada em 1880, todas as questões trabalhadas pelo autor ao longo de toda sua trajetória recebem um tratamento aprofundado. O livro foi a ferramenta que Fiódor usou para tratar as inúmeras questões históricas, teológicas e morais que o atormentaram por décadas, e apresenta um grau de complexidade incomum. Não foi à toa que Freud e Nietzsche falaram dele como sendo a maior realização literária da história da humanidade.
Dentre as várias "máximas" encontradas no clássico, uma das mais polêmicas e marcantes certamente é: "Se Deus não existe, então tudo é permitido", atribuída a Ivan Karamázov, um dos personagens da obra em questão. Esta e outras afirmações mostram um pouco da cosmovisão de Fiódor, que tentou apresentar aos leitores o mundo de sua época, a alma e o coração dos homens, suas idiossincrasias marcadas pela política, religião e cultura vigente. Talvez aqui a palavra alemã "Zeitgeist", conjunto de ideias que caracterizam o espírito de uma época, seja a melhor tradução.
O livro é sim cansativo, detalhista nas suas explicações sobre o comportamento das pessoas, sobre o ambiente, principalmente na primeira metade. De repente, um parricídio (homicídio do pai pelo próprio filho) aumenta a temperatura da narração e leva o leitor a querer entrar dentro da história e descobrir quem é o assassino e quais foram as motivações para tal ato. E devido ao comportamento imoral do morto durante a vida, Fiodor Pávlovitch, o pai dos três filhos Karamazov (e de mais um possível quarto filho bastardo), há muitos suspeitos possíveis de ter tirado a vida do patriarca dessa família russa disfuncional.
E então se nos apresenta a incrível capacidade de Dostoiévski de prender seus leitores numa trama que se desenvolverá a cada página, levando-nos a uma verdadeira viagem às entranhas psicológicas do ser humano. Aprendemos muito com o autor que demonstra ser um grande conhecedor do coração do homem. Ao dissecar o interior dos filhos, parece que está falando de cada um de nós. Eles representam os vários tipos de pessoas que vivem deste lado da eternidade, cada uma com seus valores e princípios.
Dizem que Dostoiévski escreveu "Os Irmãos Karamazov" para ser uma condensação, um resumo do nosso tempo, uma espécie de "Ilíada" de Homero. Desconfio que tenha conseguido. Assim como "Hamlet" está para os ingleses, esta obra está para os russos. Mais do que um caso policial, o livro é um romance filosófico e é considerado por muitos a obra-prima de Fiódor. Ele tratou de maneira brilhante e professoral temas de sua época, como o fim da escravidão, a reforma judiciária, o espectro do socialismo, o embate entre a ortodoxia cristã e o liberalismo emergente na Europa, dentre outros.
Além de seu vasto conhecimento da cultura humana universal, cita várias passagens da Bíblia mostrando assim sua cosmovisão cristã não apenas aqui, mas em todas as suas obras (foi educado no cristianismo ortodoxo), embora tenha flertado com o ateísmo durante a juventude.
Seria muita pretensão minha resumir aqui tudo que se pode apreender desse magnífico clássico de Dostoiévski. Contudo, não poderia deixar de registrar minhas percepções e meu privilégio de poder ter caminhado nas páginas desta monumental obra que como tal, marcou a história da literatura mundial conquistando mentes e corações ao longo dos séculos.
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Tony Oliveira - Autor dos livros "Pingos da Graça" e "Cartas do Atlântico".
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