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Palavra do leitor

O Vampiro que habita em mim

Domingo de páscoa. Jesus deu seu sangue e ressurgiu dos mortos. Mesmo assim uma criatura dentro de mim se espreita por detrás de minhas palavras, sutilezas e comportamento: um vampiro. Ao contrário de Jesus, ele não quer dar seu sangue, ele quer sugar o sangue dos outros. Ele tampouco ressurgirá no domingo como fez Jesus, mas andará mais morto do que vivo, pálido, sôfrego e insaciável. Ele é o vampiro que habita em mim.

Os vampiros estão com tudo. Séries de TV, blockbusters de Hollywood, livros e tudo o mais. Nós evangélicos como é nosso cacoete estamos preocupados e já começamos a nos movimentar com livros e pregações em nossos púlpitos sobre o perigo que representa esse vampirismo generalizado para fé que “de uma vez por todas foi dada aos santos.”
Mas os monstros criados pela mente humana são projeções simbólicas das partes mais assustadoras que vivem dentro de nossa alma. Eis que o vampiro não está nas telas, nem nos livros mas sim dentro de mim.

Cuide bem do seu amor, recomenda Herbert Vianna em canção inspirada e cada relacionamento de amor demanda cuidado. Mas algo de podre acontece quando cruzamos a fronteira invisível do cuidado e chegamos na terra do controle: nos tornamos vampiros daqueles que amamos.

O texto de I Reis 12 nos fala do filho de Salomão que apesar da grande fama de sábio havia esgotado o povo de Israel durante 40 anos a fim de manter o ritmo nababesco de obras de Jerusalém. Roboão queria ir mais longe, queria sugar um pouco mais e o resultado foi ruptura. Quem convive com vampiros sofre, perde a espontaneidade, cuida cada passo que dá, não respira e acumula um desejo de libertação que ás vezes surge como violência de atitude e palavras. Violência gera violência.

Existem vampiros em todos os relacionamentos. Há vampiros entre amigos. São os super carentes que querem se assegurar que vamos sempre ter o melhor tempo para eles, as palavras exclusivas e que eles vão habitar o pedestal supremo de nossa afeição. Não querem ser um amigo, querem ser o amigo. Querem saber o que vamos fazer e tomar decisões por nós.

Há esposas e maridos vampiros. Estes podem ligar a cada minuto e momento para o outro querendo saber onde estão e o que fazem, com quem andam. Querem ter a certeza que sua alma não será machucada como talvez um dia foi, mas tentando preservar a alegria dentro de si a matam no outro. Vigio diariamente para não cruzar essa fronteira. Tenho um amigo que até dentro do banheiro entra, quando a esposa está lá. Não permite que a esposa faça nada sozinha.

Existem patrões vampiros. Não se contentam com o trabalho dos empregados, querem a alma inteira. Um desses que eu conheço uma vez disse quando escalou os empregados para trabalharem sete dias ininterruptamente e ouviu a chiadeira das esposas: “Perguntem a suas esposas o que elas preferem, os maridos trabalhando no final de semana ou em casa e desempregados. Patrões assim querem colocar na cabeça do empregado que ele não terá vida fora da empresa.

Há pais e filhos vampiros. O mundo é assustador, furioso mais do que nossos filhos podem imaginar. Eles querem voar, mas nós queremos um cordão que os mantenha em segurança. Então sufocamos nossos filhos, não permitimos que eles corram riscos (que nós quando mais novos queríamos correr sozinhos). Lembro de mentir para a professora quando as escolas eram ainda ingênuas e os professores acreditavam em meninos de seis anos que meu pai ia me pegar mais cedo na escola para me levar ao médico. Tudo porque eu queria experimentar a sensação e a aventura de voltar para casa sozinho. Mas hoje quando minha filha de 16 anos quer sair do ninho, o vampiro ataca. Quero controle, não quero vê-los chorar, a dor deles será bem maior em mim, eu sei. Mas há filhos vampiros também. Filhos que não crescem, com síndrome de Peter Pan, não querem sair de casa, ou quando saem de casa, a casa não sai deles, são vampiros dos pais exigindo-lhes atenção prioritária e privilégios de uma criança de oito anos de idade.

Há pastores vampiros. Não se contentam em pregar, querem obediência sem consciência. Querem se certificar que a ovelha seja igual no jeito e no trejeito. Querem que cada decisão tenha sua chancela. Conheci um rapaz cristão que não podia conversar com os amigos sem a presença do discipulador. O cuidado virou controle.
Há crentes vampiros, cometem o pecado essencial do paganismo, tiram Deus do trono e querem que Ele seja seu garoto de recados, atento a cada desejo e vontade. Pessoalmente entrei muitas vezes em crise quando encontrava paradoxos na Bíblia. Mas que grande libertação foi para mim desistir de controlar e explicar Deus. Um peso saiu de minhas costas.

Domingo de páscoa. Jesus deu seu sangue para que todo vampiro sacie sua sede nele e comece a viver e a deixar os outros viverem!

Um abraço quebra costelas.

O discípulo gaudério.
Pelotas - RS
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