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Palavra do leitor

Ego ferido e amor não correspondido

Um soldado convocado para servir ao exército longe de casa, sentindo-se solitário no quartel, foi surpreendido ao receber uma carta da namorada comunicando-lhe o fim do namoro de mais de um ano. Pedindo de volta sua foto, a garota machucou ainda mais o coração do rapaz. Sentindo-se arrasado e sem querer ficar por baixo, surgiu-lhe uma brilhante ideia: reuniu inúmeras fotos de mulheres desconhecidas com a ajuda de amigos e as enviou para sua namorada com os seguintes dizeres: "Não lembro qual dessas era você. Favor pegar a sua e mandar as outras de volta!"

A paráfrase acima veio de um livro didático de ensino confessional para alunos de ensino fundamental II. Dentre outros fatos que podem ser confirmados nesse relato, um deles é a de que o ser humano com seu ego ultrassensível não tem estrutura suficiente para ser rejeitado sem ressentimento ou recorrer a desforra. Por outro lado, a sensação de ser visto como desprezado e humilhado é capaz de tornar o vilipendiado um paciente de consultório psiquiátrico.

No capítulo 7 do livro Deixem que Elas Mesmas Falem, o saudoso pastor e escritor Elben M. Lenz César comentando sobre a esposa de Potifar (Gn 39) apaixonada pelo moço hebreu José (em sua tentativa frustrada de seduzi-lo), frisou que "amor não correspondido gera ódio". No entanto, o contexto desse tipo de "amor" não passaria de mágoa vingativa pela paixão desapontada - como ocorre nos dias atuais nos reiterados discursos publicados ou "autoafirmados" de "amor-próprio".

A fábula da "Raposa e as uvas" nos apresenta o referido animal contemplando e desejando intensamente um cacho de uvas belas e maduras, porém ao pular com toda avidez e esforço (sem êxito) para apanhar os frutos na parreira, mesmo após repetidas tentativas, conta-nos a estória que a raposa desiste chateada pelo insucesso de não conseguir alcançar as deliciosas uvas cobiçadas, afirmando que estavam verdes, azedas e nem eram tão bonitas assim...

Semelhantemente, pode-se comprovar que a "alienação" no caráter e a "negação" (freudiana) são componentes que acompanham um ego ferido, machucado emocionalmente e maculado moralmente pelo rancor de uma alma doente. Nesse contexto, o "amor não correspondido que vira ódio" reflete tanto a realidade de que todo apaixonado é egoísta (e cego) quanto o perigo do delírio da paixão - que não deixa de ser uma real bomba-relógio.

Para o cristão, o ego do pecador salvo precisa ser regenerado pela sua união com a Pessoa de Cristo, estando num constante processo de santificação da nova criatura através da morte diária para os impulsos da carne. Dessa forma, longe de impecabilidade, perceber-se-á os inúmeros riscos do "eu orgulhoso" e a necessária transformação do ego inflado, como aponta o excepcional livreto do pastor Timothy Keller (Ego Transformado) sobre a verdadeira humildade que brota do evangelho e a prática do autoesquecimento libertador, a qual é concretizada pela ação do Santo Espírito.

Outro livrinho complementar e gostoso de se ler nessa linha é o intitulado Pensamentos Transformados, Emoções Redimidas - Ricardo Barbosa. Na página 80, o autor escreveu que "tanto a pessoa que ama quanto a que é o alvo do seu amor nutrem expectativas diferentes, muitas vezes abstratas e confusas como sendo amar e ser amado. Isso aumenta o sentimento de carência, solidão e incompreensão".

Embora ninguém deva ser obrigado a amar alguém ou ser culpado por não corresponder às suas expectativas neste sentido, sabe-se que bem diferente é defraudar outras emocionalmente ou brincar com sentimentos alheios. Ao mesmo tempo, contrariando uma busca recíproca de intenções e desejos quando se trata de sexo oposto - nada a ver com teoria de um amor que se torna irresistível pela barganha caprichada, compaixão e piedade ou dívida de gratidão tornada amor pelo constrangimento do coração de pedra tornando algodão -, exceções à parte, todo amor verdadeiro e desinteresseiro tende a ser reconhecido, sem precisar ser no mesmo tom retribuído.

No entanto, importa saber que, muitas vezes, o "tudo" de alguém apaixonado para outro desapaixonado é nada, enquanto o "nada" de outro (que nem precisa fazer esforço algum) para esse alguém interessado é tudo. Por quê? Porque a vida é assim. Renê Girard explicaria genialmente. Bem antes de Jacó, Raquel e Lia (Gn 29:30), assim caminha a humanidade, relembrando o enredo de muitas vidas, registrado em "Quadrilha" de Carlos Drummond de Andrade.

Assim, lembremos que a Pessoa mais rejeitada, desprezada e traída do universo nos convida a aprender dEle em mansidão, humildade, perdão e verdadeiro amar. Portanto, a real cura do ego ferido e amor não correspondido passa pela aceitação do convite de libertação divina, a fim de que tenhamos pensamentos transformados e emoções redimidas.

"Quando alguém vive com a certeza de que é amado, muito amado com um amor eterno, e que nada pode separá-lo desse amor, ele desenvolve uma nova visão da vida e uma nova percepção da realidade". Ricardo Barbosa
Alagoinhas - BA
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