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Palavra do leitor

O que é uma vida cristã desequilibrada?

Numa manhã de domingo quando fiz esta pergunta aos meus alunos da Escola Bíblica Dominical, algumas pessoas entendiam o desequilíbrio na vida cristã como quando um crente vive uma vida no pecado. Todavia, quando isso acontece não há um desequilíbrio, mas uma abandono da fé e da práxis cristãs. Ainda que a pessoa mantenha a crença no discurso do evangelho, sua conduta entra em contradição com ele.

O desequilíbrio acontece quando uma parte ou um lado é mais acentuado que outro, neste caso o que ocorre é uma caricaturização da vida cristã. Isso mesmo, a vida cristã é vivida como se fosse uma caricatura, onde o exagero destaca algumas características deformando a aparência, deixando-a, na melhor das intenções, cômica.

Segundo Stott, o equilíbrio está associado a compreensão da nossa identidade como discípulos de Jesus, visto que “a razão de quase todas as nossas falhas é a facilidade que temos de esquecer nossa identidade como discípulos.”[1] Partindo do texto de 1 Pedro 2.1-17, Stott nos apresenta seis facetas que compõe a vida cristã:

- Como crianças recém-nascidas, somos chamados a crescer;
- Como pedras vivas, somos chamados à comunhão;
- Como sacerdotes santos, somos chamados à adoração;
- Como povo de propriedade de Deus, somos chamados ao testemunho;
- Como estrangeiros e peregrinos, somos chamados à santidade;
- Como servos de Deus, somos chamados à cidadania.[2]

Stott conclui seu pensamento sobre identidade e equilíbrio dizendo: “Em cada par, somos chamados ao equilíbrio e não à ênfase de um em detrimento do outro. Assim, somos tanto discípulos individuais quanto membros da igreja, tanto adoradores quanto testemunhas, tanto peregrinos quanto cidadãos.”[3]

Outro anglicano com quem aprendi o que era uma vida cristã desequilibrada foi o saudoso Dom Robinson Cavalcanti, que no 36º Encontro da Sepal, comentou que no Brasil, percebia uma espécie de espiritualidade fragmentada em três grupos:

-os da espiritualidade mística – são aqueles que valorizam a adoração, limitando-a a algumas práticas ou disciplinas espirituais. Desprezam a reflexão, desconhecendo o seu valor. A expressão desta espiritualidade encontra-se apenas na experiência, nas emoções e o discernimento é resultado de uma sensação!

-os da espiritualidade academicista – são aqueles que supervalorizam a reflexão, mas possuem pouco ou nenhuma expressão ativa na igreja ou na sociedade. Muitos acabam sendo academicistas, conhecedores das doutrinas, de filosofias, da hermenêutica/exegese e outras ciências bíblicas, mas sem relevância, pois ficam enclausurados em suas torres de marfim.

-os da espiritualidade ativista – são aqueles que não são ociosos no serviço, são os workaholic da fé, muito atarefados em suas comunidades de fé ou naquilo que chamam/entendem como obra do Senhor, mas sem vida devocional. Os tais gastam tempo com a obra de Deus, mas não com o Deus da obra.

Essas propostas de espiritualidades que acabam representando o muito do que vemos em nossas igrejas, ou melhor, na vida de muitos irmãos e inclusive na nossa também, são doentias. A fragmentação, o fato de encarem a relação com Deus, consigo e com o outros apenas por um víeis acabam limitando a relação dessas pessoas com a realidade que as cercam.

Para tanto, uma espiritualidade centrada só na adoração, mas que despreza a reflexão é mística (baseado no oculto, no desconhecido, tudo é mistério!!!) e alienada, pois busca apenas o vertical. Uma espiritualidade centrada apenas na reflexão, mas que não age é apenas academicista. Uma espiritualidade centrada apenas em ações, mas que não adora, não valoriza a vida devocional é ativista. Logo, para que seja saudável precisa ser integral e para isso tem que estar estruturada sobre os pilares da adoração, da reflexão e da ação.

O interessante é que esses dois teólogos anglicanos não estão falando de pontos antagônicas, pois as facetas que compõem a identidade do discípulo apresentadas por Stott estão inclusas nos fragmentos que compõem a espiritualidade integral anunciada por Dom Robinson. Logo, se queremos alcançar ou manter o equilíbrio, precisamos aprender a conciliar esses fragmentos e aquelas facetas.

________________________________________________________
Notas
[1]STOTT, John. O Discípulo Radical. Editora Ultimato: Viçosa. 2011, p.84
[2]Idem, p.83
[3] Idem, p.84
Arapiraca - AL
Textos publicados: 23 [ver]
Site: http://www.zebruno.wordpress.com

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