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Palavra do leitor

O declínio do próximo

‘’Falamos com paixão colossal, com relação a uma urgente ênfase sobre missões transculturais, mas o por qual motivo relutamos tanto e com tantas argumentações no que toca a vida de fé em comunidade, ao partilhar da Graça com outros irmãos, a um compromisso autêntico com o próximo? Quem sabe, será pelo receio de sermos vistos, como os demais, vulneráveis e dependentes da Graça da interdependência?’’

Vivemos um momento de crise? A denominada sociedade pós-moderna trilha por um estado de colapso ou ruptura, ao qual denota a palavra crise? Em meio as mais recentes ocorrências, já no desfechar das derradeiras eleições para presidente, percebemos o quanto os ânimos prosseguem acalorados. As vias de ecos por mudanças e refutações impetuosas, com relação ao estabelecido, ecoam pelas redes sociais e, provavelmente, arrefeceram no transcorrer dos ponteiros do tempo. Agora, torna-se nítido ponderarmos sobre o declínio do próximo. Não por menos, estamos diante ou não de uma realidade profundamente ancorada relativismo, a ética do descartamento, ao mais acerbado individualismo e nada mais? Vale dizer, de maneira podemos delimitar aqui, ao folhear a dinâmica da história, de todos os dias, cada vez mais, encontramos a intolerância, a hostilidade, a imputação de culpa ao próximo (o vetusto conflito entre judeus e palestinos, por exemplo; os focos de violência descambadas, como os homicídios fluentes nas periferias, caso de Belém do Pará e outros Estados). Dou mais uma pincelada, as colisões verbalizadas entre os defensores e opositores do atual governo, como, mais recentemente, protagonizado na Avenida Paulista. Sem sombra de dúvida, ciente de ser inviável traçar uma reflexão alinhada, em função das complexas engrenagens que pintam um quadro de irreversibilidade deste mundo, como cristão me questiono sobre se caminho na direção do maior dos mandamentos? Afinal de contas, como fingir, tentar esconder os fatos, tentar sublimar e acomodar a narrativa do amai ao próximo, como a ti mesmo?

Deveras, não dá, torna-se uma perda de recursos, um desperdício sem precedentes. As palavras de Jesus resgatam o próximo, independentemente das idiossincrasias sociais, étnicas, culturais, históricas, geográficas. Eis o calcanhar de aquiles das alas dos fariseus, dos saduceus, dos zelotes, dos essênios e outros da época do Messias carpinteiro e figura do dia a dia, ao lado de gente personificada pelas interpretações doentias da maioria. Ora, a mulher levada, por adultério, a um apedrejamento público, ao quais seus algozes alentavam enredar Jesus, nas suas conveniências, no conformismo de é assim e sempre foi assim mesmo, no retrato de uma fé institucionalizada, de uma revelação apropriada por um povo escolhido e acabou.

Estranha-nos, a princípio, se partirmos por uma visão legalista do evangelho, como Jesus teima, bate o pé, não abre mão de o sacrifício a ser consumado na Cruz, sempre visou a reconciliação e a importância do próximo. De certo, os cristãos debutantes, conforme o texto de Atos 02.42 a 45 relata não foram seguires de um herói religioso, de um portador de uma ética suprema e revolucionária, de uma política promotora e consolidadora de um sistema social de bem-estar social, de um discurso voltado a aguardar o ressoar da trombeta ou um vida melhor. Diametralmente, oposto, consegue-se extrair o quanto resgatavam o próximo, não eram omissos e indiferentes diante do declínio imposto aos desesperançados e excluídos. Infelizmente, o aflorescer de uma vida franca, séria e aberta as ambiguidades e tensões da existência, sem ícones, ídolos, lideranças personalistas e dotadas de poderes especiais, sucumbiu com a ascensão de toda uma hierarquia, ao qual acarretou uma profunda separação entre escolhidos e meros escutadores.

Tristemente, a adornada igreja se esquivou de uma reflexão vertical e passou a ser senhora de si, detentora do bem e do mal, do certo e do errado. Para piorar a situação, o coração – útero da cristandade, em outras palavras, a revelação e redenção de Deus em Jesus Cristo tem sido renegada por uma perspectiva de princípios estoicos e platônicos, por uma proposta de oferecer ao ser humano uma roupagem de boas condutas; a salvação vista como um processo de progresso e aperfeiçoamento perene; o perdão como um redução das distâncias entre as pessoas. Mesmo assim, não caminhamos para uma vida de guetos virtuais, da aplicação do descartamento (quando os ajustes são condição sine qua non para a alteração de um contexto autodestrutivo?).

De maneira efetiva, olhamos para o próximo como um alvo a ser derrubado, uma bomba a ser lançada, uma desprezo a ser desferido, uma condenação a ser efetuada. Por consequência, quantos não torcem o nariz, ao ouvir o amai ao próximo, como a ti mesmo? De notar, o triunfalismo, o ufanismo, o sucesso da fé mercantilista não se coaduna com o serviço da confissão, do discipulado e da renuncia, sem nenhuma postura estúpida.
São Paulo - SP
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