Palavra do leitor
- 24 de abril de 2009
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Carta a um pastor gay
Caro amigo Severino Augusto,
Fiquei muito feliz em reencontrá-lo domingo passado no aeroporto. Assim é a vida, cheia de encontros e desencontros. Há muito tempo que venho procurando através de amigos comuns saber notícias suas, pois você havia sumido do cenário nacional.
Como prometido, estou enviando-lhe aqui o nome do cientista que revolucionou a pesquisa sobre a sexualidade: Alfred Kinsey. E como você me pediu, vou agora expressar o que eu penso disso tudo.
Primeiramente, desculpe-me não ter te respondido prontamente naquela tarde, olhando em sua face, mas precisei gastar algum tempo não só orando, mas refletindo bem sobre o quadro. Tomei tempo também para ler e reler algo sobre o assunto.
Sua situação mexeu muito comigo. Depois de nosso bate papo, enquanto você voava para os Estados Unidos e eu esperava meu vôo para Alemanha fiquei lembrando-me de nossa época de escola. Certa vez você me confidenciara sua primeira(?) experiência homossexual, com um tom de arrependimento e remorso. Nem passava pela minha cabeça que você poderia estar ainda tão envolvido assim nesse tipo de crise. Agradeço-te por ter sido mais uma vez alvo de sua confiança. Alerto-te, todavia, que serei bem franco contigo, coisa que nossa boa e velha amizade não só permite, mas exige.
Sempre estranhei suas constantes investidas atacando o movimento homossexual ou a homossexualidade em si. A princípio pensava que era só um cumprimento da pauta do momento, da agenda evangelical conservadora. Afinal você se tornou um líder evangélico de destaque no Brasil. Mas depois tudo me pareceu muito exagerado.
Também aquele seu medo da solidão, que lhe forçava buscar companhias de rapazes, poderia ter sido tratado de forma mais franca e aberta e não ser sempre camuflado em nome de um suposto discipulado.
Ao contrário do que você me alegou, que foi tudo ataque do maligno para destruir seu ministério, creio que você mesmo foi quem se enveredou por caminhos que não deveria. E não digo isso em relação à homossexualidade propriamente dita, pois você mesmo sabe que não pode mudar muita coisa quanto a isso. Mas sua exposição pública tornou-se por demais obsessiva. O acúmulo de funções chaves e o uso exagerado do discurso moralista poderiam ter sido evitados. Você foi forçado a assumir uma personalidade muito diferente daquele Severino Augusto que conheci antigamente.
Não é de se admirar que você se sinta agora perseguido e que o rapaz de programa esteja lhe chantageado. Se você não estivesse em evidência tudo passaria despercebido pela sociedade. Você teria claro, ainda que lidar com o drama de consciência, mas não com esses inconvenientes de maior vulto e conseqüências mais drásticas. Lembre-se que Davi preferiu cair nas mãos de Deus do que nas de seus inimigos?
Como você me perguntou, lhe responderei: o "sair do armário" como um gay, poderia, de fato, liberá-lo do segredo que você mantém com tamanha angústia. Mas francamente falando, acho pura bobeira qualquer confissão pública de sua identidade. Isso de fato não edificaria ninguém e só atingiria seu ministério.
O seu desejo freqüente de continuar publicamente como um pastor e prossegir, secretamente, desenvolvendo um relacionamento homossexual só agravará mais ainda sua angústia e medos. Sei que é muito duro constatar que não se tem muitas opções, a não ser, por continuar vivendo com sua ferida. Afinal você mesmo sempre procurou a orientação sobre imoralidade sexual na Bíblia e em sua Denominação.
Penso que seu ministério não chegou ao fim. Ele talvez não tenha o vulto e o alcance que você ambicione agora. Entretanto você pode ainda ajudar muito as pessoas. Mas agora é o tempo no qual você precisa de ajuda! Aproveite seu relativo anonimato no exterior e busque auxílio num centro que trabalha com mulheres e homens homossexuais.
Imagino que seu desejo homossexual (reprimido) possa ser redirecionado para melhor compreensão da intimidade, da marginalidade, do amor e da posse (coisas tais que nem todos têm a precisada sensibilidade), mas nunca o direcione novamente para a condenação de seus semelhantes.
Desejo-te um bom recomeço em terras estrangeiras. Aguardo sua resposta e conte comigo.
Fraternalmente,
Roger
(Embora o nome seja fictício qualquer semelhança com fatos reais não seria mera coincidência).
teologia-livre.blogspot.com
Fiquei muito feliz em reencontrá-lo domingo passado no aeroporto. Assim é a vida, cheia de encontros e desencontros. Há muito tempo que venho procurando através de amigos comuns saber notícias suas, pois você havia sumido do cenário nacional.
Como prometido, estou enviando-lhe aqui o nome do cientista que revolucionou a pesquisa sobre a sexualidade: Alfred Kinsey. E como você me pediu, vou agora expressar o que eu penso disso tudo.
Primeiramente, desculpe-me não ter te respondido prontamente naquela tarde, olhando em sua face, mas precisei gastar algum tempo não só orando, mas refletindo bem sobre o quadro. Tomei tempo também para ler e reler algo sobre o assunto.
Sua situação mexeu muito comigo. Depois de nosso bate papo, enquanto você voava para os Estados Unidos e eu esperava meu vôo para Alemanha fiquei lembrando-me de nossa época de escola. Certa vez você me confidenciara sua primeira(?) experiência homossexual, com um tom de arrependimento e remorso. Nem passava pela minha cabeça que você poderia estar ainda tão envolvido assim nesse tipo de crise. Agradeço-te por ter sido mais uma vez alvo de sua confiança. Alerto-te, todavia, que serei bem franco contigo, coisa que nossa boa e velha amizade não só permite, mas exige.
Sempre estranhei suas constantes investidas atacando o movimento homossexual ou a homossexualidade em si. A princípio pensava que era só um cumprimento da pauta do momento, da agenda evangelical conservadora. Afinal você se tornou um líder evangélico de destaque no Brasil. Mas depois tudo me pareceu muito exagerado.
Também aquele seu medo da solidão, que lhe forçava buscar companhias de rapazes, poderia ter sido tratado de forma mais franca e aberta e não ser sempre camuflado em nome de um suposto discipulado.
Ao contrário do que você me alegou, que foi tudo ataque do maligno para destruir seu ministério, creio que você mesmo foi quem se enveredou por caminhos que não deveria. E não digo isso em relação à homossexualidade propriamente dita, pois você mesmo sabe que não pode mudar muita coisa quanto a isso. Mas sua exposição pública tornou-se por demais obsessiva. O acúmulo de funções chaves e o uso exagerado do discurso moralista poderiam ter sido evitados. Você foi forçado a assumir uma personalidade muito diferente daquele Severino Augusto que conheci antigamente.
Não é de se admirar que você se sinta agora perseguido e que o rapaz de programa esteja lhe chantageado. Se você não estivesse em evidência tudo passaria despercebido pela sociedade. Você teria claro, ainda que lidar com o drama de consciência, mas não com esses inconvenientes de maior vulto e conseqüências mais drásticas. Lembre-se que Davi preferiu cair nas mãos de Deus do que nas de seus inimigos?
Como você me perguntou, lhe responderei: o "sair do armário" como um gay, poderia, de fato, liberá-lo do segredo que você mantém com tamanha angústia. Mas francamente falando, acho pura bobeira qualquer confissão pública de sua identidade. Isso de fato não edificaria ninguém e só atingiria seu ministério.
O seu desejo freqüente de continuar publicamente como um pastor e prossegir, secretamente, desenvolvendo um relacionamento homossexual só agravará mais ainda sua angústia e medos. Sei que é muito duro constatar que não se tem muitas opções, a não ser, por continuar vivendo com sua ferida. Afinal você mesmo sempre procurou a orientação sobre imoralidade sexual na Bíblia e em sua Denominação.
Penso que seu ministério não chegou ao fim. Ele talvez não tenha o vulto e o alcance que você ambicione agora. Entretanto você pode ainda ajudar muito as pessoas. Mas agora é o tempo no qual você precisa de ajuda! Aproveite seu relativo anonimato no exterior e busque auxílio num centro que trabalha com mulheres e homens homossexuais.
Imagino que seu desejo homossexual (reprimido) possa ser redirecionado para melhor compreensão da intimidade, da marginalidade, do amor e da posse (coisas tais que nem todos têm a precisada sensibilidade), mas nunca o direcione novamente para a condenação de seus semelhantes.
Desejo-te um bom recomeço em terras estrangeiras. Aguardo sua resposta e conte comigo.
Fraternalmente,
Roger
(Embora o nome seja fictício qualquer semelhança com fatos reais não seria mera coincidência).
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