Palavra do leitor
- 25 de novembro de 2008
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Oração e psicanálise
A psicanálise é uma ferramenta para se entender a atividade mental humana e, como tal, revolucionou a imagem que tínhamos de nós mesmos. Ainda que não concordemos com a abordagem freudiana, outras se apresentam. Fatores antes ignorados ou não levados à sério passaram a contar na análise de situações, propostas de abordagens e em tomadas de decisões, seja em nível individual ou social.
Quando esta ferramenta é aplicada a uma tarefa complexa como é o ato de orar, muitos podem ser os objetivos, desde demolidores a aperfeiçoadores do mesmo. Nesta ótica, as dificuldades e receios do fiel (ou do não crente), os desvios e os autoenganos são alvos que podem ser buscados.
A psicanálise mostrou que nosso imaginário pode (e o faz) interferir no diálogo com Deus a ponto de não permitir que questões inconscientes aflorem de modo terapêutico, mas antes mantendo-as longe do consciente e, portanto, da capacidade do fiel de enfentá-las em conjunto com Ele.
Deus é alguém que nunca vimos, cuja imagem construimos por analogia a partir do mundo que conhecemos e que não nos responde pelas vias habituais. Decidir se, como e qual é a resposta é um exercício de fé que não está imune aos recôndidos de nossa alma. E é curioso que as Escrituras estimulam, e mesmo ordenam, a prática da oração, mas não dão diretrizes claras para distinguir a voz dEle da nossa inconsciente.
A psicanálise coloca em jogo inclusive o nosso desejo: aquilo que expressamos é o que realmente desejamos? Na sua face demolidora, afirma que toda resposta é suposta resposta, produto apenas de desejos não expressados.
Na sua oração didática Jesus pontuou "seja feita a Tua vontade assim na terra como no céu". Quando o colocado em oração é genérico (p. ex. a paz entre os homens, o fim da fome, a conversão do próximo) nada questiona a vontade de Deus. Caso a resposta demore, é porque faz parte dos Seus planos, está dentro de como Ele desenrola a história. Mas quando oramos por motivos pessoais (p. ex. a escolha profissional, a vocação sacerdotal) perscrutar o Seu desejo no meio do nosso torna-se uma tarefa prenha de armadilhas e enganos.
Segundo J.C. Sagne (La oracion, invocacion de la presencia invisible e silenciosa del Padre em Concilium 79, pg 319-329, 1972): "Quem ora pode desenvolver uma espécie de ateísmo espiritual em que as representações de Deus e os modos de oração, demasiadamente tomados pelo imaginário, levantam-se como barreiras contra a presença de Deus e como impedimento de sua livre intervenção". Supostos exemplos: quantas pessoas se tornam intolerantes, fechadas, descomprometidas à medida que se entregam a uma vida visível de oração? quantos se tornam acríticos e submissos? alheios e distantes do mundo real? quantos se distanciam mais e mais dos frutos do Espírito (amor, alegria, paz, paciência, amabilidade, bondade, fidelidade, modéstia e autodomínio) em direção aos do "instinto" (Bílbia do Peregrino): inimizadas, rixas, invejas, cólera, ambição, discórdias, facções)?
(texto produzido a partir do livro "Orar depois de Freud", de Carlos Domínguez Morano, Edições Loyola 1994)
Quando esta ferramenta é aplicada a uma tarefa complexa como é o ato de orar, muitos podem ser os objetivos, desde demolidores a aperfeiçoadores do mesmo. Nesta ótica, as dificuldades e receios do fiel (ou do não crente), os desvios e os autoenganos são alvos que podem ser buscados.
A psicanálise mostrou que nosso imaginário pode (e o faz) interferir no diálogo com Deus a ponto de não permitir que questões inconscientes aflorem de modo terapêutico, mas antes mantendo-as longe do consciente e, portanto, da capacidade do fiel de enfentá-las em conjunto com Ele.
Deus é alguém que nunca vimos, cuja imagem construimos por analogia a partir do mundo que conhecemos e que não nos responde pelas vias habituais. Decidir se, como e qual é a resposta é um exercício de fé que não está imune aos recôndidos de nossa alma. E é curioso que as Escrituras estimulam, e mesmo ordenam, a prática da oração, mas não dão diretrizes claras para distinguir a voz dEle da nossa inconsciente.
A psicanálise coloca em jogo inclusive o nosso desejo: aquilo que expressamos é o que realmente desejamos? Na sua face demolidora, afirma que toda resposta é suposta resposta, produto apenas de desejos não expressados.
Na sua oração didática Jesus pontuou "seja feita a Tua vontade assim na terra como no céu". Quando o colocado em oração é genérico (p. ex. a paz entre os homens, o fim da fome, a conversão do próximo) nada questiona a vontade de Deus. Caso a resposta demore, é porque faz parte dos Seus planos, está dentro de como Ele desenrola a história. Mas quando oramos por motivos pessoais (p. ex. a escolha profissional, a vocação sacerdotal) perscrutar o Seu desejo no meio do nosso torna-se uma tarefa prenha de armadilhas e enganos.
Segundo J.C. Sagne (La oracion, invocacion de la presencia invisible e silenciosa del Padre em Concilium 79, pg 319-329, 1972): "Quem ora pode desenvolver uma espécie de ateísmo espiritual em que as representações de Deus e os modos de oração, demasiadamente tomados pelo imaginário, levantam-se como barreiras contra a presença de Deus e como impedimento de sua livre intervenção". Supostos exemplos: quantas pessoas se tornam intolerantes, fechadas, descomprometidas à medida que se entregam a uma vida visível de oração? quantos se tornam acríticos e submissos? alheios e distantes do mundo real? quantos se distanciam mais e mais dos frutos do Espírito (amor, alegria, paz, paciência, amabilidade, bondade, fidelidade, modéstia e autodomínio) em direção aos do "instinto" (Bílbia do Peregrino): inimizadas, rixas, invejas, cólera, ambição, discórdias, facções)?
(texto produzido a partir do livro "Orar depois de Freud", de Carlos Domínguez Morano, Edições Loyola 1994)
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