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Palavra do leitor

O Deus objeto

A tida sociedade permeada pelas marcas do pós - modernismo alberga a pluralidade, a informação em tempo real, a volatilidade como uma de suas mais expressivas características.

Bastas atentarmos, por um reles segundo, e constataremos o quanto o cotidiano desperta um estado de ser necessário mais horas. Não por menos, tresloucados acordamos e nem sequer conseguimos repousar. Nada de silêncio (este, um personagem indigesto). Muito menos deve ser dado espaço para o ócio, a elucubração, o melódico, a prosa descompromissada, o lúdico...

Sem titubear, aspiramos participar das engrenagens de um consumismo endêmico, custe o que custar. Independentemente da cacofonia metropolitana, das pessoas adelgaçadas nos trens e ônibus, das mazelas estampadas aqui e acolá (um garoto de dez anos se suicida e põe a vida de semelhantes em risco, numa escola de São Caetano do Sul; judeus e palestinos prosseguem a desfiar as rusgas de um problema não tratado por Abraão, apenas para citar).

De tudo isso, os cristãos enfrentam, no soar deste século, o dilema a efeito de decidir e responder por uma relação com Deus na liberdade firmada por Cristo, ou trilhar por mecanismos e sistemas religiosos (sem nos levar a uma profundidade do ser, da existência, da espiritualidade).

Vale dizer, uma liberdade plena, desenvergonhada, franqueada e aberta a nos lançar em direção a obediência reconciliadora e tal assertiva faz com que venhamos compreender a relevância de dependermos da Graça e não de incorremos na panacéia de um evangelho meritório, idealístico e altruísta para lograrmos alguma coisa. Na contramão de uma tragédia cosmológica, o Messias decidiu por resgatar a existência humana, mediante a postura da obediência.

Sem titubear, a trajetória de Jesus sempre esteve alderedor dos meandros da vida - ''como ela é'' (da mulher samaritana; do coletor de impostos; do centurião romano; da mulher hemorrágica; dos leprosos e tantas outras personalidade e não caricaturas).

Em outras palavras, através de Jesus, o eterno, o transcendente, a mística das boas novas, a esperança ativa e consoladora andou pelas ambigüidades, pelas tensões, pelas vicissitudes e pelas penúrias de uma Jerusalém malogradas nas suas tradições, espoliada por Roma e eqüidistante de si mesma. Mesmo assim, a Torá, Javé e os ritualismos permaneciam para consagrar as manifestações do Deus objeto, cujas pessoas não eram levadas a uma genuína restauração de personalidade. Entrementes, as almas carregavam os seus recônditos de possuírem uma fé, um Deus, uma tradição e sei lá mais o que.

Lastimavelmente, o Deus objeto está reduzido a uma escancarada postura de utilidade. Afinal de contas, o Deus objeto pode ser encontrado nos pacotes de ofertas em prol de uma salvação de lambuja e de incomensuráveis satisfações. Nesse itinerário, as boas novas se adaptam ao balaio de gato de uma espiritualidade sem a autêntica remissão dos pecados. Semelhantemente a Jonas, prosseguem no ventre ou no estado de uma abissal solidão espiritual e existencial.

Por conseqüência, o Deus objeto acaba inserido na amalgama de uma realidade desafeita ao próximo, ao destino e ao porvir. De certo, predomina a diretriz de um evangelho de anônimos e desencarnados do amor ao próximo. Tetricamente, o Deus objeto espelha uma geração de pessoas seguidoras e cultuadoras de uma vida descartável e regidas pelas tendências do mercado.

Eis a tônica de um evangelho secularizado, no aspecto mais pejorativo, e desvencilhado da palavra profética, da ressurreição, da remissão de toda uma vida chafurdada pela culpa e pela condenação. Por ora, torna – se fundamental pararmos e quem sabe decidirmos pelo ser livre constituído por Cristo.
São Paulo - SP
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