Palavra do leitor
- 13 de fevereiro de 2009
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O acidente
Dia desses, a mãe levava suas filhas para a escola. Dia alegre, de ansiedade, pois era o primeiro dia de aula! Cheirinho de material novo na mochila, expectativa dos pais para saberem como as filhas reagiriam, levantar mais cedo, aquele corre-corre natural e esperado por conta do novo horário da família.
Saindo todos, a primeira frustração aconteceu algumas quadras à frente de casa. Parecia uma conspiração, todos os pais, com as mesmas expectativas, se encontraram em um cruzamento próximo. O congestionamento permitiu que uns se acalmassem, outros ficassem irritados. Outros, indiferentes, conversavam com os filhos, últimos conselhos: Cuidado com isso! Cuidado com aquilo! Não aceite nada de estranhos... E também aqueles que, dando péssimo exemplo, inventavam atalhos no meio do trânsito. Por algum motivo, acham-se mais espertos, irritando os demais.
O trânsito finalmente flui e o carro ganha velocidade, trazendo certo alívio. Próximo ao destino, cuidado com aquele acesso à direita... Uma das filhas, sentido a proximidade da escola, se solta do cinto de segurança e feliz da vida começa a colocar sua mochila, orgulhosa, com seus sonhos de menina, gritando com a mãe: "Estamos chegando!".
Num momento de distração, o carro bate na mureta de proteção divisória das pistas. No impacto, tomba e, antes que qualquer pessoa pudesse se dar conta do que aconteceu, o carro está de cabeça para baixo, as rodas girando no ar...
A filha mais nova chama pela mãe, a mãe chama pelas filhas. Algumas pessoas se aproximam do carro, buscando ajudar de alguma maneira. A emergência já foi acionada. A filha mais velha, dez anos, não responde. O nervosismo toma conta da mãe. Na rua, a pequena multidão tenta consolar a família: "não é nada", dizem. Pensando no pior, mas ainda com esperança, a mãe, confusa, aceita a solidariedade de estranhos.
A filha silenciosa não responde. E assim fica até a chegada do serviço de emergência. No pronto-socorro, apesar dos esforços da equipe médica, ela permanece muda, calada para sempre.
Nessa hora, as palavras não fazem sentido, sentimentos reprimidos vêm à tona, a solidariedade é vã, a dor é insuportável! Culpa, raiva, desespero, angústia, perplexidade... O que pode trazer consolo? A vida torna-se insuportável, todas as demais coisas são colocadas em sua verdadeira perspectiva.
Diante do quadro de uma criança deitada no caixão e agarrada ao seu ursinho de pelúcia, uma lucidez incrível nos atinge. Os verdadeiros valores vêm à tona, como uma bóia impossível de ser mantida no fundo do mar a nos empurrar para a realidade da vida.
O futuro escapa, o passado nos alcança e o presente se funde nos dois, deixando de existir. A noção de tempo se perde no meio da dor. Percebemos que podemos corrigir erros, viver mais e correr menos. Tudo é possível, menos encarar o mistério da morte com suas perguntas sem respostas. No íntimo, sabemos que aquela mãe somos nós. Meu filho poderia ser a vítima. O espertinho do trânsito torna-se ridículo.
Uma criança que morre é como a promessa de uma colheita que foi frustrada! Se na sua morte nada mais parece ter sentido, em seu sorriso podemos renovar nossa esperança!
Choramos, muito mais pela criança que em nós morreu: nossa capacidade de viver intensamente, de amar sem reservas, de perdoar sempre, de sorrir por qualquer bobagem, de acreditar sem dúvidas, de aceitar que a vida e a morte são mistérios.
Meu Deus, como preciso voltar a ser criança!
Saindo todos, a primeira frustração aconteceu algumas quadras à frente de casa. Parecia uma conspiração, todos os pais, com as mesmas expectativas, se encontraram em um cruzamento próximo. O congestionamento permitiu que uns se acalmassem, outros ficassem irritados. Outros, indiferentes, conversavam com os filhos, últimos conselhos: Cuidado com isso! Cuidado com aquilo! Não aceite nada de estranhos... E também aqueles que, dando péssimo exemplo, inventavam atalhos no meio do trânsito. Por algum motivo, acham-se mais espertos, irritando os demais.
O trânsito finalmente flui e o carro ganha velocidade, trazendo certo alívio. Próximo ao destino, cuidado com aquele acesso à direita... Uma das filhas, sentido a proximidade da escola, se solta do cinto de segurança e feliz da vida começa a colocar sua mochila, orgulhosa, com seus sonhos de menina, gritando com a mãe: "Estamos chegando!".
Num momento de distração, o carro bate na mureta de proteção divisória das pistas. No impacto, tomba e, antes que qualquer pessoa pudesse se dar conta do que aconteceu, o carro está de cabeça para baixo, as rodas girando no ar...
A filha mais nova chama pela mãe, a mãe chama pelas filhas. Algumas pessoas se aproximam do carro, buscando ajudar de alguma maneira. A emergência já foi acionada. A filha mais velha, dez anos, não responde. O nervosismo toma conta da mãe. Na rua, a pequena multidão tenta consolar a família: "não é nada", dizem. Pensando no pior, mas ainda com esperança, a mãe, confusa, aceita a solidariedade de estranhos.
A filha silenciosa não responde. E assim fica até a chegada do serviço de emergência. No pronto-socorro, apesar dos esforços da equipe médica, ela permanece muda, calada para sempre.
Nessa hora, as palavras não fazem sentido, sentimentos reprimidos vêm à tona, a solidariedade é vã, a dor é insuportável! Culpa, raiva, desespero, angústia, perplexidade... O que pode trazer consolo? A vida torna-se insuportável, todas as demais coisas são colocadas em sua verdadeira perspectiva.
Diante do quadro de uma criança deitada no caixão e agarrada ao seu ursinho de pelúcia, uma lucidez incrível nos atinge. Os verdadeiros valores vêm à tona, como uma bóia impossível de ser mantida no fundo do mar a nos empurrar para a realidade da vida.
O futuro escapa, o passado nos alcança e o presente se funde nos dois, deixando de existir. A noção de tempo se perde no meio da dor. Percebemos que podemos corrigir erros, viver mais e correr menos. Tudo é possível, menos encarar o mistério da morte com suas perguntas sem respostas. No íntimo, sabemos que aquela mãe somos nós. Meu filho poderia ser a vítima. O espertinho do trânsito torna-se ridículo.
Uma criança que morre é como a promessa de uma colheita que foi frustrada! Se na sua morte nada mais parece ter sentido, em seu sorriso podemos renovar nossa esperança!
Choramos, muito mais pela criança que em nós morreu: nossa capacidade de viver intensamente, de amar sem reservas, de perdoar sempre, de sorrir por qualquer bobagem, de acreditar sem dúvidas, de aceitar que a vida e a morte são mistérios.
Meu Deus, como preciso voltar a ser criança!
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